Mapeamento genético deve incluir populações negligenciadas; custo é desafio

Realidade brasileira precisa ser estudada geneticamente para medicina de precisão avançar e ficar disponível a todos

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Por Redação
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O sequenciamento de genes está mais barato e viabiliza inovações farmacológicas e biotecnológicas. Com a receita genética que compõe cada pessoa, é possível criar melhores tratamentos e medicamentos. O Projeto Genoma Humano, que começou no fim da década de 1980 e terminou em 2003, permitiu ter em mãos as informações vitais que constituem todo e qualquer ser humano. Custou US$ 3 bilhões e demorou quase 15 anos para ser concluído. Atualmente, é possível realizar a mesma tarefa por menos de US$ 1 mil e em até 36 horas.

Para a cientista Lygia Pereira, professora do Departamento de Genética e Biologia Evolutiva da Universidade de São Paulo (USP), existem, hoje, dois desafios: o primeiro é entender como cada gene atua na saúde e molda as características individuais; o segundo é mapear variações genéticas entre as pessoas.

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“Somos todos um produto do genoma humano, mas são as pequenas diferenças entre cada um que conferem a aparência física, a predisposição a doenças e a forma como reagimos a medicamentos. Isso tudo está escrito no 0,1% do genoma que varia”, detalha.

O barateamento fez com que vários países começassem a sequenciar o genoma de centenas de milhares de pessoas, especialmente os Estados Unidos e os países europeus. E é aí que mora o problema: 80% dos dados disponíveis sobre informações genéticas são de populações predominantemente brancas.

No Brasil, o Ministério da Saúde criou, em 2020, o programa Genomas Brasil, iniciativa nacional de saúde de precisão e de terapias avançadas. Um dos objetivos é fomentar a criação de um banco com dados genômicos da população brasileira.

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Alexandre Rebelatto, diretor de Soluções Genéticas da Thermo Fisher Scientific na América Latina, considera que o acesso é um dos principais entraves, e isso merece um esforço multidisciplinar. “Estamos atuando para tentar trabalhar com associações médicas, governo federal, associações de pacientes e laboratórios para facilitar a disponibilidade da medicina de precisão para o paciente e garantir que ela seja vista como ferramenta de gestão de saúde pública.”

Laboratório de cultura de células do Centro de Pesquisas sobre o Genoma Humano e Células-tronco da USP, no Butantã. Foto: Amanda Perobelli/Estadão

Mesmo com o interesse da iniciativa privada em colaborar, o governo federal precisa investir em ciência e priorizar o acesso, principalmente para pacientes que dependem do SUS. Uma área que vem rompendo barreiras é a oncologia, considerada um sinônimo de medicina personalizada, tamanho foi o desenvolvimento científico dos últimos 20 anos na área.

“Hoje, para a maior parte dos tumores, não existe oncologia sem o envio de um pedacinho do tumor do paciente para analisar se há alteração molecular, se uma mutação provocou a doença, se existe relação com o prognóstico da pessoa ou se é possível predizer a resposta a tratamentos”, observa Andreia Melo, chefe da Divisão de Pesquisa Clínica e Desenvolvimento Tecnológico do Instituto Nacional de Câncer (Inca).

O custo das novas tecnologias é alto, e os pacientes oncológicos costumam ficar em tratamento por alguns meses. Segundo Melo, a cada passo que a oncologia dá ao incorporar novas terapias, cresce a desigualdade entre pacientes com plano de saúde e pacientes da rede pública. “Infelizmente, às vezes, a melhor opção para o paciente do SUS ter acesso a tratamentos modernos é participar de pesquisas clínicas, mas o estudo não pode ser sinônimo de acesso a tratamentos”, avalia.

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