OMS reconhece varíola dos macacos como emergência de saúde global

Decisão foi tomada neste sábado e tem o objetivo de alertar para propagação da doença e atrair investimentos para pesquisas voltadas ao tratamento. Vírus já está em 70 países

PUBLICIDADE

Foto do author Redação
Por Redação

A Organização Mundial da Saúde (OMS) reconheceu neste sábado, 23, o avanço da varíola dos macacos (monkeypox) como uma emergência global de saúde. A entidade levou em consideração o cenário "extraordinário" da doença, que já chegou a mais de 70 países. A emergência pode desencadear alertas contra a propagação do vírus e propiciar investimentos em pesquisas que investiguem as causas da doença e tratamentos eficazes.

Segundo estimativa da OMS, 98% dos casos de varíola dos macacos confirmados no mundo são entre "homens que se relacionam com homens"; na foto, rapaz espera na fila de imunização contra a monkeypox em Nova York Foto: Eduardo Munoz/REUTERS - 15/07/2022

PUBLICIDADE

O diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, decidiu emitir a declaração apesar da falta de consenso entre os membros do comitê de emergência da organização. Foi a primeira vez que o chefe da agência de saúde da ONU tomou tal ação.

"Em suma, temos um surto que se espalhou rapidamente pelo mundo por meio de novos modos de transmissão sobre os quais entendemos muito pouco e que atendem aos critérios das regulamentações internacionais de saúde", disse Tedros. “Sei que este não foi um processo fácil ou direto, e que há opiniões divergentes entre os membros do comitê", acrescentou o diretor-geral.

Embora a varíola dos macacos tenha se estabelecido em partes da África central e ocidental por décadas, a doença não era conhecida por desencadear grandes surtos fora do continente africano, ou se espalhar amplamente entre as pessoas até maio, quando as autoridades detectaram dezenas de epidemias na Europa, América do Norte e em outros lugares.

Publicidade

A doença já foi identificada pela ciência em 1958, mas agora médicos e pesquisadores tentam entender as causas da velocidade do novo surto e debatem a melhor forma para conter essa ameaça sem aumentar o estigma sobre os grupos mais vulneráveis ao vírus. Entre as estratégias, eles defendem campanhas de orientação focadas e vacinas.

A OMS estima que 98% dos casos de varíola dos macacos notificados em todo o mundo sejam entre "homens que se relacionam com homens" (HSH), o que engloba o grupo de gays e bissexuais, mas não se restringe a eles. No Brasil, médicos de São Paulo relatam percepção semelhante e o boletim mais recente do Ministério da Saúde aponta que essa população corresponde a 100% dos pacientes que declararam a orientação sexual na hora do diagnóstico. Ainda não se sabe o motivo de o contágio ser maior nesse grupo.

Emergência pode facilitar resposta coordenada

Declarar estado de emergência global significa dizer que o surto de varíola dos macacos é um "evento extraordinário", que pode se espalhar para mais países e que requer uma resposta global coordenada. A OMS já havia declarado emergência global para outras crises de saúde pública, como a pandemia de covid-19, o surto de ebola na África Ocidental em 2014, o vírus zika na América Latina em 2016, além do ​​esforço contínuo para erradicar a pólio.

Publicidade

A declaração de emergência serve, principalmente, como um apelo para atrair mais recursos globais e atenção para um surto. Anúncios anteriores tiveram impacto misto, uma vez que a agência de saúde da ONU é, em grande parte, impotente para fazer os países agirem.

No mês passado, o comitê de especialistas da OMS disse que o surto de varíola dos macacos ainda não era uma emergência internacional, mas o painel se reuniu esta semana para reavaliar a situação. De acordo com os Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos EUA, mais de 16.000 casos de Monkeypox foram relatados em 74 países desde de maio, aproximadamente.

Até o momento, as mortes por varíola dos macacos só foram relatadas na África, onde uma versão mais perigosa do vírus está se espalhando, principalmente na Nigéria e no Congo.

Na África, a varíola dos macacos se espalha, principalmente, para pessoas a partir de animais selvagens infectados, como roedores. Os surtos são limitados e, normalmente, não cruzam fronteiras. Na Europa, América do Norte e em outros lugares, no entanto, a doença está se disseminando entre pessoas sem vínculos com animais ou viagens recentes à África.

Publicidade

Condições para emergência já tinham sido atendidas, diz pesquisador

A especialista em Monkeypox da OMS, Dra. Rosamund Lewis, disse esta semana que 99% de todos os os casos de varíola fora da África ocorreram em homens e, desses, 98% envolveram homens que fazem sexo com homens. Especialistas suspeitam que surtos de varíola na Europa e na América do Norte foram transmitidos via sexo em duas raves na Bélgica e na Espanha.

Michael Head, pesquisador sênior em saúde global da Universidade de Southampton, disse ser surpreendente que a OMS ainda não tivesse declarado monkeypox uma emergência global, explicando que as condições foram sem dúvida atendidas semanas atrás.

Alguns especialistas questionam se tal declaração ajudaria, argumentando que a doença não é grave o suficiente para merecer a atenção e que os países ricos, que combatem a doença, já têm recursos para isso. A maioria das pessoas se recupera sem precisar de atenção médica, embora as lesões possam ser dolorosas.

Publicidade

"Acho que seria melhor ser proativo e reagir exageradamente ao problema em vez de esperar para reagir quando for tarde demais", disse Head. Ele acrescentou que a declaração de emergência da OMS pode ajudar doadores como o Banco Mundial a disponibilizar fundos para interromper os surtos no Ocidente e na África, onde os animais são os prováveis reservatórios naturais de varicela.

Nos EUA, alguns especialistas especulam se a varíola dos macacos pode estar prestes a se tornar uma doença sexualmente transmissível arraigada no país, como gonorreia, herpes e HIV. “ A conclusão é que vimos uma mudança na epidemiologia de Monkeypox, onde agora há transmissão generalizada e inesperada'', disse o Dr. Albert Ko, professor de saúde pública e epidemiologia da Universidade de Yale.

"Existem algumas mutações genéticas no vírus que sugerem por que isso pode estar acontecendo, mas precisamos de uma resposta globalmente coordenada para controlá-lo", disse ele. Ko pediu que os testes fossem imediatamente ampliados rapidamente, dizendo que, semelhante aos primeiros dias da covid-19, havia lacunas significativas na vigilância.

"Os casos que estamos vendo são apenas a ponta do iceberg", disse. “A janela provavelmente se fechou para interrompermos rapidamente os surtos na Europa e nos EUA, mas não é tarde para impedir que a varíola dos macacos cause grandes danos aos países mais pobres que não possuem os recursos necessários para lidar com isso.'' /COM AP

Publicidade

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.