Tratar uma pessoa no espectro autista não é só cuidar dela, e sim de todo o círculo. “Se o médico não se relaciona com a família, ele não se relaciona com o indivíduo. Então ele se torna, de alguma maneira, um mediador nessa história, você explica a situação e os caminhos que se oferecem.” É assim que explica o neurologista juvenil e infantil dr. Abram Topczewski. Ao ouvir pais e mães angustiados sobre a inserção social de seus filhos, ou o que seria dessas crianças quando eles morressem, ele começou a pensar em outras maneiras de atuar além da clínica. “O diagnóstico precoce ajuda a minimizar o sofrimento, no sentido de quanto antes começar o tratamento, melhor. Agora, estamos num país que não tem políticas públicas voltadas para essa área”, diz.
Quando soube dos projetos de casas assistidas, o dr. Abram foi conhecê-los. Viajou para Israel e os Estados Unidos, voltou e, em 2020, fundou o Notea (Núcleo de Orientação para o Transtorno do Espectro Autista), uma organização da sociedade civil com propósito de acolhimento de pessoas autistas por meio de atendimento nas áreas educacional, de saúde e assistência social. E uma das maneiras de fazer isso é desenvolvendo aqui os centros residenciais.
A maneira como as pessoas habitam esses espaços depende das condições de autonomia e dos desejos e necessidades da família. “É possível ofertar um programa diário, quando as famílias não querem que o indivíduo fique fora de casa, como uma escola integral, ou um programa em que as casas de moradia ficam separadas das casas de atividades, e uma estrutura de transporte exclusiva para integração”, explica.
“Eles chegam de manhã para viver o apoio terapêutico, ocupacional e social, e à noite vão para suas casas, divididas com mais sete pessoas. Em alguns locais, as pessoas recebem as visitas da família, ou, dependendo do grau de autonomia, saem nos fins de semana.”
Para esse centro se tornar realidade faltam investidores. Ainda assim, o fato de que alguém olhe para essa questão é sinal de que a sociedade começa a entender que é necessário cuidar e integrar as pessoas com autismo, principalmente as que têm um grau de dependência maior.
“Algumas clínicas confinam esses jovens sem fazer nada, assistindo à TV o dia todo, sedados. Isso não é reintegração. Reintegração é ter uma vida digna. Se ele tem habilidade para trabalhar na horta ou tratar pequenos animais, essa será sua atividade”, diz o médico, reforçando como os tratamentos com animais ajudam na criação de vínculos sem cobrança, “um trampolim para o vínculo com o ser humano”.
“Sem ter o que fazer, para onde ir, é uma morte a curto prazo. Ter um objetivo de vida melhora a qualidade social do indivíduo.” É na melhora da vida de todos os indivíduos que está a chave para a melhora da nossa sociedade.
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