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Fazer exercícios ajuda a frear o envelhecimento do cérebro? Um novo estudo surpreende cientistas

Experimento robusto feito por pesquisadores americanos contrariou outros achados, que apontam benefícios após a prática de ginástica entre idosos

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Por Gretchen Reynolds
Atualização:

THE WASHINGTON POST - Exercícios e treinamento de mindfulness (prática da atenção plena) não melhoraram a saúde cerebral dos idosos em um novo estudo surpreendente publicado neste mês na revista científica JAMA. O experimento, que contou com mais de 580 homens e mulheres mais velhos, analisou se o início de um programa de exercícios, mindfulness – ou ambos – aumentavam as habilidades dos idosos de pensar e lembrar ou alteravam a estrutura de seus cérebros.

“Achamos que encontraríamos ganhos com o exercício e também com mindfulness e especialmente com uma combinação dos dois”, disse Eric Lenze, chefe do departamento de psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade Washington em St. Louis (EUA), que liderou o novo estudo. “Não encontramos.”

A mindfulness tem sido associada a melhorias em alguns aspectos da memória e do pensamento entre os idosos, presumivelmente porque ajuda a reduzir o estresse e as distrações. Foto: Pixabay

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Os resultados parecem questionar a capacidade do exercício e de outras mudanças no estilo de vida no combate ao declínio cognitivo que ocorre com o envelhecimento. Mas eles também levantam novas questões sobre se realmente entendemos o suficiente sobre o cérebro e a mente – ou como estudá-los – para saber se os estamos mudando quando caminhamos ou meditamos.

“Considerando que outros estudos encontraram uma relação significativa entre mindfulness e exercícios e saúde cognitiva e cerebral, como explicamos os resultados atuais?”, perguntou Art Kramer, diretor do Centro de Saúde Cognitiva e Cerebral da Northeastern University em Boston, que estudou extensivamente a relação entre exercícios e o cérebro, mas não esteve envolvido na nova pesquisa.

As respostas podem ter implicações para qualquer um de nós que espera que ser fisicamente ativo ajude a manter a mente afiada bem depois da meia-idade.

Estudos anteriores mostraram que se exercitar ajudou a saúde do cérebro

Certamente, uma grande quantidade de pesquisas anteriores sugere que nosso estilo de vida influencia a saúde do nosso cérebro. O exercício, em particular, parece desempenhar um papel fundamental em quão bem pensamos e lembramos com a idade. Uma revisão de estudos anteriores de 2011 concluiu: “Há evidências crescentes de que tanto o treinamento aeróbico quanto o de resistência são importantes para manter a saúde cognitiva e cerebral na velhice”.

Reforçando essa afirmação, um famoso estudo de 2011 com 120 homens e mulheres mais velhos descobriu que aqueles que começaram a se exercitar moderadamente, principalmente caminhando, melhoraram suas pontuações em testes de memória e aumentaram o tamanho de seu hipocampo, uma parte do cérebro crucial para a função da memória, enquanto aqueles em um grupo de controle sedentário experimentaram declínios no volume do hipocampo e nas habilidades de memória.

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Da mesma forma, a mindfulness tem sido associada a melhorias em alguns aspectos da memória e do pensamento entre os idosos, presumivelmente porque ajuda a reduzir o estresse e as distrações.

Mas grande parte dessa pesquisa foi de curto prazo e em pequena escala, envolvendo talvez algumas dezenas de participantes, ou foi epidemiológica, o que significa que encontrou ligações sugestivas entre atividade física ou mindfulness e mentes mais aguçadas, mas não provou que elas melhoram diretamente o cérebro das pessoas.

Um novo estudo sobre exercícios, mindfulness e o cérebro

O novo estudo é digno de nota. A partir de 2015, seus autores, principalmente da Universidade de Washington ou da Universidade da Califórnia em San Diego, recrutaram 585 homens e mulheres saudáveis, mas inativos, com idades entre 65 e 84 anos. Nenhum dos participantes foi diagnosticado com demência, mas todos disseram aos pesquisadores que estavam preocupados pois seus pensamentos e memórias estavam mais lentos do que antes.

