Apesar de prevenível com medidas simples, como higiene e vacinação contra o HPV, o câncer de pênis foi diagnosticado em mais de 21 mil homens, de 2012 a 2022, segundo levantamento da Sociedade Brasileira de Urologia (SBU). Além disso, na última década, três em cada 10 pacientes tiveram que recorrer à amputação do órgão devido à gravidade da doença. De 2011 a 2021, cerca de 4 mil vieram a óbito.
Segundo o urologista Walter da Costa, do A.C Camargo Câncer Center, em São Paulo, trata-se de um tumor com alto potencial de gravidade. “Ele costuma ser descoberto já em estágio avançado e três em cada quatro pacientes que precisam da amputação acabam falecendo”, conta.
Um dos fatores que corrobora com esse cenário é a falta de informação sobre o tema — que se agrava em camadas socioeconômicas mais baixas. De acordo com o Instituto Nacional do Câncer (Inca), a maior parte dos casos no Brasil acontece nas regiões Norte e Nordeste. “A população com menor poder aquisitivo tem menos acesso às informações sobre riscos, à higienização adequada e aos serviços de saúde especializados”, explica Costa.
Ainda de acordo com o especialista, por acometer majoritariamente a população com menos recursos, o câncer de pênis desperta menos interesse da indústria farmacêutica, o que dificulta as pesquisas sobre o tema. “Isso impede o surgimento de novas soluções e novos tratamentos para a doença”.
Para o urologista especializado em câncer Arie Carneiro, do Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo, a incidência de câncer de pênis e o número de amputações no Brasil também está relacionada ao tabu que envolve o órgão genital masculino. “Muitas vezes por vergonha, o paciente prefere não comentar sobre alguma ferida que aparece no pênis e acaba demorando para buscar tratamento”, exemplifica.
Dados do Inca mostram que mais da metade dos pacientes demoram até um ano desde o aparecimento das lesões para procurar um médico.
Quanto mais tardiamente descoberto, mais difícil é o tratamento do câncer de pênis, alerta o urologista Maurício Dener Cordeiro, coordenador do Departamento de Uro-Oncologia da SBU. “Se identificado no início, esse tumor tem grandes chances de cura e permite um tratamento menos agressivo”.
O que é e quais as causas do câncer de pênis?
Trata-se de uma infecção que costuma se manifestar na glande (cabeça do pênis) como uma ferida que não cicatriza e que pode crescer e soltar pus, caso não tratada. Esse tipo de tumor está muito associado à falta de higiene adequada do órgão, que facilita a proliferação de fungos e bactérias. “Assim como o cigarro pode contribuir para o surgimento do câncer de pulmão, a falta de higiene pode motivar o câncer de pênis”, compara o urologista do Einstein.
O especialista do A.C Carmago explica que a higiene adequada da região deve ser feita a partir da lavagem com água e sabão de todo o órgão – inclusive da glande, que exige a retração do prepúcio (pele que encobre a glande) para ser devidamente higienizada. “Por isso, pacientes que têm fimose (dificuldade de exposição da glande) devem recorrer ao tratamento cirúrgico (circuncisão) para que consigam realizar a higienização adequada do órgão”, esclarece.
De acordo com o Inca, a higiene deve ser feita rotineiramente e após relações sexuais e masturbações.
O câncer de pênis também pode surgir em decorrência de uma infecção pelo HPV (papilomavírus humano) – o mesmo que causa câncer de colo de útero nas mulheres. A contaminação ocorre através da relação sexual, por isso a prevenção consiste no uso de preservativo. É possível evitar a infecção pela vacinação contra o HPV, disponível no SUS para a população de 9 a 14 anos e imunossuprimidos até os 45 anos.
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Quais os sintomas de câncer de pênis?
De acordo com Carneiro, é importante procurar um médico ao identificar o aparecimento de sintomas. O médico reforça que, quanto antes a doença for detectada, maiores as chances de cura e preservação do pênis.
Confira os principais sintomas:
- Ferida que não cicatriza;
- Secreção com forte odor;
- Espessamento ou mudança de cor na pele da glande (cabeça do pênis);
- Presença de nódulos na virilha.
Como é o tratamento?
Segundo Costa, o tratamento varia de acordo com o estágio em que o tumor se encontra. “Se detectado no início, é possível tratar de forma localizada — com a cauterização ou uso de laser para destruir o tumor.
Nos estágios mais avançados, porém, é necessário recorrer à amputação, que varia com o tamanho do tumor. Ela pode ser parcial (geralmente correspondente à retirada da glande) e não comprometer a vida sexual do paciente; ou total, que compromete essa funcionalidade”, completa o médico.
Segundo o especialista, existem técnicas de reconstrução do membro, mas elas têm apenas função estética e não devolvem ao paciente a sensação de prazer. Além disso, ele explica que, na amputação total, muitas vezes a uretra é colocada no períneo (região entre o ânus e os órgãos genitais) e o paciente passa a urinar sentado.
Além das consequências físicas, esse tipo de procedimento tem grandes impactos psicológicos no paciente. “Trata-se de um membro de suma importância sociocultural e, por isso, é importante que haja um tratamento multidisciplinar, em conjunto com uma equipe de psiquiatria”, pontua Carneiro.
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