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Da pele à saúde do coração: veja o guia de cuidados para enfrentar o tempo seco

Especialistas de diferentes áreas listam as medidas necessárias para mitigar o impacto da baixa umidade do ar e da poluição no organismo

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Foto do author Victória  Ribeiro
Atualização:

Os sinais da emergência climática, como ocorrência de queimadas, condições meteorológicas atípicas e a poluição, têm contribuído para que o Brasil vivencie a maior seca dos últimos 70 anos. Além dos danos ambientais, o corpo humano é outro impactado pelo cenário. Desde o comprometimento de partes mais sensíveis, como olhos e pele, até o agravamento de doenças respiratórias e cardiovasculares, a baixa umidade do ar cria um ambiente propício para o surgimento de novos problemas de saúde e a intensificação dos já existentes.

Justamente por isso, o período gera a necessidade de uma série de cuidados. Veja abaixo as principais recomendações dos especialistas.

Sistema respiratório

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Conforme explica Humberto Bogossian, pneumologista do Hospital Israelita Albert Einstein, o sistema respiratório, como todo o corpo humano, é composto principalmente por água, e suas vias precisam de lubrificação constante para funcionar de forma adequada, tanto para a circulação do ar quanto para servir de barreira protetora. Quando exposto a ambientes secos e com baixa qualidade do ar, essa área perde parte da umidade, o que pode resultar em irritação e maior vulnerabilidade a problemas que dificultam a respiração.

Entre esses problemas, podem ser citados tosse (que pode se agravar para casos crônicos ou com presença de sangue), inflamações como faringite, rinite e sinusite e até alterações na voz. A sensibilidade da área nasal também pode aumentar a suscetibilidade a infecções virais e bacterianas mais graves, como bronquite pulmonar e Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) — condição com sintomas como falta de ar, pressão no tórax e saturação de oxigênio abaixo do esperado.

Vista do céu de São Paulo poluído por fumaça de incêndios florestais Foto: Daniel Teixeira/Estadao

“Todos esses quadros são ainda mais comuns e preocupantes para aqueles que já possuem condições respiratórias preexistentes, como asma, bronquite e enfisema”, pontua o médico. Além disso, nos casos em que há a união entre temperaturas altas, poluição e partículas de queimadas, as vias aéreas ficam ainda mais suscetíveis a lesões térmicas, com feridas nem sempre fáceis de cicatrizar e que, às vezes, podem ocasionar sangramento.

O presidente da Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial (ABORL-CCF), Fabrizio Romano, destaca que os sangramentos também podem acontecer porque o tecido que reveste o interior do nariz é repleto de pequenos vasos sanguíneos que, de tão delicados, podem acabar estourando quando há uma redução da umidade nasal. “Em crianças, a formação de ‘crostas’ no nariz pode causar desconforto e levar a comportamentos como cutucar o nariz. Em pessoas com alergias, como rinite, a cicatrização é ainda mais difícil devido à tendência de coçar o nariz, o que provoca fricções adicionais”, explica.

Recomendações

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  • Uso de máscara: “o máximo de tempo possível”

Além de ser importante para evitar o desenvolvimento de quadros de tosse, inflamação e até mesmo infecções virais e bacterianas, no atual contexto, a máscara é indicada por proteger contra componentes da fumaça proveniente das queimadas, como é o caso do monóxido de carbono (CO).

Segundo o infectologista Jasem Orellana, o CO pode impedir o transporte de oxigênio no corpo humano, sendo um gás muito perigoso para a saúde. Por isso, ele sugere o uso de máscaras do tipo N95, PFF2 ou P100, também recomendadas pelo Ministério da Saúde. “A qualidade do ar está em patamares insalubres e há muitos dias. Não estamos falando de exposição à poluição tóxica curta ou esporádica, e sim exaustiva”, compara.

De acordo com o médico, as máscaras cirúrgicas, mais simples, até podem barrar o material mais denso proveniente da fumaça, mas não filtram as micropartículas, que são justamente as que estão mais associadas aos problemas de saúde. “Nessas condições de duradoura exposição à fumaça tóxica, usar máscara doméstica ou de pano ajuda muito pouco e pode dar a falsa sensação de proteção, especialmente em pessoas mais vulneráveis, como aqueles com doença pulmonar crônica ou outras doenças pré-existentes”, diz.

