Nas últimas três semanas, serviços de saúde de São Paulo têm detectado um crescimento na circulação dos vírus influenza, como o H3N2 e o H1N1. Os relatos também aparecem em grupos de WhatsApp voltados para a comunicação entre pais de alunos de escolas da capital paulista. Embora as infecções por esses vírus sejam mais comuns no inverno, a alta de casos pode ocorrer em outras épocas do ano.
Foi o caso, por exemplo, dos surtos de H3N2 no verão do ano passado, registrados em mais de dez Estados do País. Uma cepa nova, chamada Darwin, não estava contemplada na vacina da gripe disponível à época e foi a responsável pelo aumento atípico dos casos. Neste ano, a proteção contra mais essa cepa foi incluída no imunizante, que passou a integrar a campanha nacional de vacinação no mês de abril.
Nos últimos dez dias, o Hospital Santa Catarina Paulista observou um crescimento de 18% no número de atendimentos no pronto-socorro infantil da unidade, em comparação com os primeiros dez dias do mês de setembro. Nesta terça-feira, 20 pacientes pediátricos se encontravam internados com quadro de síndromes respiratórias causadas por infecções, cinco deles nas Unidades de Terapia Intensiva (UTI). Já o Hospital Sírio-Libanês informou que, nos últimos 15 dias, o número de pacientes com sintomas gripais que passaram pelo pronto atendimento aumentou 50%.
Na última semana, o Hospital Infantil Sabará registrou que a cada 100 testes de influenza realizados, 33 tiveram resultados positivos. Há três semanas, os positivos correspondiam a 15% dos resultados. Há duas, passaram a ser 28% deles e na última semana chegaram a 33%. Em um período anterior a esse, a instituição informou que registrava uma média de 10% de diagnósticos.
O médico infectologista Francisco Ivanildo de Oliveira Junior, responsável pelo Serviço de Controle de Infecção Hospitalar (SCIH) do Sabará, afirma que a alta dos casos que tem sido sentida nos prontos-socorros nas últimas semanas pode ser resultado de uma combinação de fatores que incluem as baixas taxas de cobertura vacinal contra a gripe. De acordo com ele, as metas de cobertura não são atingidas desde o ano de 2020.
“De uma forma geral no Brasil, a cobertura ficou em torno de 60% (a meta fixada para este ano foi de 90%), então tem um número muito grande de pessoas não vacinadas e, na hora que o vírus começa a circular, ele encontra uma população desprotegida”, pontua.
Outra situação que pode influenciar na maior circulação do vírus, de acordo com Francisco Ivanildo, é o período de frio que tem se estendido neste ano. Com as temperaturas mais baixas, as pessoas tendem a permanecer em ambientes com portas e janelas fechadas, o que impede a circulação do ar e facilita a transmissão de infecções respiratórias.
O terceiro fato, aponta o infectologista, pode ter relação com o fim da obrigatoriedade do uso de máscaras. No transporte público, elas deixaram de ser obrigatórias há duas semanas, no dia 9 de setembro, e com a decisão só continuam a ser usadas em estabelecimentos de saúde como clínicas e hospitais. “A transmissão dos vírus da influenza acontece da mesma forma que a transmissão da covid-19. Na hora que eu previno a covid-19, eu previno outras infecções respiratórias. Quando eu libero a questão da máscara, a chance de acontecer a transmissão aumenta”, esclarece.
Dados oficiais
Embora os relatos de aumento dos casos de gripes causadas por vírus do tipo influenza, essa situação ainda não aparece refletida nos dados oficiais sobre as infecções respiratórias no País. Alexandre Naime, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), explica que essa percepção tem se dado de forma mais empírica, justamente pelos relatos de infectologistas sobre o aumento de atendimentos de síndromes gripais.
“Esses dados ainda não estão bem consolidados. Pode ser que realmente seja uma tendência que a gente vai ter nas próximas semanas, mas os dados ainda não mostram isso”, ressalta. No boletim InfoGripe da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) da última semana, que tem como base dados geridos pelo Ministério da Saúde, as informações apontam para queda no número de casos de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG).
O relatório também indica que, nas últimas quatro semanas, a prevalência entre os casos com resultado positivo para vírus respiratórios foi de 5,9% para influenza A; 0,4% para influenza B; 6,7% para vírus sincicial respiratório (VSR); e 63% para o Sars-CoV-2, causador da covid-19. “A gente não pode afirmar categoricamente que vai haver estabilidade no fim do ano, mas também temos que manter a atenção para justamente avaliar e poder ter algum tipo de ação caso os números aumentem muito”, diz Alexandre Naime.
Segundo a Secretaria Municipal da Saúde (SMS) os surtos de síndrome gripal atingiram patamar menor do dia 26 de junho ao dia 10 de setembro, com 104 registros, do que no período de maio ao dia 25 de junho, com 747. Os especialistas ouvidos reforçam que esse é um cenário esperado, uma vez que os meses de maio e junho coincidem com o retorno de atividades escolares, em que vários tipos de vírus respiratórios entram em circulação no ambiente escolar.
A secretaria também informou que de janeiro a agosto de 2022 foram notificados 359 casos de Síndrome Respiratória Aguda Grave confirmadamente causados por vírus do tipo influenza. Desses, 82 tinham como pacientes crianças de até 12 anos de idade. “As áreas da Saúde e Educação fazem um trabalho conjunto visando o controle da transmissão de vírus na comunidade escolar. A SMS monitora as unidades escolares e dá suporte técnico para investigação de casos junto às UBS e Unidades de Vigilância em Saúde (UVIS)”, afirma a nota da pasta.
Dicas para prevenir infecções respiratórias causadas por vírus
- Garantir que ambientes em que há aglomeração de pessoas contem com uma boa ventilação, mantendo portas e janelas abertas sempre que possível;
- Principalmente para pessoas que têm mais risco de desenvolver formas mais graves de gripes e demais doenças causadas por vírus respiratórios, utilizar máscara em ambientes movimentados;
- Higienizar as mãos sempre depois de ter contato com outras pessoas e usar o transporte público;
- Evitar ao máximo tocar o rosto com as mãos;
- Colocar a vacina da gripe em dia, já que o imunizante impede o desenvolvimento de episódios mais graves da doença.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.