Os pais costumam responsabilizar o comportamento das crianças que estão “pulando pelas paredes” ao consumo de muito açúcar – mas os especialistas dizem que isso não é verdade.
“É um mito que o açúcar cause hiperatividade”, diz Mark Wolraich, professor emérito de pediatria comportamental no Centro de Ciências da Saúde da Universidade de Oklahoma.
No entanto, ele reconhece que essa “ainda é uma crença forte. Às vezes, é muito difícil mudar impressões arraigadas sobre o que afeta o comportamento.”
Wolraich conduziu estudos nos anos 1990 que refutaram a noção de que o açúcar cause transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) em crianças. Estes incluíram um ensaio controlado randomizado duplo-cego que descobriu que nem o açúcar nem o adoçante artificial aspartame afetavam o comportamento ou a função cognitiva entre as crianças que eram percebidas pelos pais como cheias de energia e “sensíveis açúcar” em comparação àquelas com comportamento “normal”, mesmo quando a ingestão de açúcar excedia os níveis dietéticos típicos. “Foi bastante definitivo”, diz Wolraich.
Os Centros de Controle e Prevenção de Doenças também afirmam que o açúcar não deixa as crianças hiperativas: “A pesquisa não apoia as visões popularmente mantidas de que o TDAH é causado por comer muito açúcar, assistir muita televisão, pela forma de parentalidade ou fatores sociais e ambientais, como pobreza ou caos familiar”.
Os pais provavelmente continuam a fazer essa associação porque as crianças tendem a ficar excessivamente empolgadas durante eventos específicos – festas de aniversário, por exemplo –, quando o cardápio contém itens com alto teor de açúcar, como sorvete, bolo e saquinhos de guloseimas.
Além disso, “as crianças tendem a consumir muito açúcar durante as festas, quando há outras coisas que as animam”, diz Wolraich. “Então, parece que elas estão ficando hiperativas quando estão comendo muitos alimentos açucarados.”
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Como essa crença começou?
Alguns especialistas dizem que sua origem remonta a 1973, quando o alergista Benjamin Feingold vinculou a hiperatividade das crianças à ingestão de cores artificiais de alimentos, aditivos, conservantes e salicilatos – substâncias encontradas em plantas e alimentos e também usadas em muitos medicamentos, como aspirina.
Ele também escreveu um livro popular sobre o tema. Embora o açúcar não estivesse entre os culpados dietéticos criticados por Feingold, muitos pais fizeram a conexão por engano, já que altas quantidades de açúcar andam de mãos dadas com alimentos que contêm corantes e outros aditivos.
Nos últimos anos, estudos conectaram vários corantes artificiais, incluindo o corante vermelho nº 3, à hiperatividade e a outros problemas comportamentais em crianças. Um relatório de 2021 do Escritório de Avaliação de Perigos à Saúde Ambiental da Califórnia concluiu que algumas crianças que consomem corantes alimentares exibem esses efeitos à saúde, embora a sensibilidade a eles varie entre as crianças.
O que mais você deve saber
Mesmo que o açúcar seja absolvido neste caso específico, isso não significa que as crianças podem comê-lo indiscriminadamente, alertam os especialistas.
“O açúcar não é inocentado de outros efeitos adversos à saúde”, diz Donald Hensrud, professor associado de nutrição e medicina preventiva no Colégio de Medicina da Clínica Mayo.
“Ele fornece calorias extras e aumenta o peso, contribuindo para a obesidade e possivelmente para doenças cardíacas mais tarde. Pode causar cáries. Não tem nutrientes, e entra no lugar de outros alimentos que têm.”
Então, qual é a mensagem final para os pais?
“Eu não incentivo dar muito açúcar às crianças”, resume Wolraich. “O açúcar pode ser um fator negativo em uma dieta equilibrada porque seu sabor é muito atraente. Mas o açúcar não tem um alto valor nutritivo. Então, comer muitos alimentos açucarados que são pobres em outros nutrientes dietéticos importantes não é uma boa ideia – mas não por causa da hiperatividade.”
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