Problemas para dormir, tontura, cansaço, falta de ar, náusea e até depressão podem ser sintomas de doenças cardiovasculares. A Associação Americana do Coração publicou um estudo que destaca os sintomas mais relatados em casos dessas doenças – alguns que não são tão comumente associados a elas. As seis condições consideradas no estudo são ataque cardíaco, doença valvular cardíaca, insuficiência cardíaca, acidente vascular cerebral (AVC), arritmia cardíaca e doença venal e arterial periférica (DVP e DAP).
As doenças cardiovasculares são a principal causa de morte nos Estados Unidos e no mundo e seus sintomas podem ser difíceis de identificar e monitorar quando não são frequentemente relacionados a esses quadros clínicos. É fácil desconfiar de um ataque cardíaco quando se sente dor no peito, mas conhecer outros sinais associados à condição pode fazer a diferença na hora de conseguir um diagnóstico eficaz e tratamento na hora certa.
“Algumas pessoas podem não considerar sintomas como fadiga, distúrbios do sono, ganho de peso e depressão como importantes ou relacionados a doenças cardiovasculares. No entanto, pesquisas indicam que sintomas sutis como esses podem prever eventos agudos e a necessidade de hospitalização. Uma definição mais ampla do que constitui um sintoma ‘importante’ nesses casos é necessária”, explica Corrine Jurgens, presidente do comitê de redação do estudo.
Danilo Galantini, médico cardiologista do Hospital Sírio-Libanês, explica que sintomas como esses abrem um leque de possibilidades de diagnósticos. “Se você está vomitando, pode ser que seja uma pancreatite, uma pedra na vesícula. Mas também pode ser uma doença coronária, e essa investigação vai se tornando mais importante e minuciosa a partir dos 35 anos, em que as doenças coronárias são a principal causa de morte súbita entre as pessoas.”
Uma das observações dos pesquisadores foi que os sintomas tendem a ser experienciados de forma diferente por homens e mulheres e com o passar do tempo, já que essas doenças se desenvolvem a longo prazo. De forma geral, as mulheres demonstraram relatar mais sintomas do que os homens, além de serem mais propensas a desenvolverem depressão e ansiedade.
Ataque cardíaco
Causada pela perda súbita do fluxo sanguíneo para o coração, o ataque cardíaco tem como seu sintoma mais conhecido a dor no peito, semelhante a uma pressão, que pode irradiar para a mandíbula, ombro ou braço. Sintomas como falta de ar, suor frio, cansaço incomum, enjoo e tonturas são considerados “atípicos” para a condição, mas a Associação Americana do Coração considera que isso pode estar relacionado à falta de pacientes mulheres, que costumam relatar mais sintomas do que os homens, nos estudos clínicos que geraram a definição dos principais sinais relacionados ao quadro.
Galantini esclarece que em casos de síndrome coronária aguda, na qual o ataque cardíaco está compreendido, os sintomas considerados atípicos não costumam aparecer sozinhos. “O paciente não vai ter apenas náusea e vômito, vai ter um peso, um desconforto torácico, palidez cutânea, suor frio.”
Insuficiência cardíaca
A falta de ar é o principal motivo que leva as pessoas com insuficiência cardíaca a procurarem ajuda médica. Outros sintomas, mais sutis e que se manifestam mais cedo no desenvolvimento da doença, são problemas gastrointestinais como dor no estômago, enjoo, vômitos e perda de apetite; insônia; depressão e ansiedade e disfunção cognitiva, que se manifesta com problemas de memória e cansaço mental. Mulheres com insuficiência cardíaca relatam qualidade de vida inferior associada a esse quadro em relação aos homens, além de níveis de dor mais intensos, inchaço e sudorese.
Doença valvular cardíaca
As válvulas cardíacas são como portas que controlam o fluxo do sangue dentro do coração e de dentro para fora dele. Problemas nessas válvulas costumam causar insuficiência cardíaca e também apresentam como sintoma a falta de ar. Podem também causar hipertensão, pressão nos pulmões e estenose aórtica, que é quando o fluxo sanguíneo é restringido pela válvula aórtica. Em casos de estenose aórtica, enquanto as mulheres apresentam mais falta de ar e fragilidade física, os homens tendem a se queixar mais de dor no tórax.
Acidente vascular cerebral (AVC)
Quando um vaso sanguíneo que irriga o cérebro estoura ou sofre um bloqueio, ocorre o acidente vascular cerebral, que geralmente causa sintomas que requerem atendimento médico imediato, como a sensação de face caída, fraqueza no braço e dificuldade na fala, além de tontura, alterações na visão e perda de equilíbrio e coordenação motora.
Também nesse quadro, as mulheres costumam apresentar mais sintomas “fora do comum”, a exemplo da dor de cabeça e alteração do estado mental. Muitas vezes, a capacidade de reconhecer novos sintomas ou o agravamento deles fica prejudicado. No caso de AVC, reconhecer os sinais é fundamental, pois o tratamento imediato reduz as chances de sequelas permanentes ou morte.
