Uma intensa onda de frio atinge várias regiões do País e, nesse cenário, um alerta se faz importante: dias mais gelados são associados a um maior risco de complicações cardíacas. Para ter ideia, quando a temperatura média fica abaixo de 14ºC, a probabilidade de sofrer um infarto sobe 30%. Também há um perigo aumentado de acidente vascular cerebral (AVC), o popular derrame. Os dados são de um estudo coordenado pelo cardiologista Luiz Antonio Machado Cesar, assessor científico da Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo (Socesp).
Como o frio afeta o coração?
Isso se deve a alguns fatores. O primeiro é a maior incidência de doenças respiratórias causadas por vírus, como a gripe. É que esse tipo de quadro dispara uma inflamação no organismo. Acontece que, segundo Cesar, uma resposta exacerbada nesse sentido pode provocar o rompimento de uma placa presente em um artéria. Isso pode gerar coágulos, levando a um entupimento. Se essa estrutura for do tipo que supre o coração, o resultado é o infarto. Caso ela se localize no cérebro, aí pode culminar no AVC.
Outro fator decisivo diz respeito a um processo chamado de vasoconstrição. Esse mecanismo natural do corpo é caracterizado pela contração dos vasos sanguíneos e tem o objetivo de, entre outras coisas, manter o equilíbrio térmico. Caso isso aconteça em vias já parcialmente obstruídas, pode levar a um ataque cardíaco ou derrame, dependendo da artéria afetada.
Além disso, quando o ar frio entra em contato com a mucosa respiratória – seja do nariz, da laringe, da faringe ou dos brônquios –, estimula a produção de proteínas que contribuem para uma maior coagulação sanguínea, de acordo com o cardiologista. E isso pode atravancar o fluxo de sangue nos vasos que irrigam coração e cérebro.
Idosos correspondem ao maior grupo de risco. É que muitos indivíduos acima de 65 anos já apresentam fatores que predispõem a eventos cardíacos, como hipertensão e problemas nas artérias.
Mas, independentemente da idade, pessoas com hipertensão, diabetes ou que já tenham sofrido um infarto devem ficar especialmente atentas.
Cesar esclarece que o grande problema não é a variação brusca da temperatura, e sim o frio intenso mesmo – e quem mora em locais com o clima tradicionalmente mais gelado não está mais protegido. “O risco de infarto para alguém que vive em uma região mais fria ou mais quente é o mesmo se a temperatura ficar abaixo de 14 ºC”, reforça o médico.
Curiosamente, o perigo de um ataque cardíaco nesse contexto de frio é maior no Brasil do que em países do hemisfério norte, que chegam a enfrentar temperaturas negativas no inverno. Cesar explica que isso acontece porque, nessas nações, a população costuma contar com sistemas de aquecimento em casa e em outros ambientes. Por isso, as taxas de aumento no risco de infarto em locais como o Canadá e o norte dos Estados Unidos, por exemplo, ficam na faixa dos 10 a 12%.
Como se proteger
A melhor forma de evitar que o frio interfira no risco cardíaco é apostar na vacinação contra a gripe e outras doenças respiratórias, que potencializam a ocorrência de inflamações.
Além disso, o cardiologista aconselha pessoas idosas e com doenças cardiovasculares pré-existentes a permanecerem em casa em dias muito gelados. Se precisarem sair, é preciso se proteger o máximo possível. Contudo, ele pondera que essa blindagem nunca será 100% efetiva, pois, mesmo agasalhado, o indivíduo continuará respirando o ar frio e, assim, expondo a mucosa respiratória.
O cardiologista da Socesp também ressalta a importância de os idosos terem conhecimento sobre sua condição de saúde. “As pessoas com mais idade precisam saber se não têm hipertensão ou alteração de colesterol, por exemplo. Esses quadros podem ser tratados, reduzindo riscos à saúde”.
Acontece que, segundo o médico, essas doenças tendem a ser silenciosas. Dessa maneira, muitas vezes o primeiro sintoma já é uma manifestação grave.
Sinais de alerta para um infarto
Cesar explica que os sinais de um problema cardiovascular costumam surgir antes de um infarto propriamente dito: “Às vezes, começa com um desconforto no peito, não tão intenso, que incomoda quando a pessoa sobe uma escada, por exemplo. Aí ela tem que parar. Dura dois, três minutos e passa”, diz. “Um dia, o incômodo fica mais intenso e acontece mesmo com a pessoa sentada, deitada ou em pé”, acrescenta. Com a piora, é crucial ir até um pronto-socorro.
Contudo, uma parcela pode não valorizar esses indícios, buscando apoio apenas diante de um infarto. E, ao contrário do que normalmente se imagina, os sinais que podem dar pistas para a ocorrência do ataque cardíaco não são necessariamente pontadas no peito e dores que duram poucos segundos.
Segundo o médico, o quadro geral de um ataque cardíaco é caracterizado por uma forte compressão no meio do peito, que pode se alastrar para os dois braços e para as costas. Essa sensação se intensifica e frequentemente é acompanhada por mal-estar, vontade de vomitar e suor frio.
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