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Aproveite o pinhão: mais do que calorias, alimento concentra nutrientes valiosos

Semente oferece um combo de substâncias bem-vindas à saúde; veja como preparar para garantir os benefícios

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Por Letícia Quadros

Se tem festa junina, tem pinhão. Apesar de ser popular, sobretudo nessa época do ano, o alimento sofre com preconceitos por ser analisado apenas pelo seu valor calórico. Mas, ao olhá-lo de forma global, é possível perceber que não há motivo para receios. Reduto de fibras, gorduras boas e até de substâncias antioxidantes, o fruto é, na verdade, um grande aliado da saúde.

Pinhão costuma ser consumido principalmente no outono e inverno no Brasil Foto: Maria Novas/Adobe Stock

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Para começar a tirar proveito de tantas qualidades, é preciso cozinhar o alimento. Para ter ideia, o amido, um tipo de carboidrato, representa 80% de sua composição, como acontece com a batata. “Vamos fazer um comparativo com arroz, feijão, batata e soja. Todos eles precisam ser cozidos antes da ingestão. Ninguém come feijão ou batata crus. Com o pinhão, é a mesma coisa: ele precisa ser cozido, porque é indigesto quando está cru”, explica a química e cientista de alimentos Cristiane Helm, pesquisadora da Embrapa Florestas.

A proporção ideal de cozimento é de um quilo de pinhão para um litro de água e o ponto adequado é quando o pinhão estiver bem macio. Cristiane ressalta que existem outras formas de preparo, como o pinhão assado no forno ou “sapecado”, feito na grelha, em contato direto com o fogo. O cozimento, entretanto, é a melhor maneira para se extrair os nutrientes.

Propriedades do pinhão

É no contato com água fervente que o alimento ganha ainda mais valor. Durante o cozimento, o amido presente no miolo do pinhão – ou seja, a parte branca, conhecida como “amêndoa” – se transforma em um tipo de amido especial, conhecido como resistente, que demora mais a ser absorvido. Com isso, ajuda no controle da glicose no sangue e na menor absorção de gordura. Daí porque pode fazer parte do cardápio de indivíduos com diabetes.

O alimento também é rico em fibras, que ajudam no trânsito intestinal – evitando a constipação – e favorecem a sensação de saciedade.

Vale destacar ainda a casca do pinhão, que concentra compostos antioxidantes – a cor marrom denuncia a presença desses elementos. Ao cozinhar o alimento, essas substâncias acabam passando para a amêndoa, que ganha a coloração amarronzada.

Os antioxidantes são importantes agentes no combate aos radicais livres, moléculas instáveis que, uma vez em excesso no corpo, prejudicam as células e contribuem para o envelhecimento precoce.

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Por conta dessas propriedades, o pinhão pode ser considerado um alimento funcional: “Ele é rico em fibras e em compostos antioxidantes. Isso o torna um alimento funcional. O pinhão é muito benéfico para o organismo humano”, resume Cristiane.

E as calorias?

Essa é uma questão que deixa muita gente com o pé atrás antes de consumir o pinhão. Mas, segundo a nutricionista Flávia Auler, professora na Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR), não faz sentido analisar os alimentos apenas por esse viés calórico.

Aproximando da realidade brasileira, a professora faz a comparação com o arroz: “O pinhão tem quase a mesma quantidade de calorias que o arroz (160 contra 130) e também de carboidratos (33 gramas contra 28 gramas). Mas as pessoas não sabem que o pinhão tem quase o dobro de proteína que o arroz (3,6 gramas contra 2 gramas). É um alimento supernutritivo, que não pode ser reduzido ao valor calórico”, analisa Flávia. (Os valores são referentes a 100 gramas de ambos os alimentos)

Para a professora, a “carbofobia” (medo de consumir carboidratos) pode impedir o consumo de um alimento benéfico. Além de fibras e antioxidantes, o pinhão também tem vitamina A, zinco, selênio e os ômegas 3, 6 e 9.

Mas, afinal, o que é o pinhão?

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Confundido com uma oleaginosa, um grão ou um cereal, o pinhão, na verdade, é uma semente que vem dentro da pinha. A araucária é a árvore que produz o pinhão, e ela pode ser encontrada, predominantemente, no sul do país.

A extração pode ocorrer de duas formas. O agricultor pode esperar o pinhão cair da árvore, quando estiver maduro, ou subir na araucária para colher, que é a maneira mais comum, como explica o agrônomo Natal João Magnanti: “Pegar no chão é um trabalho muito demorado, porque você precisa coletar um por um. Geralmente, alguém sobe na árvore, de mais ou menos 15 metros, e vai com um bambu batendo nas pinhas para derrubá-las”, ilustra Magnanti.

O pinhão ainda está ameaçado de extinção?

Segundo Magnanti, a estimativa é de que, hoje, exista de 1% a 4% da área original da floresta araucária, devido à exploração madeireira. O esgotamento da possibilidade de corte de madeira, porém, fez com que houvesse uma regeneração da espécie.

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Grande parte das araucárias que existem estão em pequenas propriedades, onde há a extração do pinhão, fazendo com que ocorra a “conservação pelo uso”. Ela consiste na preservação da espécie a partir da extração consciente e do consumo da população. “Isso ajuda a conservar o ecossistema. Mantém a paisagem cultural, a tradição e os pequenos produtores. É uma espécie que precisa ficar em pé”, avalia Magnanti.

Aprovada em 2022, a lei 15.915 proíbe a extração do pinhão antes do dia 1º de abril. Para a pesquisadora da Embrapa, medidas como essa e também o incentivo do plantio fizeram com o que pinhão saísse da lista de alimentos ameaçados de extinção. “Essa é uma questão polêmica, mas eu diria que não está mais. Muitos órgãos governamentais estão incentivando o plantio. Por meio dos Estados, o governo tem distribuído mudas e incentivado o plantio. Então, a gente vê iniciativas mostrando a importância de plantar as araucárias em função da qualidade da madeira, da qualidade do pinhão, para que as futuras gerações tenham muitas araucárias e muito pinhão também”, afirma Cristiane.

Alimento afetivo

Outro aspecto relativo ao pinhão é a identidade cultural e afetiva que ele carrega. A Festa Nacional do Pinhão, por exemplo, é um evento tradicional que acontece na cidade de Lages, Santa Catarina, e dura dez dias.

O agrônomo Magnanti destaca a relevância do aspecto cultural do alimento, não apenas na sua manifestação em festas, mas também para a conservação da paisagem característica da região.

Para Flávia, o consumo do alimento em dois meses do ano (junho e julho) representa um momento de partilha, permeado de histórias e memórias.

A psicóloga Amana Nishi, do Ambulatório de Transtornos Alimentares do Instituto de Psiquiatria da Universidade de São Paulo (USP), reforça que o consumo saudável de um alimento ligado a uma memória afetiva pode inclusive liberar ocitocina, conhecido como o hormônio do amor.

Mas a especialista faz um alerta: “O impacto no corpo continua o mesmo. Se tenho medo de engordar ao consumir um alimento, isso pode ter um efeito negativo, em termos de comportamento. Já o alimento que traz conforto pode se tornar uma compulsão. O ideal é o consumo equilibrado”, ressalta Amanda.

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