Embora tenha sido apresentada pela primeira vez no início dos anos 2000, a dieta portfólio é pouco conhecida entre a população. Ela foi pensada para reunir fontes de fitoesteróis, proteínas vegetais (especialmente da soja) e alimentos com fibras viscosas – substâncias que, isoladamente, sempre foram indicadas para a redução do colesterol LDL, conhecido como ruim. Por outro lado, ela prega restrição no consumo de gorduras saturadas – como a carne e outros alimentos de origem animal – essas, por outro lado, associadas à elevação do colesterol. Agora, pela primeira vez, uma pesquisa avaliou os impactos desse padrão alimentar em longo prazo entre uma grande população.
E os resultados foram positivos: quem se aproximou mais do que propõe o cardápio teve uma queda de 14% no risco de sofrer uma doença cardiovascular ou um derrame. Colocar a dieta portfólio em prática significa privilegiar o consumo de verduras, legumes, frutas, leguminosas (soja, feijão, ervilha, grão-de-bico e lentilha), oleaginosas e sementes (as fontes de fitoesteróis), aveia, cevada, psyllium, além de itens com gorduras monoinsaturadas, a exemplo de azeite de oliva, óleo de canola e abacate.
Segundo o cardiologista Nathan Soubihe Jr., do Hospital do Coração (HCor), em São Paulo, um padrão como o da dieta portfólio é benéfico porque alimentos com baixo índice de gorduras saturadas e ricos em fitosteróis não colaboram com o acúmulo de gordura em veias e artérias, mecanismo de formação de doença aterosclerótica, como o AVC isquêmico, por exemplo.
A pesquisa
O estudo foi conduzido por pesquisadores da Universidade Harvard, nos Estados Unidos, e publicado no final de outubro na revista científica Circulation. Para o trabalho, mais de 200 mil voluntários foram acompanhados por cerca de 30 anos – ninguém tinha doença cardiovascular no início da pesquisa.
Os cientistas criaram, então, um sistema de pontuação para classificar o nível de adesão desse pessoal todo ao que recomenda a dieta portfólio. A redução de 14% no risco de eventos cardiovasculares foi observada ao comparar os dois extremos – ou seja, quem chegava mais perto da dieta anti-colesterol e quem mal seguia suas indicações.
Os resultados corroboram para o que especialistas falam há anos: quanto mais saudável é nossa alimentação, com menor ingestão de ultraprocessados, açúcar adicionado e gorduras saturadas, melhor para o coração – e para a saúde como um todo.
“Descobertas impactantes”
A nutricionista Andrea Glenn, uma das autoras do estudo, diz que as descobertas foram impactantes, especialmente em função do que ela chama de “relação dose-linear”, o que significa que quanto mais alimentos da dieta portfólio você adicionar à sua rotina, maior a redução de risco para doenças cardiovasculares.
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“Vimos que uma maior adesão ao padrão alimentar do portfólio estava associada a um risco 14% menor de doença coronariana e acidente vascular cerebral (AVC), e essas relações permaneceram consistentes em diversas análises. Em conjunto, os resultados parecem ser bastante robustos”, avalia a pesquisadora.
É importante destacar que os participantes com pontuação mais alta (indicando maior adesão à dieta portfólio) relataram, ao longo dos anos, serem mais ativos fisicamente e menos propensos a fumar do que aqueles que tiveram notas mais baixas.
Não precisa seguir 100%
De acordo com Andrea, não é preciso seguir de forma absoluta a dieta portfólio para tirar proveito de suas vantagens. A nutricionista de Harvard aponta que substituir alguns alimentos ricos em gorduras saturadas e colesterol por itens recomendados nesse menu já seria capaz de trazer benefícios ao sistema cardiovascular.
A pesquisadora ressalta ainda que, por mais que a dieta priorize os vegetais, não é preciso abrir mão totalmente da carne e de outros alimentos de origem animal.
Nesse sentido, para manter a gordura saturada sob controle, a nutricionista Regina Pereira, da Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo (Socesp), explica que o ideal é optar por uma porção de carne vermelha do tamanho da palma da mão (sem os dedos) cerca de três vezes por semana.
Mas ela ressalta que a frequência vai variar de acordo com a realidade de cada um, considerando desde características do corpo até o estilo de rotina. “É preciso entender o que o paciente come, quanto ele come e, aí, fazer uma adequação”, resume. De qualquer maneira, a recomendação também é colocar mais peixes na rotina.
Andrea também reconhece a importância das preferências individuais ao definir uma dieta. “É possível escolher algumas recomendações dietéticas entre os diferentes padrões alimentares para desenvolver hábitos que você goste e possa seguir”, analisa. Afinal, o crucial mesmo é ser capaz de manter as escolhas saudáveis ao longo do tempo.
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