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  • Hidratação e nebulização

A ingestão de água é fundamental para mitigar os efeitos negativos da baixa umidade do ar porque ajuda a manter as mucosas das vias respiratórias bem hidratadas, tornando-as mais eficientes em barrar a entrada de patógenos, como vírus e bactérias, além de minimizar a irritação e inflamação.

Outro meio de conseguir essa hidratação é fazer inalação (apenas com soro fisiológico), o que auxilia no alívio dos sintomas. Ambas as alternativas ajudam, inclusive, com as lesões no nariz, reduzindo os episódios de sangramento.

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  • Umidificar o ambiente: baldes de água, toalhas e umidificadores

Outra dica, conforme Bogossian, é apostar em umidificadores de ar, já que esses dispositivos são projetados para liberar vapor de água no ambiente, aumentando diretamente a umidade do ar. Se não for possível, há algumas medidas caseiras que podem ajudar, como espalhar baldes e vasilhames com água pela casa (sempre trocando com frequência) e pendurar toalhas molhadas pelo ambiente.

Além isso, limpar a casa com frequência, evitando o acúmulo de partículas provenientes de queimadas, e substituir o ventilador por ar-condicionado, se possível, também podem ser boas alternativas. Isso porque o aparelho, na maioria das vezes, conta com a opção de recirculação interna do ar, evitando a entrada do ar externo, geralmente mais poluído.

Umidificar o ambiente é importante para reduzir o impacto do tempo seco nas vias aéreas, afirmam especialistas Foto: Leonardo Soares/Estadão

Olhos

Segundo o presidente da Sociedade Brasileira de Oftalmologia (SBO), Oswaldo Moura Brasil, a baixa umidade do ar tende a ressecar a superfície ocular, gerando sintomas como ardência, sensação de corpo estranho e vermelhidão. Além disso, as micropartículas da fumaça das queimadas podem irritar ainda mais a superfície dos olhos, agravando condições preexistentes, como deficiência na produção lacrimal, e causando desconforto.

Entre os problemas que isso pode gerar, o médico menciona a ceratite, uma inflamação da córnea e da superfície ocular, com possível perda na qualidade da visão. Essa condição pode ser bastante incômoda e frequentemente requer tratamento especializado. “Sintomas como ardência, sensação de areia no olho e vermelhidão são indicativos de ceratite. Nesse caso, o indicado é procurar um oftalmologista o mais rápido possível para evitar o agravamento do quadro e a piora dos sintomas”, orienta.

  • Uso de colírios

Entre as medidas recomendadas, o médico menciona o uso de colírios. Esses produtos ajudam a melhorar a estabilidade do filme lacrimal e proporcionam alívio ao combater os efeitos adversos do ressecamento ocular e da poluição.

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“A frequência do uso vai depender do tipo de colírio. Se é apenas para melhorar o ressecamento, os colírios lubrificantes já ajudam. Agora, se existe algum outro problema envolvido, às vezes, a pessoa vai precisar de um colírio com antibióticos, por exemplo. Nesse caso, é necessário consultar um especialista.”

Esportes ao ar livre não são recomendados nos dias mais secos e poluídos Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Pele

De acordo com a dermatologista Paola Pomerantzeff, membro da Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD), o tempo seco prejudica consideravelmente a pele e seus anexos, como unhas e cabelo. Isso porque, sem a umidade necessária, a água presente nas camadas superficiais da pele evapora mais rapidamente, resultando em uma textura áspera e seca, podendo levar a coceiras e descamação. “No momento atual, em que também há uma exposição a partículas de fumaça e de poluição, o quadro é pior, já que esse tipo de partícula compromete as células saudáveis da pele, dificultando a hidratação”, afirma.

Esse ressecamento extremo pode levar a unhas quebradiças, cabelos “esturricados” e lábios extremamente ressecados e rachados. Além disso, coceiras são comuns. “Muitas pessoas chegam ao consultório reclamando de coceira e se preocupam com ser alguma patologia, mas na verdade tem a ver com pele ressecada, algo muito comum no período que estamos vivendo”, diz.

Entre os principais prejudicados, a dermatologista Mônica Aribi, também integrante da SBD, menciona pessoas com condições dermatológicas preexistentes, como eczema ou psoríase. Esses quadros já comprometem a capacidade da pele de se manter hidratada, e o tempo seco intensifica os sintomas. “Além disso, indivíduos em tratamento com medicamentos que causam ressecamento, como isotretinoína, conhecida como Roacutan, também são especialmente afetados, principalmente nas mucosas, e podem experimentar um ressecamento ainda maior do que a população geral.”

