Se você buscar “andropausa” na internet, vai encontrar de tudo: desde dicas para reconhecer os sinais até soluções rápidas para sintomas como cansaço e prejuízos na libido. A ideia, vendida há anos como uma “menopausa masculina”, sugere que tudo isso é culpa da queda de hormônios, sobretudo de testosterona, típica do avançar da idade. Mas os médicos informam que, embora uma redução hormonal possa ocorrer, não é nessa magnitude que o senso comum dá a entender.
É que, ao contrário das mulheres, que param de produzir estrogênio por volta dos 50 anos, os homens seguem fabricando hormônios por toda a vida, com poucas mudanças, explicam os especialistas. Por isso, a andropausa não existe.
O problema já começa com a origem da palavra, alerta Alexandre Hohl, vice-presidente do Departamento de Endocrinologia Feminina, Andrologia e Transgeneridade da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (Sbem). “Esse termo foi criado com base no conceito de menopausa, que vem do latim, no qual meno significa menstruação, e pausa remete à parada, porque as mulheres param de menstruar no final da vida fértil”, explica.
“Então, criou-se essa ideia de fazer uma palavra parecida, usando andro, que significa masculino, e pausa, como se a produção da testosterona parasse”, conta o médico. Mas essa produção não é interrompida. O que pode ocorrer entre alguns homens é uma queda gradual e singela nas taxas do hormônio após os 40 anos: cerca de 1,2% ao ano, segundo especialistas.
Essa redução não é uma regra para todos e, quando acontece, pode ser considerada um fenômeno natural do envelhecimento. Geralmente, ela não provoca sintomas que afetam a qualidade de vida masculina. Por isso, a reposição hormonal, por exemplo, não é necessária nesses casos.
No entanto, em alguns indivíduos, a queda de testosterona pode ser mais acentuada. “Nesses homens, em vez de a queda hormonal ser de 1% ao ano, ela é de 10 ou 20%. A testosterona cai tão violentamente que vai para níveis de doença”, ensina Hohl. A esse quadro dá-se os nomes de hipogonadismo masculino ou distúrbio androgênico do envelhecimento masculino (DAEM).
No entanto, o problema ocorre apenas em situações específicas, diferentemente da menopausa, que afeta todas as mulheres.
A real baixa de testosterona
O hipogonadismo é quando o corpo não produz testosterona ou espermatozoides de maneira suficiente. Isso pode acontecer por problemas nos testículos, que ‘fabricam’ a testosterona, ou na hipófise e no hipotálamo, partes do cérebro que ajudam a regular essa produção.
Pode-se dizer que existem três tipos principais de hipogonadismo: o congênito, presente desde o nascimento (mas muito raro); o funcional, que surge devido a questões como obesidade, diabetes, uso de medicamentos ou ingestão excessiva de álcool; e o tardio, associado envelhecimento.
Entre os medicamentos que podem reduzir os níveis hormonais estão os glicocorticoides, usados para tratar asma e doenças reumatológicas, e opioides, indicados para dor (neste caso, o problema seria o abuso).
Mas é o hipogonadismo tardio, que pode surgir após os 50 ou 60 anos, que é frequentemente associado ao falso conceito de andropausa. Ele também pode ser chamado de distúrbio androgênico do envelhecimento masculino (DAEM), reforça o presidente da Sociedade Brasileira de Urologia (SBU), Luiz Otávio Torres, especialista em andrologia.
Quais os sintomas?
Nos raros casos com início na infância, o hipogonadismo, se não tratado, impede o desenvolvimento de características masculinas, como voz mais grave e crescimento de pelos, testículos e músculos.
Ao aparecer na vida adulta, que é quando podemos falar em “queda” da testosterona, as manifestações dependem do grau e da duração do déficit hormonal. Segundo Hohl, os principais sintomas ficam na esfera sexual, como diminuição da libido e dificuldade de ereção, além de disfunções durante o ato sexual.
Também pode haver sensação de cansaço, dificuldade de concentração, problemas para dormir e mudanças de humor, como tristeza e irritabilidade. Com o tempo, podem surgir aumento de gordura na barriga, redução dos testículos, enfraquecimento dos ossos e crescimento das mamas. Ainda, há maior risco de doenças do coração e câncer de próstata.
Como é feito o diagnóstico
O diagnóstico começa com a análise dos sintomas relatados pelo paciente. Para confirmar a suspeita, são realizados exames de sangue, incluindo a dosagem hormonal.
Avaliar as taxas de hormônio é importante para descobrir se há o hipogonadismo, mas vale salientar que, na maioria das vezes, a causa das queixas não é a queda de testosterona. “Geralmente, os sintomas são causados por questões do dia a dia, como estresse”, explica Torres.
Por essa razão, o diagnóstico considera o conjunto de sinais apresentados pelo paciente. “Por exemplo, algumas pessoas pensam que o cansaço é resultado da queda de testosterona, mas ele pode ter várias origens. Mas um homem com cansaço associado à queixa sexual, aumento da cintura e alteração do sono, pode, sim, estar com hipogonadismo”, ressalta Hohl.
Dito isso, a dosagem de testosterona não faz parte dos exames de rotina, já que, isoladamente, o teste tem pouco significado. Alguns homens podem apresentar níveis de testosterona fora dos padrões, mas, se não apresentarem sintomas, isso não indica necessariamente um problema. Assim, o exame é solicitado em circunstâncias específicas.
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Quando repor a testosterona?
Depois do diagnóstico, o tratamento para o hipogonadismo pode envolver reposição hormonal ou, em casos em que há capacidade de reação, o uso de medicamentos que estimulam o testículo a retomar a produção natural de testosterona.
Homens que apresentam níveis normais do hormônio não devem fazer uso do medicamento. Inclusive, segundo os médicos, o uso excessivo desse hormônio como anabolizante tem se tornado um problema crescente. A substância muitas vezes é indicada em doses altas para ganho rápido de massa. No entanto, isso traz efeitos colaterais sérios. Segundo carta publicada no Jama – uma das revistas médicas mais importantes do mundo – dados apontam que o uso de anabolizantes aumenta em quase três vezes o risco de morte.
No entanto, os especialistas ressaltam que a reposição orientada não oferece riscos. Um estudo recente publicado no New England Journal of Medicine comprovou que o tratamento em pessoas com hipogonadismo não eleva o risco de infartos, derrames ou problemas cardíacos, como alguns especialistas já temeram no passado.
Portanto, a reposição hormonal pode melhorar significativamente a qualidade de vida. “O tratamento é muito seguro, e o benefício é imenso”, diz Hohl.
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