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O que é uma dieta saudável? OMS lança documento com princípios básicos da alimentação ideal; conheça

Entidade reforça a importância de dietas menos restritivas e estimula países a desenvolverem orientações próprias sobre padrões alimentares saudáveis

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Foto do author Victória  Ribeiro
Atualização:

Escolher o que comer muitas vezes parece uma missão complexa. Afinal, basta dar uma navegada nas redes sociais para perceber que toda hora surgem novos vilões e também mocinhos no universo da alimentação. Mas uma dieta saudável é menos restritiva e bem mais simples do que boa parcela da população imagina. Essa é uma das principais mensagens que a Organização Mundial da Saúde (OMS) transmite em um documento sobre o tema lançado na última quarta-feira, 30.

Em essência, uma boa alimentação é aquela que satisfaz nossas necessidades nutricionais. Isso diz respeito à ingestão adequada de carboidratos, proteínas, gorduras, vitaminas e minerais, compostos fundamentais para várias funções do organismo, como crescimento, desenvolvimento cerebral e fortalecimento do sistema imunológico.

Guia elaborado pela OMS destaca a importância dos alimentos naturais e alerta para os riscos dos ultraprocessados Foto: Marcelo/Adobe Stock

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Para compor esse cardápio ideal, a OMS, em parceria com a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), destaca quatro princípios fundamentais: adequação, equilíbrio, moderação e diversidade.

Em resumo, a entidade afirma que uma dieta saudável deve respeitar as necessidades específicas de cada indivíduo, considerando fatores como idade, gênero, tamanho corporal, estado de saúde e fases da vida, como a gravidez. Na prática, isso significa observar nosso corpo e adaptar a alimentação à cada etapa da vida, evitando tanto excessos quanto carências.

Outro pilar importante, segundo a OMS, é o equilíbrio entre os três macronutrientes: proteínas, carboidratos e gorduras. O documento chega a indicar como seria a participação ideal desses elementos na rotina em termos de porcentagem. Para quem não é profissional da nutrição, é um desafio transpor essa matemática para a realidade. Mas, na opinião da nutricionista franco-brasileira Sophie Deram, o documento elaborado pela OMS carrega uma mensagem fácil de ser acessada: estamos liberados para comer de tudo. Tudo mesmo. “É um olhar muito prudente, que diz ‘olha, o carboidrato não é vilão, a gordura não é vilã e a proteína também não é a moça da vez”, opina a nutricionista.

Sophie, que é autora dos livros “O peso das dietas” e “Os 7 pilares da saúde alimentar”, compara esse balanço nutricional a uma dança contínua, um ajuste que responde às mudanças e demandas do corpo. “Assim como em uma dança, o equilíbrio entre os nutrientes precisa ser flexível e adaptável, dependendo do estado de saúde e do momento de vida de cada um. E a OMS vem para dizer que uma alimentação saudável inclui carboidrato, gordura, até mesmo açúcar, desde que exista cuidado com nossas fases e particularidades’. É uma posição de saúde pública interessante”, reforça.

De maneira geral, veja como as orientações da OMS são divididas.

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Carboidratos

Para pessoas com mais de 2 anos, a OMS recomenda que entre 45% e 75% das calorias diárias venham dos carboidratos, que são nossa principal fonte de energia. A quantidade exata varia conforme o equilíbrio entre proteínas e gorduras, completando as necessidades nutricionais.

A principal orientação é que os carboidratos venham de alimentos ricos em fibras e minimamente processados, como grãos integrais (arroz integral e milho, por exemplo), vegetais, frutas e leguminosas (feijão e grão-de-bico).

Gorduras

A recomendação para adultos é de que 15% a 30% das calorias diárias sejam provenientes de gorduras. Para crianças, essa proporção varia entre 15% e 35%. “A gordura é um nutriente essencial para o funcionamento adequado das células do corpo, e dois ácidos graxos — ácido linoleico e ácido alfa-linolênico — só podem ser obtidos a partir dela”, diz um trecho do documento.