Recomendações

  • Muita hidratação (no mínimo, 2 litros de água por dia)
  • Evitar banhos quentes e longos
  • Evitar o uso excessivo de sabonete e de bucha durante o banho (água quente, sabonete e bucha removem o manto lipídico natural da pele, dificultando a hidratação)
  • Aplicar hidratante no corpo todo após o banho, inclusive na face, nas mãos e nas unhas
  • Usar um hidratante labial com frequência
  • Antes de hidratar a face, lavar e higienizar para remover resíduos de poluição e fumaça
  • Lavar o cabelo diariamente ou ao menos em dias alternados (ao contrário do que se imagina, essa frequência é boa para a higienização correta do couro capilar, mas é importante também apostar na hidratação dos fios)
  • Evitar cremes com presença de ácidos, principalmente retinóico, tretinoína e salicílico

Vale ressaltar que com o tempo seco e o aumento das partículas de poluição, a exposição solar sem proteção é ainda mais arriscada. “A poluição potencializa o efeito nocivo da radiação ultravioleta sobre a pele, acelerando ainda mais o fotoenvelhecimento cutâneo. Então, tomar sol para se “bronzear” nesses dias nem pensar”, diz Paola.

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A hidratação pode ser feita com hidratantes específicos para cada tipo de pele. Mas uma dica interessante, especialmente para o rosto, é usar hidratantes com ácidos hialurônicos de diferentes pesos moleculares — os de menor peso penetram mais profundamente e os de maior peso ficam na superfície. Dessa maneira, a pele se hidrata “por inteiro”.

Problemas cardiovasculares

Segundo o cardiologista Álvaro Avezum, coordenador do Centro Internacional de Pesquisa do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, a umidade reduzida intensifica os efeitos da poluição atmosférica, resultando em uma maior concentração de partículas prejudiciais que entram no sistema respiratório e circulatório. Esses fatores estão associados a um aumento na incidência de eventos cardiovasculares, como infarto do miocárdio e acidente vascular cerebral (AVC).

Além disso, o calor extremo combinado com baixa umidade pode levar à desidratação (excesso de suor), o que pode ocasionar episódios de pressão baixa, arritmias cardíacas e piora da função renal. “Os principais afetados por esses cenários são pacientes com histórico de eventos cardíacos, como infarto e AVC, que estão mais propensos a novos episódios. Pessoas com problemas respiratórios preexistentes, como enfisema e asma, também enfrentam riscos aumentados, assim como os idosos, mais suscetíveis a complicações”, destaca.

Recomendações

  • Hidratação constante
  • Evitar exposição prolongada ao calor
  • Uso de máscara
  • Evitar a prática de exercícios físicos em condições de calor extremo e baixa umidade
  • Apostar em medidas de umidificação (umidificadores, baldes com água)
  • Alimentação saudável

Prática de exercícios físicos

Dentre as precauções que devem ser tomadas nesse período, está também a prática cuidadosa de exercícios físicos. Conforme explica Karina Hatano, médica do esporte do Hospital Israelita Albert Einstein, os exercícios podem ocasionar uma desidratação ainda maior por meio do suor. Além disso, pode haver um aumento do ressecamento da região nasal, causando irritação e aumentando o risco de problemas como crises de asma.

  • Exercícios a serem evitados

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Exercícios de alta intensidade e longa duração, como corridas de rua, ciclismo e treinos de maior volume, devem ser evitados durante períodos de baixa umidade e alta poluição. “Essas atividades exigem mais oxigênio e resultam em maior inalação de ar poluído e seco, o que pode sobrecarregar o sistema cardiovascular e respiratório”, explica Karina.

  • Exercícios em lugares fechados

Enquanto exercícios ao ar livre devem ser evitados nesse período, atividades realizadas em ambientes fechados podem ser uma alternativa, desde que o local seja bem ventilado e climatizado.

  • Horários recomendados

Os melhores horários para praticar exercícios em períodos de tempo seco são no início da manhã, antes das 10 horas, ou no fim da tarde, após as 16 horas. Nesses momentos, a temperatura tende a ser mais amena e a umidade do ar pode estar um pouco melhor.

  • Hidratação

A prática esportiva, especialmente nos períodos secos, exige uma boa hidratação. Beber (bastante) água antes, durante e depois dos exercícios é a melhor alternativa para evitar a desidratação e proteger as vias aéreas.

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