Dengue: Vacina de dose única do Butantan manteve eficácia após mais de três anos, diz estudo

Proteção contra a doença foi de 67,3%; eficácia contra dengue com sinais de alarme e grave foi de 89%

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Foto do author Leon Ferrari
Atualização:

Dados do estudo de fase 3 da vacina de dose única contra dengue do Instituto Butantan, publicados nesta segunda-feira, 5, na revista científica The Lancet Infectious Diseases, mostraram que o imunizante manteve a segurança e a eficácia 3,7 anos, em média, após a aplicação.

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Pela primeira vez, foram apresentados dados sobre a proteção contra a dengue com sinais de alarme e grave, independentemente de internação hospitalar. Nesses casos, a eficácia foi de 89%, de acordo com o artigo. Anteriormente, como a frequência desses casos era baixa, não havia sido possível relatar a taxa.

Foram acompanhados mais de 16 mil pacientes de 2 a 59 anos durante um período de 2 a 5 anos (média de 3,7 anos). A eficácia da vacina contra a dengue, chamada de Butantan-DV, foi de 67,3%.

Produção da vacina contra dengue no Instituto Butantan Foto: Divulgação/Comunicação Butantan

O virologista Maurício Nogueira, professor da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (Famerp) e primeiro autor do estudo, conta estar muito feliz e orgulhoso dos resultados, fruto do trabalho de brasileiros — do desenho da pesquisa ao financiamento.

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“Ter uma eficácia muito alta contra a doença com sinais de alarme e grave é fundamental, porque são as situações que causam um peso muito grande dentro do sistema de saúde. São essas pessoas que vão ser internadas e que têm risco de evoluir para óbito”, afirma Nogueira.

Fernanda Boulos, diretora médica do Instituto Butantan e coautora da pesquisa, também ressalta os resultados positivos. “O Butantan entende que o seguimento de 3,7 anos confirma os dados publicados anteriormente sobre a eficácia e segurança da vacina, além de trazer um dado bastante relevante: a eficácia de 89% para casos de dengue grave/dengue com sinais de alarme. Estamos otimistas e confiantes no potencial desta vacina como uma ferramenta na prevenção contra dengue”, diz.

“O resultado para dengue sintomática já é bastante bom, e 89% contra a dengue com sinais de alerta, que é a que mais hospitaliza e mais mata, é excelente. Hoje, o objetivo maior das vacinas é evitar as formas graves da doença”, aponta Isabella Ballalai, diretora da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), que não esteve envolvida no estudo.

Em uma publicação anterior, de um acompanhamento de 2 anos, a eficácia da Butantan-DV havia sido de 79,6%. “Temos visto isso em basicamente quase todas as vacinas. A partir de um certo tempo, começa a diminuir a eficácia”, comenta Nogueira.

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Segundo ele, esse é um ponto que precisa ser observado a partir da divulgação de novos dados de acompanhamento e pode gerar uma discussão sobre a necessidade de doses de reforço contra o vírus, que possui quatro sorotipos (DENV-1, DENV-2, DENV-3 e DENV-4).

Proteção contra os sorotipos da doença

No País, a vacina contra dengue da farmacêutica Takeda, a Qdenga, é aplicada na rede privada desde o ano passado e foi disponibilizada no Sistema Único de Saúde (SUS) no início de 2024. O imunizante tem aprovação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para aplicação em pessoas de 4 a 59 anos, mas na rede pública, por ora, é oferecido apenas para crianças e adolescentes de 10 a 14 anos.

Após duas doses, a eficácia geral da Qdenga contra a dengue foi de 80,2% nos testes. O imunizante também conseguiu reduzir hospitalizações pela doença em 90,4% após 18 meses da segunda injeção, de acordo com a farmacêutica.

Os especialistas destacam, porém, que é inadequado comparar a eficácia de vacinas porque os desenhos dos estudos são diferentes. “A eficácia é medida numa situação extremamente controlada do ensaio clínico. O que você pode comparar é efetividade, ou seja, como a vacina funciona no mundo real. E nós não temos esse dado para nenhuma das duas”, diz Nogueira.

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No novo estudo, a vacina do Butantan mostrou uma eficácia de 75,8% contra o sorotipo DENV-1 e 59,7% contra o DENV-2. Embora o período de acompanhamento, de 2016 a 2021, tenha abrangido diferentes temporadas de dengue, não houve infecções causadas pelo sorotipo DENV-3 ou DENV-4, o que impossibilitou avaliar a proteção contra eles.

No artigo, os pesquisadores informam que um relatório de avaliação de eficácia e segurança a longo prazo está planejado assim que os 5 anos completos de acompanhamento forem concluídos, mas, de acordo com Nogueira, dificilmente será possível demonstrar eficácia contra esses dois sorotipos nessa publicação. O número de pessoas que ainda estavam em acompanhamento era muito baixo, a maioria já tinha completado o período de acompanhamento de cinco anos, diz.

“Isso é um motivo de preocupação. Mas existem algumas condições que podemos chamar de atenuantes”, afirma. Segundo ele, há dados de um estudo experimental dos Estados Unidos, no modelo de desafio humano (pessoas infectadas intencionalmente com o vírus), que mostram que a vacina foi eficaz contra DENV-3.

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Além disso, algumas formulações muito parecidas com a da Butantan-DV, como a da farmacêutica Merck, cujo componente de DENV-3 e DENV-4 é o mesmo, estão em teste na Ásia neste momento, e provavelmente haverá dados de eficácia contra esses sorotipos em um futuro próximo.

A Qdenga não demonstrou eficácia contra DENV-3 em indivíduos soronegativos para dengue (que nunca tiveram a doença). Não foi possível avaliar a proteção contra DENV-4 em indivíduos soronegativos devido ao baixo número de casos.

Pronta para ser aprovada?

Segundo Fernanda Boulos, a submissão à Anvisa está acontecendo em fases e foi iniciada em abril deste ano, com duas etapas já cumpridas. A expectativa é finalizar esse processo até o fim de 2024. “Com a finalização da submissão em 2024, esperamos obter aprovação da Anvisa e disponibilizar a vacina para o Ministério da Saúde em 2025″, afirma.

Nogueira avalia que já há evidências suficientes para embasar uma aprovação da agência. “Com os dados desses estudos, mais os dados que temos na literatura de outros estudos, dados de imunogenicidade, dados de anticorpos, os estudos feitos com desafio humano, considerando a soma de todos esses dados, acredito que a Anvisa possa e deva autorizar o uso dessa vacina.”

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Apesar de considerar os resultados do atual estudo, Isabella, da SBIm, destaca que a avaliação da Anvisa é muito mais rigorosa do que a de um paper revisado por pares para publicação em uma revista científica.

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