No final de fevereiro, o governo federal lançou a Mobilização Nacional pela Vacinação, campanha que tem o objetivo de levar o Brasil de volta à condição de referência em imunização. A missão é liderada pela ministra da Saúde, Nísia Trindade Lima, que vem dedicando os primeiros meses à frente da pasta à tarefa de reconstruir pontes. “O ministério enfrentou o grande problema da perda clara de coordenação. Nossos primeiros movimentos foram para recuperar a confiança e o engajamento de todas as instâncias necessárias para que o esforço pela vacinação chegue à população como um todo”, descreve a ministra. Mestre em Ciência Política e doutora em Sociologia, ela tem grande experiência na área da saúde: estava à frente da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), uma das instituições que lideraram no País o enfrentamento à covid-19, durante todo o período da pandemia.
O objetivo da Mobilização é voltar ao patamar acima de 90% de cobertura vacinal – trata-se do indicador que estima a proporção da população-alvo atingida. A última vez em que isso aconteceu foi em 2015, durante o governo de Dilma Rousseff, quando o índice chegou a 95,07%, de acordo com dados do Sistema de Informação do Programa Nacional de Imunizações. No ano seguinte, a Emenda Constitucional 95, que congelou os investimentos públicos, provocou cortes drásticos nas campanhas de informação e conscientização na área da saúde.
Os resultados foram logo percebidos na queda gradual dos níveis de vacinação, agravada durante a gestão de Jair Bolsonaro, caso único de presidente brasileiro que se posicionou contra as vacinas. Levantamento feito pelo
Estadão revelou que todos os presidentes, mesmo durante o governo militar, apoiaram as campanhas de imunização. Antes da gestão de Bolsonaro, nunca as vacinas tinham sido utilizadas como argumento de polarização política – tanto que uma cena icônica nesse sentido ocorreu em 2008, quando o então governador de São Paulo, José Serra, que havia sido ministro da Saúde, simulou vacinar o presidente Lula, histórico adversário político, para promover a campanha de vacinação (ele apenas simulou, pois, sendo economista e não profissional da saúde, não tinha qualificação para aplicar efetivamente a vacina).
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Manaus é exemplo
A cobertura vacinal do Brasil ficou em apenas 67,94% no ano passado, variando de 63,03% na Região Norte a 74,21% no Sul. Tocantins se destacou com o melhor índice entre as unidades da Federação (78,06%), com o Amapá na ponta oposta (49,06%). A “lanterninha” quase ficou com o Rio de Janeiro, que apareceu na penúltima posição, com cobertura de 51,43%.
Entre as capitais, o pior desempenho foi de João Pessoa (PB), com 40,38% de cobertura. A campeã de vacinação foi Manaus (AM), com índice de 79,91%, reflexo de um esforço de longo prazo que vem resultando em patamares acima da média há muitos anos. Parte importante desse trabalho envolve campanhas periódicas, como a realizada em 20 de maio, um sábado, com o título de Dia D da Campanha de Multivacinação, promovida pela prefeitura para aumentar os índices de cobertura entre a população até 14 anos.
O resultado foi a aplicação de 75.970 doses de vacina nos 229 pontos de atendimento, que funcionaram das 8h às 16h em todas as regiões da capital do Amazonas. Além das unidades de saúde tradicionais, foram instaladas estruturas móveis em pontos estratégicos e agentes comunitários de saúde levaram as vacinas em domicílios de localidades remotas. “Resultado tão positivo só foi possível pela soma entre o esforço dos 1,5 mil servidores envolvidos na ação e a adesão da população ao convite”, celebra a secretária municipal de Saúde, Shádia Fraxe. Ao final do Dia D, a prefeitura continuou divulgando intensamente a necessidade de vacinação, lembrando que os postos de saúde seguiriam atendendo quem não conseguiu comparecer com as crianças no dia da campanha.
O esforço pela vacinação na capital do Amazonas está associado, também, a uma recomendação do Ministério da Saúde, preocupado com a notificação recente de um caso de poliomielite no vizinho Peru. A doença, popularmente conhecida como “paralisia infantil”, foi erradicada do Brasil em 1989 graças aos altos índices de cobertura proporcionados por campanhas nacionais de vacinação contra a pólio.
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