THE NEW YORK TIMES – Tudo começou com uma leve ansiedade. Emily, que pediu para ser identificada apenas pelo primeiro nome para falar abertamente sobre sua saúde mental, tinha acabado de se mudar para Nova York após um curso de pós-graduação, para começar a trabalhar no departamento de marketing de um grande escritório de advocacia.
Ela sabia que era normal se sentir um pouco nervosa. Mas não estava preparada para o que viria a seguir: insônia crônica.
Com apenas três ou quatro horas de sono por dia, não demorou muito para que sua ansiedade aumentasse: aos 25 anos, ela ficava “muito nervosa o tempo todo. Um caos”.
Certo dia, quando um advogado do escritório gritou com ela, Emily teve o primeiro de muitos ataques de pânico. Por sugestão de um médico, tentou tomar remédio para dormir, na esperança de que isso pudesse “reiniciar” seu ciclo de sono e melhorar seu humor. Não funcionou.
Os americanos sofrem cronicamente de privação de sono: um terço dos adultos nos Estados Unidos afirmam dormir menos de sete horas por noite. Os adolescentes se saem ainda pior: cerca de 70% dos estudantes do ensino médio não dormem o suficiente nos dias de semana.
E isso tem um efeito profundo na saúde mental.
Uma análise de 19 estudos descobriu que, embora a privação de sono tenha piorado a capacidade de uma pessoa pensar com clareza ou realizar certas tarefas, teve um efeito ainda mais negativo no humor. Na pesquisa que a Fundação Nacional do Sono realizou em 2022, metade das pessoas que disseram dormir menos de sete horas por dia durante a semana também relataram ter sintomas depressivos. Algumas pesquisas indicam que a simples iniciativa de combater a insônia pode ajudar a prevenir a depressão e a ansiedade pós-parto.
Dormir é importante, obviamente. Mas, apesar das evidências, ainda são poucos os psiquiatras ou outros médicos com formação em medicina do sono, o que obriga muitos deles a aprenderem sozinhos.
Então, o que acontece com nossa saúde mental quando não dormimos o suficiente e o que podemos fazer a respeito?
Como dormir mal afeta seu humor?
A dificuldade de dormir muda a forma como as pessoas vivenciam o estresse e as emoções negativas, disse Aric Prather, pesquisador do sono da Universidade da Califórnia, em São Francisco, que trata pacientes com insônia. “E, para algumas pessoas, isso pode ter um efeito cumulativo – o mal-estar, os pensamentos ruins e o estresse atrapalham a noite”, disse ele.
Carly Demler, 40 anos, dona de casa na Carolina do Norte, disse que certa noite foi para a cama e sentiu que não iria dormir nunca mais. A partir de então, ficava acordada pelo menos uma vez por semana até as 3 ou 4 da manhã – e continuou assim por mais de um ano.
Ela começou a ficar irritada, menos paciente e muito mais ansiosa.
Exames hormonais e um estudo do sono em um laboratório universitário não lhe deram respostas. “Era como se minha ansiedade fosse um incêndio que, de algum jeito, pulava a cerca e acabava se espalhando pelas minhas noites”, disse ela. “Eu simplesmente sentia que não tinha controle”.
No final, foi a terapia cognitivo-comportamental para insônia, ou TCC-I, que trouxe maior alívio a Demler. Estudos descobriram que, no longo prazo, a TCC-I é mais eficaz do que os medicamentos para dormir: até 80% das pessoas que a experimentam observam melhora no sono.
Demler aprendeu a não “deitar na cama e ficar pirando”. Em vez disso, ela se levanta e lê um livro para não associar seu quarto à ansiedade e depois volta para a cama quando está cansada.
“O sentimento de gratidão que sinto todas as manhãs, quando acordo e me sinto bem descansada, acho que é uma coisa que vou sentir para sempre”, disse ela. “Foi uma esperança inesperada”.
Os adultos precisam de sete a nove horas de sono por noite, de acordo com os Centros de Controle e Prevenção de Doenças. Adolescentes e crianças pequenas precisam de ainda mais.
Não se trata apenas de quantidade. A qualidade do sono também é importante. Por exemplo, se você demora mais de 30 minutos para adormecer, ou se acorda várias vezes no meio da noite, será mais difícil sentir que descansou o bastante, independentemente do número de horas que você passou na cama.
Mas algumas pessoas “têm a tendência de pensar que estão funcionando bem, mesmo que fiquem com sono durante o dia ou tenham dificuldade de concentração”, disse Lynn Bufka, psicóloga clínica e porta-voz da Associação Americana de Psicologia.
Reflita sobre como você se sente durante o dia: você acha que está mais impaciente ou fica com raiva mais rápido? Você está tendo mais pensamentos negativos ou sente mais ansiedade ou depressão? Você está com mais dificuldade de lidar com o estresse? Ou de trabalhar com eficiência?
Se a resposta for sim, está na hora de agir.
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Como parar o ciclo
Todos nós já ouvimos como é importante praticar uma boa higiene do sono, adotando hábitos que promovam um sono saudável. E é importante falar com seu médico para descartar quaisquer problemas físicos que precisem ser resolvidos, como um distúrbio da tiroide ou a síndrome das pernas inquietas. Mas isto é só uma parte da solução.
Problemas como ansiedade, transtorno de estresse pós-traumático e transtorno bipolar podem dificultar o sono, o que pode exacerbar os sintomas da doença mental, o que por sua vez faz com que seja mais difícil dormir bem. “Fica muito difícil quebrar o ciclo”, disse Bufka.
Certos medicamentos, como antidepressivos, também podem causar insônia. Se a culpa for de um medicamento, converse com seu médico sobre trocar a medicação, tomar o remédio no início do dia ou diminuir a dose, orienta Ramaswamy Viswanathan, professor de psiquiatria e ciências comportamentais da Universidade Estadual de Nova York e novo presidente da Associação Americana de Psiquiatria.
O ciclo também pode afetar quem não tem problemas de saúde mental, pois as preocupações pioram o sono e a falta de sono piora o humor.
*Este artigo foi originalmente publicado no The New York Times. / TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU
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