Os cientistas testaram as habilidades de pensamento de todos, concentrando-se na atenção, memória operacional e recordação de palavras ou imagens, e também digitalizaram o volume do hipocampo e, em seguida, os designaram aleatoriamente para vários grupos.

Um passou a se exercitar duas vezes por semana em aulas supervisionadas de 90 minutos, alternando entre caminhada ou atividades aeróbicas similares, treinamento com pesos leves e prática de equilíbrio. Depois de seis meses, eles levaram suas rotinas para casa, exercitando-se sozinhos por cerca de uma hora por dia durante mais um ano.

Um segundo grupo aprendeu a reduzir o estresse com base na prática de mindfulness, combinando meditação, ioga e exercícios mentais, sob supervisão por seis meses e por conta própria no ano seguinte. Um terceiro grupo se exercitou e meditou várias vezes por semana, enquanto um grupo de controle frequentou aulas duas vezes por semana sobre vida saudável.

O experimento, que contou com mais de 580 homens e mulheres mais velhos, analisou se o início de um programa de exercícios, mindfulness - ou ambos - aumentavam as habilidades dos idosos de pensar e lembrar ou alteravam a estrutura de seus cérebros. Foto: Keith Bedford /Reuters

Após seis meses e novamente após 18, os pesquisadores repetiram os testes cognitivos e os exames cerebrais.

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No final, o volume do hipocampo de quase todos encolheu, quer tenham se exercitado, meditado ou não.

Ao mesmo tempo, suas pontuações cognitivas aumentaram ligeiramente, uma melhoria universal, mas enganosa, disse Lenze. Se o exercício ou a meditação tivessem realmente beneficiado o cérebro das pessoas, suas pontuações deveriam ter sido mais altas do que as do grupo de controle. Como não foram, ele disse, ele e seus colegas atribuem qualquer ganho a “pessoas que estão melhorando em fazer os testes”.

O que isso significa para quem se exercita e para o envelhecimento do cérebro

Então, os resultados indicam que se exercitar e praticar mindfulness são inúteis para a saúde do cérebro? “Acho que este estudo nos diz que não sabemos tanto sobre o cérebro quanto pensamos”, disse Lenze.

Exercícios e mindfulness não melhoraram certas tarefas cognitivas neste estudo, ele disse, mas talvez ajudem outros tipos de pensamento ou talvez seus efeitos sejam diferentes em pessoas com problemas maiores ou menores de memória.

“Acho que os autores conduziram um estudo muito rigoroso”, disse Teresa Liu-Ambrose, diretora do Centro de Saúde do Cérebro da Universidade da Colúmbia Britânica em Vancouver, que estuda exercícios e o cérebro, mas não fez parte desta pesquisa.

Mas ela também questionou a estreiteza dos testes e análises específicos usados para medir as mudanças nas habilidades de pensamento das pessoas.

O mesmo fez Mark Gluck, professor de neurociência no Centro de Neurociência Molecular e Comportamental da Rutgers University em Newark. “Se os pesquisadores tivessem usado medidas comportamentais mais sensíveis” de quão bem as pessoas pensam e se lembram, ele disse, “seus resultados relatados poderiam ter sido bem diferentes”.

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Outras técnicas de exames cerebrais também podem ter discernido mudanças significativas dentro do cérebro das pessoas até o final do estudo, ele disse.

No geral, os resultados “sugerem de forma importante que as pesquisas futuras devem considerar cuidadosamente as características das populações de estudo” e as rotinas de exercícios e mindfulness usadas, “para resolver a ambiguidade” sobre se e como eles afetam as mentes envelhecidas, disse Kramer.

O que as descobertas não sugerem é que se exercitar ou meditar são inúteis, disse Lenze. “Não queremos que as pessoas recebam a mensagem de que não devem se exercitar.”

Tanto o exercício quanto a mindfulness permanecem benéficos, ele disse, e ele pratica ambos.

Estudos futuros podem, afinal, detectar benefícios não vistos neste experimento. “Ainda há”, ele disse, “muito a aprender sobre o cérebro.” /TRADUÇÃO LÍVIA BUELONI GONÇALVES

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