Consumo de ultraprocessados causa 57 mil mortes e custa mais de R$ 10 bilhões por ano ao Brasil

Por dia, 156 brasileiros perdem a vida por doenças relacionadas à ingestão de produtos altamente industrializados

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Por Layla Shasta

Um custo humano, mas também financeiro. Segundo novo estudo, o Brasil gasta, por ano, pelo menos R$ 10,4 bilhões com as consequências do consumo de alimentos ultraprocessados para a saúde da população. São despesas diretas com tratamentos no Sistema Único de Saúde (SUS), custos por aposentadoria precoce e licença médica.

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O montante engloba ainda as perdas econômicas por doenças e mortes atribuíveis à ingestão desse tipo de produto, que passa por um longo processo de fabricação e contém ingredientes que não encontramos na cozinha doméstica, como aditivos para substituir a cor, dar aroma e conferir determinada textura. Só em 2019, de acordo com a pesquisa, foram cerca de 57 mil mortes prematuras pelo consumo de ultraprocessados, o equivalente a seis mortes por hora ou 156 por dia.

Os dados são do estudo “Estimação dos custos da mortalidade prematura por todas as causas atribuíveis ao consumo de produtos alimentícios ultraprocessados no Brasil”, realizado pelo pesquisador Eduardo Nilson, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), a pedido da ACT Promoção da Saúde. É a segunda pesquisa divulgada pela entidade neste mês. Na primeira, foi investigado o impacto do consumo de álcool no Brasil.

Alimentos ultraprocessados englobam, por exemplo, refrigerantes, salgadinhos, pães embalados, biscoitos, nuggets, salsichas e hambúrgueres  Foto: Vadym/Adobe Stock

Custos diretos de R$ 1,2 bilhão

O estudo sobre ultraprocessados considerou os gastos federais com as três doenças crônicas mais prevalentes e atribuíveis ao consumo excessivo desses produtos: obesidade, diabetes tipo 2 e hipertensão arterial – segundo a pesquisa Vigitel do Ministério da Saúde, em 2023, 10,2% dos brasileiros adultos declararam ter diabetes, 27,9% afirmaram sofrer de hipertensão e 24,3% relataram ter obesidade.

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Segundo o relatório, do total de R$ 10,4 bilhões em custos, R$ 933,5 milhões correspondem a gastos federais com hospitais, ambulatórios e medicamentos para o tratamento de pessoas com essas condições. Há também um gasto de R$ 263 milhões por ano com previdência e devido à ausência de colaboradores durante o expediente de trabalho (por internações ou licenças médicas).

O maior peso financeiro, de acordo com a análise, está no tratamento de doenças ligadas ao diabetes tipo 2. Os gastos com a doença e condições relacionadas, como a doença renal crônica, representam 41% dos custos diretos.

Em relação ao perfil dos pacientes, o estudo mostra que a obesidade gera custos três vezes maiores para mulheres em comparação aos homens. Por outro lado, estes geram gastos mais elevados com diabetes e hipertensão.

Apesar de os resultados serem alarmantes, os números podem ser ainda maiores. “Esses custos são subestimados, porque a gente não está considerando todas as fontes de gastos e estamos falando de três doenças mais prevalentes, mas sabemos que existem mais de 30 condições associadas a esse consumo”, explica o pesquisador.

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Custos indiretos

Segundo o levantamento, a economia brasileira perde anualmente R$ 9,2 bilhões devido à mortalidade prematura atribuível ao consumo de produtos ultraprocessados. Esses custos ocorrem devido à saída de pessoas em idade produtiva do mercado de trabalho.

Desse total, R$ 6,6 bilhões correspondem aos custos da mortalidade prematura entre homens e R$ 2,6 bilhões entre mulheres. Vale destacar que esse valor reflete, em parte, a maior taxa de mortalidade entre os homens e o fato de eles se aposentarem mais tarde.

A pesquisa também revela os Estados com maior proporção de mortes precoces relacionadas ao consumo de ultraprocessados. O Rio Grande do Sul lidera a lista, seguido por Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Rio de Janeiro, Distrito Federal e Amapá.

Metodologia

O estudo se baseia, primeiramente, em dados consolidados da literatura científica que estabelecem a relação direta entre o consumo desses alimentos e a incidência de obesidade, diabetes tipo 2 e hipertensão.

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Assim, é possível saber a proporção em que cada doença pode ser atribuída aos ultraprocessados e, consequentemente, como cada dado de hospitalizações, tratamentos e custos associados a elas também é relacionável a esses alimentos.

Além disso, a análise considera dados da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2019, que permite entender o nível de consumo entre diferentes grupos da população brasileira.

“Temos um conjunto de dados sobre exposição ao consumo e o risco relativo à cada doença. O segredo é justamente o quanto cada doença é atribuível a esse fator de risco”, explica Eduardo.

O modelo também usou dados do Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM/SUS) para analisar as mortes, e informações econômicas, como salários médios e taxa de emprego, da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD/IBGE).

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Os custos com mortes precoces foram calculados considerando a perda de produtividade de pessoas em idade ativa (20 a 65 anos para homens e 20 a 60 anos para mulheres), levando em conta os salários e a idade média de aposentadoria.

Já nas análises de doenças, as prevalências de obesidade, diabetes e hipertensão foram obtidas com as informações da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS).

Tributação para prevenção

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O relatório propõe algumas medidas para o combate ao consumo de ultraprocessados. A principal é a tributação desses produtos, somada ao barateamento e estímulo à alimentação mais saudável.

Marília Albiero, coordenadora de Inovação e Estratégia da ACT Promoção da Saúde, considera que a Reforma Tributária em discussão no País é uma oportunidade para estimular a saúde alimentar da população. A ideia é incluir os ultraprocessados no chamado “imposto seletivo”, pensado para taxar produtos que fazem mal à saúde e ao meio ambiente.

“Desde a origem da discussão da Reforma Tributária, já havia o consenso da inclusão do tabaco e do álcool nesse imposto. Já os ultraprocessados, não. Isso porque o entendimento de que eles fazem mal à saúde e ao meio ambiente ainda não é tão aderido. Por isso, essas evidências sobre os seus custos e impacto são tão importantes”, diz.

Segundo Marília, embora torne esse tipo de alimento mais caro, a tributação não deve aumentar o custo de vida. Ela destaca que, nesse caso, não haveria uma disparidade econômica, pois os alimentos in natura, como frutas e vegetais, deverão ser protegidos de impostos excessivos, tornando-os mais acessíveis e estimulando o seu consumo.

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“Não existe o falso dilema de que só temos ultraprocessados como fonte de alimentação. Há muitas opções. E nós temos como fazer o País ter uma alimentação saudável a um custo mais barato”.

Nilson completa, destacando que a medida seria uma “sinergia” de esforços. “Você reduz o consumo daquilo que causa danos à saúde, e estimula aquilo que é saudável.”

Além da mudança nos impostos, o relatório destaca políticas complementares, como regulação da publicidade de alimentos, rotulagem clara e programas de educação alimentar, para promover uma alimentação saudável e sustentável.

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