Lula relata dor na cabeça do fêmur: por que isso acontece e como tratar?

Segundo especialistas, a dor articular do quadril têm várias causas, que dependem da idade do paciente; em geral, quando acomete pessoas com mais idade se deve a uma artrose ou desgaste

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Foto do author Renata Okumura
Atualização:

Dor sentida na bacia, bem na articulação que faz o movimento do quadril, a dor na cabeça do fêmur pode ser causada por múltiplas razões, que variam conforme a idade do paciente. Mulheres e homens podem ser acometidos pelo quadro clínico.

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Neste mês, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), de 77 anos, afirmou que sente esse tipo de dor e pediu ajuda para o senador Otto Alencar (PSD-MG), que é médico, para “curá-lo”. O presidente disse tomar injeção todo dia, mas que isso já não resolve.

“Depois, vou fazer uma consulta com o Otto (Alencar), estou com um problema na cabeça do fêmur, e você é ortopedista, sabe disso, e você sabe que você vai ter que me curar”, queixou-se Lula, em evento de assinatura da Lei Paulo Gustavo, em Salvador.

O presidente reclamou ainda que essa dor o impede de jogar futebol. “Tomo injeção, já não resolve, é você que vai me curar, Otto, quero ver sua experiência”, pediu. Lula voltou a repetir que, apesar da idade, ele tem “energia de 30 (anos) e tesão de vontade de 20 anos de brigar por esse País.”

O desgaste do quadril é uma doença característica de idosos. Estima-se que a artrose do quadril acometa entre 10 a 20% das pessoas com mais de 60 anos.

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O que significa dor na cabeça do fêmur?

É uma dor sentida na bacia, bem na articulação que faz o movimento do quadril. O quadro clínico pode ser causado por diversas razões, que variam conforme o avanço da idade do paciente.

“Em pessoas mais velhas, como o presidente Lula, pode estar associado a uma artrose, um desgaste no quadril. Pessoas de meia-idade podem ter o que chamamos de osteonecrose do quadril, associada geralmente a medicamentos como corticoides e à ingestão de bebidas alcoólicas. Por fim, em crianças, pode se dever a infecções, inflamações e à doença de Perthes, que também é uma necrose do quadril”, afirmou David Nordon, supervisor do programa de residência médica de Ortopedia e Traumatologia e professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).

Segundo ele, é muito importante dizer ainda que casos de desgaste precoce do quadril, ou seja, artrose em torno dos 40 e 50 anos, podem estar ligadas a displasias do desenvolvimento do quadril que não foram diagnosticadas e tratadas na infância.

“Estamos supondo que, pela idade dele e pelo que ele descreveu, o quadro mais comum de gerar este tipo de problema na idade dele é a artrose. Existem ainda outras situações que podem provocar dor na articulação como uma lesão ligamentar, uma lesão cartilaginosa ou osteonecrose, mas o mais comum e pacientes de idade é o desgaste ou artrose do quadril”, Fabiano Nunes, médico ortopedista da BP - A Beneficência Portuguesa de São Paulo.

Quais os sintomas?

Segundo Nordon, os desgastes do quadril normalmente se apresentam com restrição de movimentos, em especial, fletir o quadril e cruzar as pernas, e uma dor mecânica, ou seja, ao se iniciarem movimentos e após atividades físicas. “É muito comum dor ao se levantar pela manhã ou após ficar sentado, quando o corpo ‘esfriou’ e após caminhadas ou subir escadas”, afirma o especialista.

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“Em artroses mais leves, o que temos é dor, quando a gente vai pisar no chão. Essa dor, habitualmente, começa logo nos primeiros passos, logo no início da marcha, e conforme vamos andando, vai esquentando e melhorando um pouco. Depois, a dor volta a incomodar mais, já no fim do dia, após um esforço maior. De acordo com a gravidade, a dor vai aumentando e durando mais tempo, podendo durar o dia todo”, completa Nunes, da BP.

Além da dor, a artrose, de acordo com ele, gera uma deformidade na cabeça femoral, que muda o formato esférico da cabeça femoral, e por deixar de ser esférica, ou seja, perder o formato redondo, faz com que a pessoa comece a perder o movimento. “Além de dor, limitação de movimento. A pessoa pode ter dificuldade, por exemplo, para abrir as pernas ou para fletir o quadril. Também pode mancar”, acrescenta Nunes.

“O quadril tem uma grande variedade de movimentos. Faz a flexão, a extensão, a abertura e o fechamento e as rotações internas e externas. Então, existem seis movimentos do quadril, em três planos diferentes, e esses movimentos acabam sendo comprometidos por causa desta irregularidade da articulação, em decorrência do desgaste”, afirma Guilherme Val Sella, ortopedista do Hospital Leforte - Unidade Liberdade.

Na noite de quinta-feira, 11, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), de 77 anos, afirmou que sente dor na cabeça do fêmur. Foto: Wilton Junior/Estadão

Quem é mais acometido pelo quadro clínico?