Existem também outros fatores que podem levar a alterações na percepção de sintomas de doenças, como diabetes, que causa lesões aos neurônios. Pacientes transplantados ou mais idosos também podem ter dificuldade para descrever os sintomas que sentem. “Quanto mais idoso, menos a precisão da descrição da dor, que tende a ser mais vaga. O idoso tende também a ter dores mais difusas, espalhadas pelo corpo, o que torna mais difícil descrevê-las precisamente”, pontua Galantini.
Arritmia cardíaca
A arritmia consiste em alterações no ritmo cardíaco, na forma de palpitações irregulares, rápidas ou interrompidas, que costumam ser acompanhadas de fadiga, tontura e falta de ar. Os sintomas menos comuns são dor no peito, desmaio e ansiedade. Mulheres e adultos jovens tendem a sentir mais palpitações do que homens e adultos mais velhos. Além disso, os dados do estudo indicam que adultos negros relatam mais palpitações, falta de ar, tontura e dor no peito do que adultos hispânicos, latinos ou brancos.
Doença venal (DVP) e arterial periférica (DAP)
A DVP e a DAP afetam as extremidades inferiores do corpo, reduzindo a irrigação sanguínea das pernas. O sintoma mais clássico é a dor nas panturrilhas durante caminhadas, que desaparece com o repouso, mas ela pode se localizar em outras partes das pernas, nos pés e dedos dos pés. Pode ocorrer, também, que nenhum sintoma seja sentido. A doença arterial periférica está associada a um risco aumentado de ataque cardíaco e AVC, que ocorrem mais frequentemente entre os homens nesses casos.
Na doença venal periférica, é possível que os pacientes apresentem depressão, irritação na pele, síndrome das pernas inquietas e cãibras. Os relatos de dor, sentimento de peso e fadiga foram mais identificados entre adultos com menos de 65 anos.
Principalmente no caso da DAP, as mulheres são mais propensas a ter qualidade de vida afetada, progressão rápida do quadro e relatar dor em outros lugares além da panturrilha ou nenhum sintoma, e segundo a pesquisa, os quadros delas podem se complicar pela crença equivocada de que a DAP é mais comum entre os homens ou pela confusão de sintomas de outras doenças, como a osteoartrite.
Relação com ansiedade e depressão
Dados de pesquisas nos Estados Unidos mostram que pessoas com doenças cardíacas têm a ocorrência de depressão cerca de duas vezes maior em comparação com pessoas sem qualquer condição médica. O estudo da Associação Americana do Coração destaca que pessoas com dor torácica persistente, insuficiência cardíaca, sobreviventes de acidente vascular cerebral e indivíduos com doença arterial periférica comumente apresentam depressão ou ansiedade.
Os pesquisadores alertam para o fato de que alterações nas funções cognitivas e a presença da depressão ao longo de qualquer doença cardiovascular podem influenciar a capacidade de uma pessoa de perceber seus sintomas. “Monitorar e medir os sintomas com ferramentas que considerem adequadamente a depressão e a função cognitiva podem ajudar a melhorar o atendimento ao paciente, identificando mais rapidamente as pessoas que podem estar em maior risco”, conta Corrine Jurgens.
Antes de se preocupar com a possibilidade de problemas cardiológicos, é preciso saber que é importante considerar o contexto do paciente no que diz respeito a fatores de risco. “A interpretação de qualquer sintoma é baseada na probabilidade do indivíduo de desenvolver aquela doença. Esse tipo de generalização é fácil de fazer em termos de saúde coletiva, mas é preciso considerar diversos fatores”, ressalta Danilo.
Os fatores de risco, explica, são divididos entre não modificáveis, como a predisposição genética e a idade, e modificáveis, causados por hábitos como o tabagismo, consumo de álcool, padrões de sono irregulares, altos níveis de estresse, obesidade e alimentação não balanceada; que podem ser transformados para uma vida mais saudável.
Sinais de alerta
- Ataque cardíaco: falta de ar, suor frio, cansaço incomum, enjoo e tonturas
- Insuficiência cardíaca:problemas gastrointestinais como dor no estômago, enjoo, vômitos e perda de apetite; insônia; depressão e ansiedade e disfunção cognitiva, que se manifesta com problemas de memória e cansaço mental
- Doença da válvula cardíaca: hipertensão pulmonar, fragilidade física em mulheres e dor torácica em homens
- AVC: dor de cabeça e alteração do estado mental, principalmente em mulheres
- Arritmia cardíaca: dor no peito, desmaio e ansiedade
- Doença venal e arterial periférica (DVP e DAP): depressão, irritação na pele, sensação de peso nas pernas, síndrome das pernas inquietas e cãibras
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