A dermatite atópica (DA) afeta de 15% a 25% das crianças e cerca de 7% dos adultos no Brasil, de acordo com a Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD). Trata-se, portanto, de uma doença relativamente comum na infância, e que pode acompanhar o indivíduo ao longo da vida. Apesar disso, segundo a entidade, a dermatite atópica é pouco conhecida pelos brasileiros.
O que é dermatite atópica?
É uma doença inflamatória crônica caracterizada por lesões de eczema (vermelhas e grossas), secura e coceira na pele. Outra característica da doença é a recorrência, já que, segundo a SBD, ela costuma alternar entre períodos de melhora e piora dos sintomas, “podendo haver intervalos de semanas, meses ou anos entre uma crise e outra”.
Além disso, a dermatite atópica faz parte do grupo de doenças atópicas, ou seja, que não estão diretamente ligadas a um fator externo específico e que têm relação entre si. “Por isso, pessoas que têm alguma atopia, sejam as respiratórias (como rinite, bronquite e asma) ou alergias alimentares, têm mais chances de desenvolverem a dermatite atópica e vice-versa”, explica a dermatologista Silvia Mayor, responsável pelo Setor de Dermatologia Pediátrica da Santa Casa de São Paulo e membra da SBD.
O que causa a dermatite atópica?
Essencialmente, a dermatite atópica está ligada a fatores genéticos, de acordo com o dermatologista Heitor Gonçalves, presidente da Sociedade Brasileira de Dermatologia. Apesar disso, fatores externos podem disparar e piorar os sintomas, segundo o especialista.
“Pessoas com essa tendência genética, sob determinadas condições, sofrem alterações no sistema imunológico que levam a reações exacerbadas. Isso resulta na produção de substâncias inflamatórias e na diminuição da barreira de proteção da pele. Consequentemente, a pele fica mais suscetível à perda de água e mais seca, o que facilita o surgimento de inflamações”, descreve Gonçalves.
Apesar de não serem a causa, fatores externos podem piorar o quadro de dermatite atópica, segundo a Sociedade Brasileira de Dermatologia. Confira alguns deles:
- Suor excessivo (favorecido por ambientes e roupas quentes e variações de temperatura);
- Baixa umidade do ambiente (porque aumenta o ressecamento da pele);
- Uso de roupas de lã e de tecidos sintéticos e ásperos (aumentam a coceira);
- Uso exagerado de sabonete;
- Situações de estresse. De acordo com Gonçalves, a adrenalina liberada nesses momentos aumenta a sensibilidade da pele em relação às substâncias que causam inflamação;
- É possível que alguns alimentos piorem os quadros de dermatite atópica, mas, segundo a SBD, essa relação não está totalmente estabelecida.
Qual a diferença entre a dermatite atópica e as outras dermatites?
Além da atópica, existem as dermatites de contato e a seborreica. Todas são inflamações na pele, mas a de contato, conforme o nome indica, é provocada pelo contato com um fator externo, como poeira ou mofo. Já a seborreica, muito conhecida pela descamação do couro cabelo, é caracterizada pela vermelhidão no centro da face do bebê. Na atópica, isso costuma acontecer nas extremidades da face, como na testa e nas bochechas, destaca Silvia.
Vale destacar que, de acordo com a SBD, a causa da dermatite seborreica não é totalmente conhecida.
A dermatite atópica é contagiosa?
Segundo pesquisa realizada pelo Instituto Datafolha em outubro de 2020 e divulgada pela SBD, três em cada 10 brasileiros acham que a dermatite atópica é contagiosa. Trata-se, porém, de um mito que implica em preconceitos e estigmas sobre os pacientes afetados.
De acordo com Silvia, essa confusão acontece porque a coceira e a inflamação, comuns na dermatite atópica, também estão presentes em outras doenças de pele contagiosas, como a sarna. “Mas, em relação à dermatite atópica, não há contágio, já que, para desenvolvê-la, são necessários fatores genéticos”, repete.
Por que a dermatite atópica aparece principalmente em crianças?
Segundo Gonçalves, os motivos dessa maior prevalência não são claros. Porém, ele acredita que o quadro melhore ao longo do tempo devido a uma “acomodação” do sistema imunológico à alteração genética típica da doença. “A dermatite atópica costuma surgir a partir dos três meses de idade e é possível que, ao longo dos anos, a sensibilidade aos fatores que causam alergia diminua”, explica.