Cabe destacar que há tipos diferentes de gorduras, sendo que algumas são melhores do que outras. Para evitar o ganho de peso não saudável, a OMS orienta que a divisão entre elas seja assim:

  • Gordura saturada: até 10% do total de calorias. Fontes dessa gordura incluem laticínios, manteiga, óleo de coco e carne vermelha. É preciso moderar nesse tipo porque o abuso está ligado a um aumento no risco de doenças cardiovasculares. É bom lembrar que inúmeros produtos ultraprocessados são ricos em gorduras saturadas — só que eles devem ser evitados, porque também costumam apresentar excesso de açúcar, sódio e aditivos alimentares.
  • Gordura monoinsaturada: não possui um limite específico, pois depende da substituição de outras gorduras, especialmente das saturadas. Azeite de oliva e abacate estão entre as fontes. Em doses adequadas, esse tipo é visto como aliado da saúde.
  • Gordura poli-insaturada: de 6% a 10% das calorias totais. O óleo de linhaça e o óleo de canola são exemplos, sendo recomendados por serem ricos em ômega-3 e ômega-6. Também têm funções protetoras.
  • Gordura trans: no máximo 1% do total de calorias. A OMS adverte que a gordura trans industrial, como a presente em óleos parcialmente hidrogenados, deve ser evitada. As poucas gorduras trans consumidas devem vir de fontes naturais, como carnes e laticínios de animais ruminantes, como vacas e cabras.

Proteínas

Para atender às necessidades do corpo, elas devem representar de 10 a 15% das calorias consumidas por dia, tanto para adultos quanto para crianças. Durante a adolescência e entre atletas, essa proporção pode ser ligeiramente maior. No entanto, é válido ressaltar que o consumo excessivo de proteínas pode sobrecarregar metabolicamente o corpo, particularmente os rins.

Pessoas com fatores de risco para doenças cardiometabólicas, como obesidade ou diabetes tipo 2, podem se beneficiar ao priorizar fontes vegetais de proteína, como leguminosas (feijões, lentilhas, grão de bico, entre outras) e sementes (chia e linhaça, por exemplo).

Para bebês de até 6 meses, a OMS recomenda que as necessidades nutricionais sejam atendidas exclusivamente pela amamentação. Já dos 6 meses aos 2 anos, a introdução de proteínas de alta qualidade de origem animal, como carnes magras, peixe e ovos, é recomendada.

Açúcares livres

Os açúcares livres, que não têm valor nutricional essencial, devem ser restritos a menos de 10% da ingestão calórica diária para adultos e crianças acima dos 2 anos. Trata-se do açúcar adicionado pela indústria a produtos como refrigerantes, bolos, biscoitos e inúmeros outros itens, e também pelo consumidor em receitas (ou no café).

A OMS também desencoraja o uso de adoçantes artificiais, pois não há evidências sólidas de que eles contribuam para controle de peso ou redução de doenças alimentares.

Pontos de atenção: sal e potássio

Para o consumo de sal, a OMS sugere o consumo de, no máximo, 5 gramas ao dia (ou uma colher de chá rasa). Essa quantidade fornece 2 gramas de sódio, limite indicado desse mineral. É que doses extras do micronutriente levam à constrição dos vasos e ao aumento da pressão arterial, fator de risco para doenças cardiovasculares.

Em contrapartida, a entidade incentiva o aumento da ingestão de potássio, encontrado em frutas, verduras e legumes, como banana, laranja, manga, milho, batata e espinafre. Esse mineral atua de forma oposta ao sódio, ou seja, favorece o relaxamento dos vasos. Com isso, ajuda a controlar e pressão e reduzir o risco cardíaco.

Sem terrorismo nutricional

Na opinião dos pesquisadores do Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde (Nupens) da Universidade de São Paulo (USP), Carlos Monteiro e Patrícia Jaime, os guias alimentares “devem ser adaptados ao contexto de cada país, respeitando cultura, tradições e diversidade regional”. “A OMS não criou um guia alimentar, mas um documento que estimula os países a desenvolverem suas próprias orientações que promovam padrões alimentares saudáveis. O ‘Guia Alimentar para a População Brasileira’ é um exemplo valioso nesse sentido”, opinam.

