Em tratamento para insuficiência cardíaca desde 2020, o apresentador Fausto Silva, o Faustão, 73 anos, realizou uma cirurgia de transplante de coração neste domingo, 27, informou o Hospital Israelita Albert Einstein. Durante a espera pelo órgão, são necessários medicamentos para “ajudar na força de bombeamento” do sangue na unidade de saúde, onde foi internado no início do mês.
O coração é principal órgão do sistema cardiovascular. De acordo com o Ministério da Saúde, é como se ele fosse uma câmara oca que tem quatro cavidades (dois átrios e dois ventrículos). O peso normal varia entre 250 e 350 gramas, maios ou menos do tamanho de um punho fechado.
Ele fica localizado no interior da cavidade torácica (peito). Quando funciona normalmente, contrai, de forma involuntária (sem depender da nossa vontade), de 60 a 100 vezes por minuto, com isso, impulsiona o sangue para todo o corpo, para que os demais órgãos possam realizar atividades vitais.
A partir do momento que o coração tem uma diminuição ou perda da função de bombear sangue, diz-se que ele enfrenta um quadro de insuficiência cardíaca. Ela pode ter várias causas, como doenças valvares e cardiomiopatias (doenças que atingem o músculo cardíaco), por exemplo.
O transplante não é nem de longe a primeira opção dos médicos no início do tratamento de uma insuficiência. Segundo Paulo Pego Fernandes, presidente do conselho deliberativo da Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos (Abto) e cirurgião cardiotorácico da Universidade de São Paulo (USP), a substituição só é cogitada “quando o coração vai perdendo a função e os remédios já não funcionam mais”.
Como funciona o transplante de coração?
Antes da cirurgia, conforme Fernandes, há uma série de contextos que os pacientes podem enfrentar. Alguns conseguem esperar de casa, com auxílio de medicações, e outro precisam ficar internados, alguns em cuidado intensivo (UTI).
Na hora da operação, quando um órgão é disponibilizado, a equipe cirúrgica se divide em duas. Uma fica responsável pela retirada da estrutura doente e outra por transplantar a saudável. “Do ponto de vista técnico, não é uma cirurgia tão complexa”, afirma.
Leia também
Quais os riscos de um transplante de coração?
Depois do procedimento, o paciente fica internado em terapia intensiva até o quadro estar estabilizado. As complicações do transplante de coração seguem a mesma lógica dos demais órgãos, os perigos principais são de rejeição e infecção.
A rejeição representa um ataque do sistema imune do paciente ao órgão estranho, para enfrentá-la, são ministrados remédios imunossupressores, que pisam no “freio” da imunidade, mas, por diminuí-la, deixam o paciente mais vulnerável a infecções oportunistas. Encontrar um balanço entre “desarmar” o sistema imune e não deixar a pessoa indefesa é uma equação complexa, que é avaliada caso a caso.
A imunossupressão é algo que vai acompanhar o transplantado para sempre. Segundo Fernandes, pacientes que passam por transplante de coração tomam cerca de três medicações do tipo.
Quantas pessoas estão na fila de espera de transplante do coração no Brasil?
Até março, de acordo com o Registro Brasileiro de Transplantes, da Abto, há 310 adultos e 59 crianças em espera por coração no Brasil. Segundo o médico Gustavo Ferreira, presidente da Abto, o número cresceu um pouco em relação a anos anteriores. “Está um pouco maior, porque toda a capacidade de nossa a estrutura de transplante está voltando completamente, então, o encaminhamento para transplante está maior.”
A fila de transplantes no Brasil é única. Cada Estado tem a sua, no entanto, eles precisam enviá-las ao Sistema Nacional de Transplantes, que coordena a distribuição. Os critérios para elegibilidade vão variar de acordo com o órgão e o tecido. Alguns deles são gravidade, tipo sanguíneo, compatibilidade, peso, tempo de espera e localização geográfica.
Segundo Pego, para o transplante de coração, a média de espera é de 2 meses para casos de maior gravidade e 18 meses quando o quadro é mais estável.