O desgaste do quadril é uma doença característica de idosos. Estima-se que a artrose do quadril acometa entre 10 a 20% das pessoas com mais de 60 anos, sendo mais comum em homens até os 45 anos, principalmente por osteonecrose da cabeça do fêmur, mas afetando mais mulheres após esta idade - o que pode se relacionar à displasia do quadril, que é dez vezes mais comum em mulheres.

“Além da artrose do quadril, em idosos, outras possíveis causas de dor, embora muito mais raras, são os tumores, como metástases, mieloma múltiplo, ou condrossarcoma. Nestes casos, a dor não se deve ao desgaste, mas, sim, ao crescimento do tumor, e o diagnóstico é dado com uma radiografia”, acrescenta Nordon.

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Ainda de acordo com Sella, do Hospital Leforte, além dos idosos, pacientes que fazem esportes de impactos também podem ser acometidos pela doença. “Pacientes corredores, jogadores de futebol ou aqueles que realizam muitos saltos, como jogadores de vôlei e basquete, que levam a um impacto muito grande, ao longo da vida, da articulação do quadril, acabando provocando as degenerações.”

Como é feito o diagnóstico?

O diagnóstico começa pela suspeita clínica e exame físico, com as características da dor e comprometimento dos movimentos. “Depois, ele é confirmado com uma radiografia, que mostrará alterações na cabeça do fêmur, o osso da coxa, e do acetábulo, o local da bacia onde ele se encaixa, com desgaste, formação de esporões, perda de espaço articular e osteopenia (diminuição da densidade óssea)”, afirma o supervisor do programa de residência médica de Ortopedia e Traumatologia e professor da PUC-SP.

Para descobrir a causa, algumas vezes o médico pode solicitar uma ressonância magnética, que irá mostrar os casos de osteonecrose, ou até mesmo da osteoporose transitória, uma doença incomum, que também pode causar dor nos quadris, especialmente em gestantes.

Para Nunes, médico ortopedista da BP, o diagnóstico vai depender da causa e do grau. “Artroses muito leves, onde só tem uma lesão de cartilagem, só pode ser vista por meio de um exame de ressonância. Conforme o desgaste vai aumentando, em quadros mais avançados, a pessoa começa a ter alterações anatômicas, visíveis ao Raio X, começa a diminuir o espaço articular, ter deformidades na cabeça do fêmur, então, é possível fazer o diagnóstico com Raio X.”

Quais os tipos de tratamento?

O tratamento varia conforme a causa da artrose. “Contudo, de modo geral, recomendamos o controle ou a perda de peso, para evitar a sobrecarga articular; atividades físicas sem impacto, como bicicleta, em vez de caminhadas, que podem causar mais dor; fortalecimento muscular, por meio de musculação ou fisioterapia”, disse Nordon.

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Outros métodos são a infiltração articular com ácido hialurônico, que ajuda a melhorar a dor. “Além disso, usamos medicações analgésicas para controle de dor. É importante lembrar que, especialmente em idosos, deve-se evitar o uso de anti-inflamatórios, pois aumentam o risco de infarto, derrame, úlcera gástrica e insuficiência renal”, acrescenta o especialista da PUC-SP.

Também é muito importante ressaltar que nenhum medicamento conseguirá refazer a cartilagem articular que foi gasta com o tempo. “É como gastar uma peça de carro: não dá para ‘recauchutar’. Assim, o tratamento final para todas as artroses é a prótese de quadril.”

Segundo Nordon, a prótese de quadril substitui tanto o acetábulo, o osso da bacia, quanto a cabeça do fêmur, o osso da coxa. As próteses mais avançadas, de cerâmica, têm uma durabilidade de mais de 25 anos e resultados excelentes, melhorando muito a qualidade de vida do paciente.

“A qualidade de vida de vida de um paciente com prótese é muito alta. Claro, são recomendados alguns cuidados especiais. Voltar a jogar futebol, por exemplo, são atividades que devem ser evitadas para evitar complicações com a prótese, que podem ocasionar fraturas no local da prótese ou luxações, quando a prótese sai do lugar. Mas a vida diária é absolutamente normal”, avalia Sella, ortopedista do Hospital Leforte.

Tem cura?

Não. “Nada vai reconstruir a articulação que foi gasta, então, estritamente falando, não há cura para artrose. É um processo natural do envelhecimento. No entanto, temos tratamentos que melhoram muito a qualidade de vida. A prótese, que é uma substituição articular, pode não curar a artrose (estamos substituindo, não refazendo uma articulação), mas ela certamente resolve o problema na grande maioria dos casos”, avalia o supervisor do programa de residência médica de Ortopedia e Traumatologia e professor da PUC-SP.

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Toda lesão degenerativa é irreversível. “Quando a gente fala em tratamento para uma lesão degenerativa é para que aliviar a dor e não aumente e piore a lesão. Quem tem um desgaste articular dificilmente terá uma articulação normal de novo. A gente consegue fazer essa articulação não doer, não aumentar e até melhor um pouco com os biológicos que são usados hoje em dia. Mas fazer uma desgaste grave voltar a ser uma articulação normal, ainda não é possível.”

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