“Já pensei em me matar – e não foi uma nem duas vezes.” Assim começa o livro da jornalista Mariana Ferrão, ‘Estar Bem Aqui’, da Editora Planeta. Nele, de maneira brutalmente sincera, ela conta como foi passar por uma depressão na adolescência, uma depressão pós-parto, crises de síndrome do pânico, crises de burnout e tantas outras dores que cruzaram seu caminho. “Minha mente se tornou minha prisão. E como fugir do que está dentro de você?”, questiona.
A resposta veio do autoconhecimento e do reconhecimento dessas tristezas que a afligiam. “Em primeiro lugar a gente precisa da nossa verdade. Às vezes não conseguimos, simplesmente por não saber qual é”, diz. Em entrevista feita por vídeo para o Estadão, ela conta como foi trilhar essa estrada.
Neta de psiquiatra e filha de psicanalista, Mariana Ferrão cresceu escutando teorias de Sigmund Freud, Carl Jung e Wilfred Bion. Mal sabia ela que, por uma coincidência do destino, esse também seria o tema com o qual trabalharia ao crescer. “Quando a gente consegue olhar nossa vida e ver o que ficou para trás, conseguimos juntar pontos importantes e estratégicos do caminho e formar uma constelação de sentido”, reflete ela.
Mas muito mais do que experiências externas com a saúde mental, Mariana teve experiências internas extremamente profundas com as próprias emoções, que a fizeram ter um conhecimento geral sobre si mesma.
Aos 18 anos, diagnosticada com depressão, ela ficou trancada em seu quarto por dois meses, tendo dificuldades de comer, ir à escola ou fazer qualquer outra coisa. Até que um dia sua mãe falou: “Se você não quiser se ajudar, ninguém vai conseguir ajudá-la”. Isso mudou tudo. “Topei ir ao psiquiatra e comecei a tomar remédio para depressão e para dormir. E a terapia me ajudou muito ao mostrar que eu era normal, que aquilo acontecia com outras pessoas da minha idade”, conta.
Depois de ajustar os remédios, ela percebeu que também tinha de ajustar alguns hábitos da sua vida, como regulação de sono, alimentação saudável e prática de atividades físicas e meditação. E essa regulagem funcionou muito bem durante anos. Até ela perder o controle da sua rotina com o nascimento de Miguel, seu primeiro filho, em 2013.
“A maternidade me fez reviver o luto da morte da minha mãe, porque eu descobri que uma coisa é ser mãe, outra é ser mãe sem ser mãe”, diz ela, que foi diagnosticada com depressão pós-parto.
Compartilhar
Sobrecarregada de tarefas e sentimentos, ela passou a compartilhar na internet os desafios de ter um filho. “Desde a dificuldade da falta de sono pela amamentação e pelas noites maldormidas até a dificuldade mesmo de entender como cuidar daquele ser”, exemplifica.
A experiência foi extremamente importante para o seu processo de cura. “Ela autoriza a gente a ser de verdade, criar pertencimento e identificação. E para mim foi muito significativo perceber que quanto mais verdadeira era a minha comunicação, mais conexão ela gerava.”
Um dos primeiros passos foi abraçar os seus erros, ou, como ela gosta de chamar, “sua luz e sombra”. “Você pensa assim: ‘Meu Deus, eu amo muito essa criança. Ela é tudo que eu jamais sonhei, mas ao mesmo tempo odeio essa criança porque ela tirou de mim eu mesma e agora como é que me encontro de novo com esse ser aqui que depende integralmente de mim?’”, indaga.
Entrar em contato com esses sentimentos e se desprender da vergonha ou do medo de senti-los fez com que Mariana percebesse que passou muito tempo sendo o que gostariam que ela fosse: seja na televisão, como apresentadora, como mãe, como mulher. “Sempre gostei muito de observar pessoas, mas eu fazia isso querendo ser aceita. Eu sabia o que eles queriam escutar e o que elas queriam que eu fizesse, tanto que fui me perdendo de mim ao longo dessa jornada”, diz.
A partir da pergunta “Como eu faço para ser eu mesma?”, Mariana fundou a Soul.Me, um espaço que promove experiências de autoconhecimento e desenvolvimento pessoal, na tentativa de sair do piloto automático e descobrir seu ritmo.
“A grande força que eu consegui desenvolver ao longo do tempo foi a coragem de olhar as minhas falhas com amor e gentileza, e não querer escondê-las de mim mesma. Mas sim ficar confortável com as minhas próprias imperfeições e acolhê-las”, garante.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.