O reality Casamento às Cegas, cuja 2ª temporada estreou na Netflix no fim de dezembro, propõe que casais se conheçam por meio conversas e se apaixonem sem nunca verem a aparência física um do outro. Só depois de um sim a uma proposta de casamento, é feita a revelação sobre o visual do parceiro. Mas, nesta edição (cujo reencontro dos participantes irá ao ar no dia 1º/2), o que era para ser um conto de fadas virou sofrimento para Amanda Souza, ex-participante do reality, que sofreu gordofobia do parceiro.
“Tudo lá dentro é muito intenso, eu estava apaixonada por ele. E foi horrível não ter dado certo? Sim, mas doeu como decepção amorosa, não como um problema comigo que eu tenho que resolver”, afirma.
Ao se inscrever para um programa que acredita no amor às cegas, Amanda já tinha a certeza que poderia se apaixonar assim, uma vez que preza muito mais pela admiração que carrega pelo outro do que pela sua aparência física. Mas tinha lá suas dúvidas sobre o contrário. “Eu já sabia que existia a possibilidade de rejeição. Até pelo perfil do programa de não ter tido mulheres fora do padrão em outras edições”, conta. “Mas quando surgiu a oportunidade do programa eu pensei: ‘bom, vou viver o que eu já vivo todo dia na minha vida’.”
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Na ocasião, depois de afirmar estar apaixonado por Amanda e aceitar o seu pedido de casamento, o participante Paulo Simi, desistiu após vê-la pela primeira vez, alegando “não saber aguentar uma mulher tão forte e empoderada”. Amanda, segura de si, ficou triste pelo fim do relacionamento, mas nunca quis mudar seu corpo por isso. “Não é sobre mim. É algo que ele tem que resolver com ele.”
Logo depois dos primeiros episódios da segunda temporada irem ao ar, Paulo Simi, que tem o perfil das redes sociais fechado, assumiu o namoro com Bruna Luana, com quem também teve conversas mais profundas no reality. Paulo disse, no programa, que estava dividido entre as duas e se recusou a sair com Bruna, que desistiu do programa. Após o episódio com Amanda, ele voltou a se relacionar com Bruna Luana.
‘Nunca aceitar menos do que mereço’
Criada em uma família com corpos fora do padrão, Amanda sempre se sentiu linda, mas aprendeu, ainda na escola, que nem todos a viam assim. “Eu sempre fui uma pessoa gorda, mas eu tive uma base de criação que me proporcionou ser muito mais segura do que as minhas amigas, por exemplo, que eram magras. Para mim todo mundo era bonito sendo diferente. Na minha casa, a gente se elogiava muito e isso me ajudou a nunca aceitar menos do que eu mereço”.
Apesar da autoconfiança, em muitos momentos Amanda sofreu com comentários, comparações e brincadeiras feitas por outros. E, principalmente na adolescência, a dúvida sobre a beleza do próprio corpo foi maior. “A gente não é de ferro. No meu primeiro casamento, aos 17 anos, eu tomei remédio para emagrecer, porque o meu corpo tinha virado uma questão para o outro. Durante a minha gravidez, onde eu tinha um corpo totalmente novo, eu também sucumbi”, conta.
No entanto, pouco a pouco, Amanda foi aprendendo a se amar incondicionalmente, independente das agressões que possam vir por meio de palavras, gestos ou mensagens das redes sociais. Conforme ela explica, ‘olhar no espelho é olhar para dentro’, por isso ao invés de escutar aos outros ao seu redor, Amanda passou a se escutar. “A minha construção vem de pequenininha, mas a gente precisa aumentar nossa autoestima todos os dias, se autoconhecer cada vez mais, prestar atenção em nós mesmas o tempo todo para não cair nessas armadilhas”, diz.
Terapia e amor-próprio
A partir daí, com muita terapia e amor-próprio, Amanda decidiu que seu propósito era ajudar outras mulheres a enxergarem beleza em si mesmas - algo que se relaciona tanto com o seu trabalho de consultoria de imagem, quanto seu objetivo de ajudar outras mulheres a se amarem profundamente. “Eu falo sempre: a roupa é a cereja do bolo. Se conhecer, saber quem você é e saber que tipo de palavras não ditas você quer colocar na sua imagem é algo revolucionário. Se você se conhece, quem vai te dizer o contrário?”
Claro que apesar da confiança em si mesma, Amanda afirma que tem dias que são mais difíceis. E são neles que ela foca no que ela mais ama em si mesma. “Eu tenho muito orgulho do meu respeito comigo mesma, do meu jeito de amar as pessoas e as coisas, sem medo de errar. É um trabalho diário. O respeito é o maior ato de amor-próprio”, diz.
E foi com essa mentalidade, construída anos atrás, que ela entrou no programa Casamento às Cegas. Por isso, não se sentiu vítima quando foi rejeitada pelo parceiro, apenas triste pelo relacionamento que não avançou. “A mulher rejeitada é uma coitada. Mesmo que a minha ação seja contrária do que as pessoas imaginavam, elas sentem pena e não conseguem compreender que eu entendi que a resposta dele não tinha a ver comigo. E aí você vira uma heroína por simplesmente dar valor ao que você é”, afirma.
Segundo ela, a sociedade ainda não está preparada para esse tipo de empoderamento sobre corpos diferentes. “Tanto é que minha reação é inusitada para todo mundo que assistiu”, diz.
Mesmo sem ter encontrado o amor da sua vida, para Amanda, a ida ao programa valeu a pena para dar visibilidade à autoestima de mulheres gordas. “Está tendo um movimento gigante de ‘eu vejo beleza em você, então eu também posso ver beleza em mim’. Eu vejo que as pessoas que me mandam mensagem estão olhando para mim, mas na verdade, estão olhando pra elas, e isso é algo muito mágico.”
Na próxima quarta-feira, dia 1º de fevereiro, a Netflix divulgará o reencontro da segunda temporada, que promete debater as polêmicas da edição. Amanda participará do episódio e em suas redes sociais prometeu que os fãs irão “descobrir os desfechos” e ela colocará os “pingos nos is”.
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