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A visão é apoiada pela nutricionista Sophie Deram, mas ela ressalta que o documento emitido pela OMS ajuda a reduzir o “terrorismo nutricional”, movimento que frequentemente demoniza certos alimentos.

Em um contexto mais amplo, a nutricionista acredita que diretrizes como essa da OMS são feitas para orientar políticas públicas e para lembrar os profissionais de saúde da relevância do equilíbrio na nutrição. “Essas recomendações não são prescrições individuais, mas orientações gerais para uma alimentação saudável e acessível. Isso é especialmente importante para lembrar os profissionais de aspectos fundamentais, mas muitas vezes esquecidos, como o fato de que o consumo excessivo de proteína animal pode prejudicar a saúde cardiovascular”, exemplifica.

A nutricionista e pesquisadora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Maísa Antunes, complementa a análise ao abordar a popularidade das dietas low carb (aquela que limita o consumo de carboidratos), alertando para os riscos dessa tendência. Ela explica que a restrição desse tipo de nutriente — nossa principal fonte de energia — obriga o corpo a buscar outras fontes, como gorduras e proteínas, o que pode custar caro à saúde. Entre os efeitos colaterais mais comuns estão queda de energia, irritabilidade e, em casos mais graves, até problemas metabólicos e de saúde mental, especialmente quando a restrição é mantida por longos períodos.

“Precisamos desse nutriente para todas as funções vitais, desde respirar até às atividades físicas diárias”, afirma Maísa. “Embora muitas pessoas possam se beneficiar desse tipo de prática [low carb], seja por orientação nutricional ou condições de saúde, a maioria segue essa tendência por influência de modismos. O documento acaba sendo muito pertinente em um momento como esse”, complementa.

Alerta em relação aos ultraprocessados

Na opinião de Sophie e Maísa, outro aspecto interessante do documento elaborado pela OMS é a ênfase nos riscos associados ao consumo de alimentos ultraprocessados, como biscoitos, salgadinhos, pratos prontos — incluindo lasanhas e pizzas congeladas — e refrigerantes.

Documento da OMS enfatiza importância de evitar o consumo de itens ultraprocessados. Foto: Khairil/Adobe Stock

“Um corpo grande e crescente de evidências sugere que o consumo de alimentos altamente processados, descritos como ultraprocessados pela classificação NOVA, está associado a resultados negativos para a saúde, incluindo risco de mortalidade prematura, câncer, doenças cardiovasculares, sobrepeso, obesidade e diabetes tipo 2, além de impactos na saúde mental, respiratória e gastrointestinal”, destaca a OMS.

A referência à classificação NOVA, desenvolvida pelos pesquisadores brasileiros do Nupens, liderados por Carlos Monteiro, também representa um marco. Vale ressaltar que essa ferramenta serviu como base científica para a elaboração do Guia Alimentar para a População Brasileira, que completou dez anos em maio deste ano e tem servido como base para a formulação de políticas públicas no país.

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Para Sophie, o guia brasileiro, publicado em 2014, tem uma abordagem inovadora e até mesmo ‘revolucionária’, já que se afasta das minúcias relacionadas às porcentagens de nutrientes e à contagem de calorias. Em resumo, ele prioriza a qualidade dos alimentos, os padrões alimentares e o contexto cultural. “Sua famosa regra de ouro, ou seja, ‘prefira sempre alimentos in natura ou minimamente processados e preparações culinárias a produtos ultraprocessados’, é um convite à ação que resgata a relação com a cozinha, valorizando a construção de pratos baseados em ingredientes naturais, simples e típicos da cultura brasileira, como arroz, feijão, bife e salada”, descreve a nutricionista.

Para Monteiro e Patrícia, a menção à classificação NOVA pela OMS, embora tímida, não apenas valida as evidências científicas sobre os danos à saúde causados pelos ultraprocessados, mas também oferece subsídios importantes para tomadores de decisão sobre a necessidade de políticas públicas que promovam uma alimentação mais saudável. “As pessoas precisam entender que a alimentação saudável é simples e se assemelha muito àquela consumida por nossos avós. Basicamente, uma parte da comida que consumimos deve passar pela cozinha. Hoje, grande parte vem de fábricas, e isso não é natural”, afirma Monteiro.

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