A virada do ano no Guarujá, litoral paulista, foi marcada por um ‘surto de virose’ que levou muitos turistas e moradores em busca de atendimento médico, sobrecarregando o sistema de saúde município. Entre os relatos estavam sintomas de náuseas, vômitos, diarreia e dores intensas na barriga. Municípios vizinhos, como Praia Grande, também observaram aumento de ocorrências.
Entre quarta-feira, 1º, e sexta-feira, 3, unidades de saúde públicas e particulares do município registraram longas filas de pacientes. Em algumas Unidades de Pronto Atendimento (Upas), o tempo de espera passava de quatro horas. Na UPA Enseada, era grande a movimentação de pacientes. Muitos estavam aglomerados dentro do prédio, enquanto outros aguardavam atendimento em pé ou sentados no chão na parte externa. Do lado de fora, era possível ouvir pessoas vomitando dentro da área de atendimento.
Quais são as possíveis causas?
Na sexta-feira, a prefeitura do Guarujá afirmou que acionou a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) para investigar possíveis vazamentos e ligações clandestinas de esgoto na região da Enseada, que poderiam estar relacionados ao aumento de casos de virose na cidade.
Além disso, o município aguarda os resultados de análises laboratoriais de amostras encaminhadas ao Instituto Adolfo Lutz para tentar esclarecer a origem dos casos de gastroenterocolite aguda, uma doença que causa inflamações no estômago e intestino, provocando cólicas, diarreias e, alguns casos, febre.
Em entrevista ao Estadão, a diretora da divisão de doenças de transmissão hídrica e alimentar da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo, Alessandra Lucchesi, afirmou que investigações em curso devem fornecer as respostas para essas questões na próxima semana. O monitoramento segue principalmente no Guarujá e na Praia Grande.
Segundo ela, neste momento, todos os laudos e parâmetros que a Sabesp apresentou estão dentro do satisfatório. “Agora, frente à ocorrência de um surto, no processo de investigação epidemiológica, além da coleta de amostras de fezes de pessoas no período agudo do quadro diarreico, também recomendamos a coleta de água para a investigação. A equipe da Vigilância Sanitária Municipal já foi orientada a fazer coleta de água para que possamos fazer pesquisa de vírus, bactérias e parasitas”, comentou ela.
O que disse a Sabesp?
A Sabesp, por sua vez, disse que adotou medidas para verificar as solicitações da prefeitura e prestou os esclarecimentos necessários à Secretaria Municipal de Meio Ambiente. A companhia acrescenta que tem monitorado o sistema de esgoto da Baixada Santista e que “ele está operando normalmente”.
“Cabe destacar que as fortes chuvas podem sobrecarregar o sistema (de esgoto) devido à entrada irregular de água pluvial, já que o sistema não foi projetado para essa finalidade”, afirma ainda a Sabesp em nota.
Período mais crítico foi superado no Guarujá?
No sábado, 4, segundo a Secretaria Municipal de Saúde do Guarujá, o tempo médio para atendimento médico girava em torno de 1 hora em algumas unidades. Na manhã deste domingo, 5, o fluxo de pessoas se encontra dentro da normalidade, de acordo com a pasta.
O coordenador da Vigilância Sanitária de Guarujá, Marco Chacon, acredita que o pico da virose já foi superado, graças às medidas adotadas. “O reforço da estrutura, com mais médicos, enfermeiros e estações para aplicação de soro, deu resultado. Hoje, as salas de emergência e soroterapia dos Prontos Socorros (PSs) estão vazias, não há mais filas e as Unidades de Saúde da Família apresentam fluxo de pessoas dentro da normalidade”, disse ele.
As unidades de Saúde da Família dos bairros Jd. dos Pássaros, Vila Rã e Cidade Atlântica, que faziam apenas atendimento eletivo das 7h às 17h, continuam abertas até às 22 horas, sem a necessidade de agendamento de consultas. O atendimento em horário estendido segue até este domingo, podendo ser ampliado em caso de necessidade.
Outras cidades foram afetadas?
“Trata-se de uma onda, que, ao que parece, já deixou o Guarujá”, afirma Chacon. “Queremos descobrir a origem da virose, que começou ainda antes do Natal, e só os laudos trarão essa resposta. A onda de infecção agora migrou para as cidades vizinhas, o que é muito comum em casos de viroses causadas, provavelmente, por norovírus, transmitidos por água contaminada”, avalia ele.
“Fomos para o Guarujá em sete pessoas. Todos ficaram mal”, conta Carolina Simões, engenheira civil de 28 anos. Ela e seus amigos viajaram para o município no dia 27. Como muitos visitantes, começaram a apresentar sintomas a partir de 1º de janeiro - um após o outro. O mesmo ocorreu com a família de Paula Moraes, de 49 anos. Na quinta-feira, o marido começou ter sintomas. “Ele teve diarreia apenas. Depois, eu tive diarreia e comecei a vomitar. Minha filha também passou mal.”
Apenas no mês de dezembro, foram realizados 2.064 atendimentos nas Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) da cidade do Guarujá. Além das unidades de saúde lotadas, também houve relatos sobre dificuldades para encontrar medicamentos e farmácias cheias. Ainda não é possível precisar se a ocorrência supera o esperado para o período ou mesmo o que foi registrado em anos anteriores.
Já o município de Praia Grande disse que verificou que as unidades de saúde estavam realizando atendimentos relacionados a casos de virose com maior frequência. Não há, contudo, números específicos sobre o problema.
Em Santos, a prefeitura afirmou que os casos de virose subiram de 2.147 em novembro para 2.264 em dezembro. Em janeiro, até a última sexta-feira, foram 273 atendimentos nas unidades municipais.
No litoral norte, a prefeitura de Caraguatatuba informou que não houve registros alarmantes de casos na cidade. Apenas dois pacientes com sintomas de diarreia foram identificados recentemente e os moradores culparam a água de um condomínio.
A Secretaria de Estado da Saúde informou que “está acompanhando e orientando os municípios da Baixada Santista e do litoral norte sobre as medidas a serem adotadas”. A Companhia Ambiental do Estado (Cetesb), por sua vez, orienta os banhistas a verificar a qualidade da água da praia por meio do site, app e bandeiras de sinalização nas orlas.
Quais cuidados devem ser redobrados nesta época do ano?
A prevenção passa por cuidados básicos de higiene e pela atenção redobrada na manipulação e no consumo de alimentos e bebidas. Confira algumas medidas recomendadas por infectologistas:
- Prefira sempre água filtrada, fervida ou envasada em garrafas lacradas;
- Evite consumir alimentos de origem duvidosa ou preparados em condições precárias de higiene, especialmente frutos do mar;
- Cozinhe bem os alimentos antes de consumi-los;
- Observe se a praia escolhida apresenta sinais de poluição, como esgoto visível ou mau cheiro. Dê preferência a locais com monitoramento regular da qualidade da água;
- Lave bem as mãos após o uso do banheiro, antes do preparo de alimentos e antes de se alimentar;
- Carregue consigo um frasco de álcool em gel, para higienização em lugares sem acesso à água ou sabão.
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