Em uma sociedade que supervaloriza a magreza, não é de se espantar que boa parte das pessoas demonstre algum grau de insatisfação com o próprio corpo, o que afeta em especial as mulheres. Levantamentos indicam que até 80% dos jovens não estão satisfeitos com sua imagem. Não surpreende, portanto, que o percentual da população que tenta, com frequência, perder peso esteja aumentando nas últimas décadas. Se nos 1960 cerca de 10 a 20% da população fazia dietas para perder peso, nos anos 2000 esse número já saltava para quase 60%; hoje em dia, pesquisas mostram que até 80% da população já tentou, em algum momento de sua vida, perder peso.
Naturalmente, as estratégias mais utilizadas para atingir esse objetivo são as dietas da moda e os exercícios físicos. Mas o leitor já deve saber que emagrecer não é tarefa fácil, e que muitos dos que tentam fazê-lo até conseguem eliminar alguns quilos nas primeiras semanas ou meses, mas logo recuperam o peso perdido. É o famoso efeito sanfona, e ocorre até mesmo em quem inclui exercícios em seus programas de emagrecimento.
Essa resistência que o corpo demonstra à perda de peso é bastante reveladora, e estudá-la tem nos ensinado muito sobre a nossa fisiologia. Mas, por mais fascinante que seja entender esse fenômeno, o fato é que ele torna a obesidade uma condição recidivante ou, em outras palavras, uma doença crônica para a qual não há uma cura definitiva – muito embora ela possa ser controlada.
A resistência ao emagrecimento também nos revela bastante sobre como nosso organismo responde ao exercício físico. Utilizando apenas o raciocínio lógico dedutivo, deveríamos concluir que o exercício leva à perda de peso. Afinal, se o que determina o ganho ou a perda de peso é, pela lei da termodinâmica, a diferença entre as calorias ingeridas e as gastas, como uma atividade que aumenta o gasto energético não ajudaria a perder peso?
Mas o mundo real nos mostra que há algo de errado com essa dedução, já que as pessoas que começam a fazer exercícios para emagrecer também têm dificuldade em perder peso.
O fato é que nosso organismo é muito mais complexo do que imaginamos. Quando nos exercitamos, mecanismos que compensam a energia gasta na atividade física são desencadeados, o que pode levar à redução do gasto energético durante o repouso e também ao longo do treino.
Em 2012, um estudo do antropólogo norte-americano Herman Pontzer surpreendeu a comunidade científica ao mostrar que indivíduos do povo Hadza (um grupo de caçadores e coletores da Tanzânia que apresenta um modo de vida muito mais ativo do os sedentários ocidentais) não gastam mais energia ao longo do dia do que ocidentais bem menos ativos.
Embora esse fenômeno pareça contraintuitivo, sua explicação tem bases na evolução. Economizar energia quando mais nos movimentávamos significava, para nossos ancestrais, poupar energia em momentos de busca por alimentos – ou seja, justamente quando mais estávamos em carência alimentar. Trata-se, portanto, de um importante mecanismo de sobrevivência, uma vantagem evolutiva que herdamos de nosso passado.
Não à toa, programas de exercícios não têm se mostrado muito eficientes em induzir perdas de peso significativas, sobretudo em pessoas com sobrepeso e obesidade. Uma síntese de evidências científicas da Associação Europeia para o Estudo da Obesidade e Atividade Física constatou que o treinamento aeróbio induz uma perda de peso bem discreta, de apenas 2 a 3 quilos, aproximadamente, e que o treino de força não leva a resultados muito diferentes.
Além da compensação do gasto energético, queimar calorias extras pelo exercício é bastante trabalhoso – quem nunca ouviu dizer que o que se gasta correndo 30 minutos é quase o mesmo que se ganha comendo uns quadradinhos de chocolate? É por isso que dietas de restrição calórica tendem a induzir perdas de peso muito maiores do que o exercício, sobretudo no início do tratamento.
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Por que, então, devemos treinar?
Essa aparente ineficiência do exercício para a perda de peso tem, lamentavelmente, levado influenciadores e meios de comunicação a afirmar que o exercício não tem utilidade para aqueles que buscam reduzir os números da balança. Os mais vocais detratores do exercício chegam a afirmar que treinar seria uma perda de tempo.
Ledo engano. Ainda que o exercício não ajude a induzir perdas de peso importantes nos meses iniciais, estudos mostram que se exercitar é um dos fatores que mais ajudam manter o peso perdido em longo prazo. Portanto, se quiser evitar o efeito sanfona, continue treinando.
Ademais, o exercício frequentemente leva ao ganho de massa muscular, o que é bastante positivo em um programa de perda de peso, mas pode mascarar a redução do peso na balança. O ganho de massa muscular geralmente é acompanhado de perda de gordura (por isso o peso muda pouco), o que representa emagrecimento efetivo e é bastante positivo para a saúde. Melhor ainda: a perda de gordura induzida pelo exercício vem, na maior parte dos casos, da chamada gordura visceral, aquela que fica na parte interna da barriga e que representa um risco de desenvolver doenças cardiovasculares e metabólicas, como o diabetes.
O treinamento físico aeróbio ou o treinamento intervalado de alta intensidade são os que melhor induzem a perda de gordura visceral, ao passo que o treinamento de força é o que melhor induz ganhos de massa muscular.
Os ganhos de força muscular trazidos pela musculação e a melhora da aptidão cardiovascular alcançada com o treino aeróbio protegem nosso corpo contra os efeitos prejudiciais do excesso de peso. Isso significa que, ao treinar, o impacto da obesidade sobre a saúde se torna menor, mesmo quando não há perda de peso. Se você pretende emagrecer, combine as duas modalidades, siga firme e continue se exercitando com constância. Confie, porque os resultados irão aparecer – e sua saúde agradece.
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