Discutir abertamente a respeito da doença é fundamental para disseminar conhecimento sobre sinais e sintomas, as formas de prevenção e as conquistas alcançadas para seu controle graças às pesquisas científicas e aos investimentos em novas formas de diagnósticos e terapias.
Essa é a opinião dos especialistas reunidos em encontro sobre o tema “Sem medo de falar sobre câncer”, realizado no dia 7 de março pelo Estadão Blue Studio com apoio da Oncologia D’Or. “Estamos falando de um conjunto de centenas de doenças caracterizadas pela capacidade das células de invadirem tecidos e possibilitarem crescimento e disseminação descontrolados”, resumiu o oncologista Paulo Hoff, presidente da Oncologia D’Or. O médico usou uma analogia para facilitar a compreensão: “Um computador funciona porque tem um software dentro dele. Nossas células também têm um software que coordena as transmissões do código genético. Quando ele está alterado, é como se um vírus tivesse invadido o software, que começa a atuar de uma maneira inadequada e pode levar à formação de um câncer”.
As diferentes maneiras de prevenção
“Temos visto uma mudança do perfil epidemiológico do câncer, que sempre foi mais associado à velhice, mas agora vem atingindo cada vez mais jovens. E uma das razões é a exposição a carcinógenos externos”, alertou Paulo Hoff.
Nesse sentido, Maria del Pilar Estevez Diz, oncologista da clínica Onco Star, de São Paulo, lembrou que, segundo estimativas, mais de 30% dos casos poderiam ser evitados com medidas de prevenção a esses agentes. “O cigarro, por exemplo, carrega dezenas de componentes que levam a erros na replicação celular”, pontuou. Vírus como o do HPV, que provoca uma infecção sexualmente transmissível, e o da hepatite são outros fatores de risco. “Trata-se de duas situações para as quais temos vacinas”, destacou a médica.
Maneirar na ingestão de bebidas alcoólicas, evitar a exposição ao sol sem a devida proteção, fugir do sedentarismo, melhorar hábitos alimentares e controlar o peso são igualmente estratégias bem-vindas.
Avanços em diagnóstico e tratamento
Recursos como o Papanicolau, a fim de detectar precocemente lesões no útero, e mamografia, para câncer de mama, há tempos fazem diferença na história da doença. Para os homens, ainda é preciso vencer o preconceito ou o medo do exame de toque, capaz de flagrar nódulos suspeitos na próstata.
Uma vez confirmado o problema, a abordagem terapêutica deve se iniciar o mais rapidamente possível. “Para isso é preciso conhecer a extensão da doença, o que demanda uma série de exames e discussão de toda a equipe envolvida para a definição do tratamento mais adequado”, ressaltou Elisangela Carvalho, radio-oncologista do Hospital São Rafael, da Rede D’Or na Bahia.
“No passado, tínhamos um tripé: cirurgia, radioterapia e quimioterapia”, lembrou Paulo Hoff. Hoje, continuou o médico, o planejamento envolve terapia sistêmica, anticorpos monoclonais (remédios produzidos em laboratório a partir de células vivas e que agem com maior precisão contra o tumor), além da imunoterapia (que se vale das defesas do organismo para reagir às células malignas).
Ao apontar o que considera como um dos grandes avanços recentes em oncologia, Hoff destacou as biópsias líquidas como técnica capaz de revolucionar essa área da medicina. “A ideia é que seja possível detectar no sangue fragmentos do DNA de um tumor e, eventualmente, indicar seu tipo e o melhor tratamento. É algo muito promissor para o futuro”, afirmou.
Já Elisangela Carvalho destacou as conquistas em biologia molecular, que ampliaram o conhecimento sobre os tumores. “Antes, o câncer de pulmão era dividido entre não pequenas células e pequenas células. Hoje são classificados 15 tipos só de adenocarcinoma”, exemplificou. “Enxergar essa identidade permite o uso de drogas mais eficientes.”
Maria del Pilar, por sua vez, apontou a imunoterapia como o pulo do gato no manejo de cânceres resistentes a tratamentos clássicos. “São medicamentos que fazem o sistema imunológico reconhecer as células tumorais e agir para destruí-las”, explicou. “A evolução da imunoterapia é a terapia celular”, complementou Paulo Hoff. “Com ela, retira-se a célula do paciente, que é levada ao laboratório para ser reprogramada e depois injetada de volta para combater o tumor”, explicou.
“O câncer continua sendo uma doença grave, mas os avanços estão vindo e é obrigação da sociedade fazer com que eles cheguem para todos”, concluiu o médico.
Cirurgia robótica no câncer de intestino
De acordo com estimativas do Instituto Nacional de Câncer (Inca), todo ano no Brasil são diagnosticados mais de 45.600 novos casos de tumor colorretal – é o terceiro tipo mais frequente no País, sem contar o câncer de pele não melanoma.1
“Tem havido uma incidência maior de câncer no intestino, muitas vezes relacionada a hábitos alimentares, como consumo em excesso de açúcar, de carboidratos e de bebidas alcoólicas”, diz o cirurgião Antonio Macedo, especialista no aparelho digestivo e oncologista da Clínica Onco Star. “Existe ainda um fator genético, com famílias que apresentam uma tendência a desenvolver esse tumor”, continua.
Daí a recomendação de fazer periodicamente um exame de sangue oculto nas fezes para investigar a saúde do intestino. “A partir dos 40 anos, a verificação por colonoscopia deve ocorrer a cada três anos para detectar lesões pré-cancerosas”, orienta Macedo. Até porque, quando o tumor é flagrado no início, a cirurgia de retirada é curativa. Mesmo nos casos de câncer colorretal avançado, a oncologia clínica, com o uso de drogas mais modernas, que atuam pontualmente e são bem mais toleradas, tem sido cada vez mais eficaz. “Os medicamentos são usados tanto no pré-operatório, para facilitar a cirurgia, quanto depois da retirada do tumor, caso persistam células malignas”, explica o cirurgião. “E hoje contamos com a cirurgia robótica, feita com incisões de menos de 1 centímetro, para a entrada das pinças do robô. Além de ressecar e fazer a emenda do intestino, essa técnica possibilita uma recuperação muito mais rápida”, observa. “Hoje o diagnóstico de câncer não significa morte, mas, sim, o início da união de oncologista clínico e cirurgião, cada um com suas armas, no momento certo, sempre em benefício do paciente”, pondera Macedo.
O câncer é uma doença grave, mas os avanços estão vindo e precisam chegar para todos”
Paulo Hoff, oncologista
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