A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) autorizou a aplicação da vacina da Pfizer, contra a covid-19, em crianças de 5 a 11 anos, nesta quinta-feira, 16. A formulação da dose pediátrica equivale a um terço da usada em pessoas com mais de 12 anos. A decisão da Anvisa precisará ser publicada no Diário Oficial da União para passar a valer - o que deve acontecer ainda hoje nesta quinta. Já havia indicação da liberação na quarta-feira, 15, como informou o Estadão.
Devem ser administradas duas doses, com intervalo de 21 dias, cada uma com 10 microgramas, para pessoas nessa faixa etária, conforme orientação da Anvisa. O volume a ser aplicado também é menor, de 0,2 mL. Como a composição é distinta da dos adultos, os frascos do imunizante serão de cor laranja e será necessário treinar profissionais de saúde para evitar eventuais erros.
Os técnicos destacaram que a recomendação é baseada nas informações apresentadas até o momento e pode mudar conforme novos dados sejam apresentados. Por exemplo, ainda não está claro se será necessária dose de reforço nem em quanto tempo.
A avaliação da agência levou 21 dias, se descontados os 14 dias que a Pfizer Inc. utilizou para responder às exigências técnicas do órgão regulador. A decisão levou em conta estudos que indicaram a segurança e eficácia de 90% do imunizante na faixa etária e a administração do imunizante em maiores de 5 anos pelo mundo. Estados Unidos, França, Reino Unido, Alemanha, Espanha, Coréia, Austrália e Holanda já imunizam a população pediátrica com a vacina.
Com base em dados globais sobre o imunizante em crianças, a gerente-geral deMonitoramento de Produtos Sujeitos à Vigilância Sanitária, Suzie Marie Gomes, informou que quase 95% dos casos suspeitos de evento adverso reportados foram “não graves”. Mais da metade deles relacionados a erros na aplicação, disse ela.
A área técnica da Anvisa também ouviu recomendações de entidades brasileiras. Participaram especialistas da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia (SBPT), Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), Sociedade Brasileira de Imunologia (SBI) e Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP).
Assim como a Anvisa, o presidente da SBIm Renato Kfouri considera os benefícios maiores que os riscos. “Só a covid mata mais do que todas as doenças do calendário vacinal infantil somadas”, exemplificou.
A infectologista Rosana Richtmann, da SBI, destacou que o Brasil já perdeu “mais de 2.500 crianças” para a covid desde o início da pandemia. Ainda disse que a administração da Pfizer para cerca de cinco milhões de pessoas nessa faixa etária nos Estados Unidos, e os efeitos reportados até o momento mostram que a vacina está “dentro da segurança que queremos”.
A diretora da Segunda Diretoria da Anvisa, Meiruze Sousa Freitas, destacou que a vacinação na faixa etária terá impacto positivo na redução de transmissão da doença e ao minimizar as interrupções na educação dos mais jovens.
Orientações
Apesar de não competir à Anvisa adicionar o imunizante ao Programa Nacional de Imunizações do Ministério da Saúde (PNI/MS), caso o governo aceite a recomendação, Meiruze listou uma série de orientações da Agência. “É preciso de um programa (de vacinação) específico para crianças”, resumiu.
Além do treinamento dos profissionais da saúde, Meire indicou que a vacinação dos mais jovens deve ser feita em um ambiente “seguro” e “acolhedor”. A orientação é de haver uma sala específica para aplicação do imunizante e também de que drive-thrus sejam evitados.
Como a dose e o volume são reduzidos, o uso de seringas menores é recomendado. Após receber o imunizante, a criança deve ficar no local ao menos por 20 minutos. Com isso, poderá ser observada com mais cautela.
Meire também destacou que é preciso esperar 15 dias para ministrar qualquer outro tipo de imunizante à população pediátrica, após o recebimento da Pfizer. E para crianças que completarem 12 anos entre as doses, o esquema vacinal deve ser completado com a injeção pediátrica.
‘Nossa análise oferece opções para que o Ministério da Saúde tome decisões’
O diretor-presidente da Anvisa, Antonio Barra Torres, começou seu discurso lembrando das ameaças que os integrantes da Agência sofreram de pessoas contrárias à vacinação de crianças, no final de outubro. “Num dia que deveria ser de leveza e alegria a todos nós, ainda que fosse uma alegria efêmera diante de mais de 610 mil, 615 mil túmulos de brasileiros, temos de reportar esse momento triste.”
Para ele, o tom das ameaças demonstra desconhecimento sobre as funções da Anvisa e do governo federal. “Nossa análise oferece opções para que o Ministério da Saúde tome decisões”, explicou. “O governo federal é soberano se vai incorporar ou não incorporar (o imunizante ao programa nacional).”
Ele também reforçou que as decisões do órgão são técnicas e reconhecidas internacionalmente.
Torres ainda declarou que a “pandemia não acabou”. Medidas como o uso de máscaras e evitar aglomerações seguem importantes para combater o vírus, na visão dele.
Governo negocia 40 milhões de doses
O Ministério da Saúde começou a se preparar para a vacinação de crianças em novembro, antes da autorização da Anvisa. A pasta decidiu se antecipar e negociou com a Pfizer 40 milhões de doses para imunizar a faixa etária de 5 a 11 anos. A entrega dos imunizantes estava condicionada ao aval do órgão.
A vacinação de crianças enfrenta resistência do presidente Jair Bolsonaro e de apoiadores da ala ideológica. No fim de outubro, antes de a Pfizer pedir a inclusão das crianças na bula do imunizante, diretores da Anvisa foram ameaçados de morte por e-mail por um homem do Paraná. A mensagem foi repassada a diferentes órgãos de investigação.
A vacina da Pfizer está registrada no País desde 23 de fevereiro deste ano. Inicialmente, o imunizante foi autorizado para pessoas com mais de 16 anos. Em 11 de junho, a Anvisa liberou a inclusão da faixa etária de 12 a 15 anos.
Em agosto, a agência negou autorização para a aplicação do imunizante Coronavac contra a covid-19 em crianças e adolescentes de 3 a 17 anos. O pedido havia sido feito pelo Instituto Butantan, produtor da vacina no Brasil. A decisãoapontava que os dados apresentados pelo instituto não eram suficientes para comprovar a segurança da vacina no grupo pediátrico. O Butantan anunciou nesta quarta que fez novo pedido para liberar o uso da Coronavac nessa faixa etária.
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