Conforme noticiou o Estadão no ano passado, durante os primeiros anos da pandemia, a fila de pessoas em espera de transplante de órgãos e tecidos teve um incremento de 30,45%. A crise sanitária causou aumento nas contraindicações médicas de doação e represamento de procedimentos, além de ampliar as mortes de pacientes em lista de espera.
Um problema acentuado pela pandemia foi a efetivação da doação de órgãos (razão entre o número de doações e o número de possíveis doadores), que, em 2021, atingiu a pior taxa desde 2015 (cerca de 26%). O problema persiste, segundo Ferreira. Embora a doação tenha aumentado, não atingiu as taxas pré-pandêmicas, de 2019. “Estamos com uma recusa familiar da ordem de 49%. Muito elevado.”
O próprio Faustão já fez campanha de conscientização sobre a importância da doação. Uma das ocasiões mais recentes se deu em setembro de 2022.
“40 mil pessoas na atualidade esperam um órgão. Esse número é bastante importante para que todo mundo pense bastante e, principalmente, tome uma decisão dessa importância, de ser essencial. Se você pode, depois da morte, fazer o bem. Se você é saudável, servir de vida para uma outra pessoa, que nem te conhece, mas com certeza essa pessoa vai te agradecer pelo resto da vida e rezar por você”, disse Faustão, na época.
Qual a taxa de satisfação de quem passa por um transplante de coração?
O objetivo de um transplante não é só aumentar o tempo em vida (sobrevida) do paciente, mas também elevar a qualidade de vida dele. Esse conceito envolve saúde física, mental e social. Ou seja, retomar as atividades da vida cotidiana com autoestima e bem-estar.
“O paciente que realmente precisa de transplante e que não faz, a qualidade de vida dele é muito ruim. Quando está (em estado) muito grave, não consegue mais sair do hospital, e o risco de vida é altíssimo. Não tem outra saída, o transplante é a saída, é a chance da pessoa viver e da pessoa ter alta do hospital e voltar a ter uma vida muito próxima da normal”, afirma Fernandes.
O paciente que realmente precisa de transplante e que não faz, a qualidade de vida dele é muito ruim. Quando está (em estado) muito grave, não consegue mais sair do hospital, e o risco de vida é altíssimo.
Paulo Pego Fernandes, presidente do conselho deliberativo da Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos (Abto)
Em 2009, seis pesquisadores da Universidade do Maranhão, Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira, Universidade Estadual do Ceará e do Hospital de Messejana, decidiram avaliar a taxa de satisfação de pacientes brasileiros que passaram pelo procedimento.
Eles avaliaram 55 pacientes, de 19 a 71 anos de idade, acompanhados na Unidade de Transplante e Insuficiência Cardíaca de um hospital de referência em cardiologia da cidade de Fortaleza, com base em questionário da Organização Mundial da Saúde (OMS). Os resultados foram publicados na revista científica Arquivos Brasileiros de Cardiologia, da Sociedade Brasileira de Cardiologia, em 2011.
Os resultados indicaram “muita influência” do procedimento na qualidade de vida dos transplantados, em consonância com a literatura internacional. Isso foi mostrado por meio de diversos domínios.
Em relação à saúde física, que envolve questões como incapacidade causada pela dor, energia para as atividades diárias e padrões de sono, 62,8% dos homens ficaram satisfeitos. Nas mulheres, a taxa foi de 58,3%.
No domínio psicológico, caracterizado por questões que retratam o sentido da vida, forma de aproveitar a vida e satisfação consigo mesmo, os homens se sentiram satisfeitos (65,1%) ou moderadamente satisfeitos (34,9%). Nas mulheres, as mesmas taxas foram de 58,3% e 41,7%, respectivamente.
Sobre relações sociais, que tem a ver com amizades, família e sexualidade, mais da metade (53,5%) dos homens estavam muito satisfeitos e 39,5%, satisfeitos. Nas mulheres, os porcentuais foram de 58,3% e 41,7% - o que fecha 100% de satisfação entre elas.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.