Inclusive, a Sociedade Brasileira de Dermatologia aponta que aproximadamente 70% das crianças que apresentam dermatite atópica evoluem com a remissão (estágio em que a doença está sob controle) na adolescência. Apesar disso, a entidade destaca que há casos menos comuns em que a dermatite atópica surge na fase adulta.
Em que partes do corpo ela aparece?
Depende da faixa etária do paciente. De acordo com o Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas da Dermatite Atópica do Ministério da Saúde, os locais mais afetados e as principais características da doença por grupo etário são:
- Infância (0-2 anos): Lesões caracterizadas por uma vermelhidão pouco definida com inchaço, caroços, feridas e secreções na pele. Normalmente, acomete rosto, bochechas e tronco (exceto a área da fralda);
- Infância e adolescência (2-16 anos): A vermelhidão se torna mais localizada e crônica, com uma coloração mais branca, pele mais seca e lesões mal definidas. Normalmente, aparece nas áreas flexoras (como as dobras dos joelhos e cotovelos).
- Adultos: Vermelhidão crônica nas mãos, no pescoço, na cabeça, no tronco, nos ombros e no couro cabeludo.
Qual a gravidade da dermatite atópica?
A dermatite atópica pode ter gravidade baixa (mais comum), média ou severa. O que vai determinar a seriedade do quadro, de acordo com Gonçalves, são três fatores: a quantidade de lesões na pele; a intensidade da coceira; e o impacto na qualidade de vida do paciente.
O último ponto, segundo o especialista, está muito ligado ao desconforto e coceira provocados pela doença que, no caso das crianças, impede o sono e acaba afetando toda a família. “Já imaginou uma criança de 4 anos que não dorme? A qualidade de vida da família inteira é prejudicada”, explica.
O constrangimento social também pode ser um fator desencadeador de distúrbios psiquiátricos, de acordo com Gonçalves. “Por vergonha das feridas na pele, muitas pessoas acabam deixando de sair e desenvolvendo transtornos como depressão e ansiedade”, pontua.
Além disso, o presidente da SBD explica que, em casos extremos, é possível que a coceira na pele cause feridas que facilitam o aparecimento de infecções secundárias na região, seja por vírus, bactérias ou fungos.
Como é o tratamento da dermatite atópica?
A dermatite atópica é uma doença crônica, que não tem cura. Por isso, o seu tratamento consiste no controle dos sintomas (principalmente, coceira e inflamação), além da prevenção de crises.
Nos casos menos graves, a dermatologista Carolina Contin, coordenadora da equipe de Dermatologia Pediátrica do Hospital Infantil Sabará, conta que o tratamento consiste no uso de pomadas anti-inflamatórias e em cuidados com a pele. “Usar sabonetes e hidratantes específicos para quem tem dermatite atópica, além de tomar banhos rápidos, mornos e não utilizar esponjas são hábitos que ajudam”, lista.
Já nos quadros moderados e graves, costumam ser prescritos medicamentos anti-inflamatórios e imunossupressores (que controlam as reações do sistema imunológico) por via oral ou venosa. Recentemente, segundo a especialista, passaram a ser usados fármacos biológicos ou imunobiológicos (feitos a partir de organismos vivos) em algumas situações. Vale destacar que a automedicação é contraindicada e pode trazer riscos. O indicado é consultar um médico para ter um tratamento adequado.
Como prevenir a dermatite atópica?
Por ser uma doença com base genética, é difícil evitar o surgimento da dermatite atópica, de acordo com a SBD. Consequentemente, a sua prevenção, assim como o seu tratamento em casos leves, consiste em hábitos para evitar o agravamento dos sintomas. Confira:
- Melhorar as condições da barreira da pele. Para isso, é recomendado usar hidratantes ou emolientes sem cheiro, pelo menos duas vezes ao dia;
- Evitar banhos muito quentes e demorados;
- Não usar sabonetes direto na pele lesionada. Nesses casos, optar por loções de limpeza;
- Aliviar a coceira com compressas frias e, nos casos graves, com o medicamentos anti-histamínicos;
- Manter as unhas das crianças curtas para reduzir o risco de lesões a partir da coceira. Caso a coceira noturna seja um problema grave, pensar na possibilidade de recorrer a luvas leves;
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