RIO – O aumento da quantidade de solitários tem chamado a atenção de médicos e autoridades em várias partes do mundo. No Brasil, o número de casas nessa condição aumentou 43% em dez anos. A tendência de crescimento de pessoas que vivem sozinhas já faz até com que governos no exterior criem estratégias para melhorar esse problema social.
Em 2018, o Reino Unido criou uma estratégia governamental para combater a solidão, diante da identificação de 9 milhões de britânicos que vivem sozinhos e 1,2 milhão de idosos permanentemente solitários – em isolamento que foi agravado pela crise do coronavírus. O fato de a parcela da população que não divide a casa com outras pessoas ser grande entre os mais velhos também acende o alerta para as demandas de assistência de saúde e psicológica para uma população mais vulnerável.
Entre as ações do plano britânico, estão campanhas e um fundo de £4 milhões (cerca de R$ 26,2 milhões) para organizações que proponham atividades que conectem pessoas. O Japão também adotou medida semelhante à do Reino Unido em 2021. Com os números de suicídios em alta, o país asiático criou um ministério para tratar dos problemas do isolamento e seus impactos na saúde mental.
Em livro de 2012, o sociólogo americano Eric Klinenberg, da Universidade de Nova York, destaca que os quatro países com a maior proporção de domicílios unipessoais são nórdicos: Suécia, Noruega, Finlândia e Dinamarca. Nessas nações, a proporção de lares com só uma pessoa varia de 40% a 45% do total, informa o autor.
Conforme o livro de Klinenberg, além de se espalhar por países desenvolvidos com diferentes tradições culturais, o fenômeno também ocorre nas nações emergentes. A obra cita China, Índia e Brasil como nações onde esse comportamento cresce mais rapidamente. Por isso, o sociólogo define o crescimento do número de pessoas morando sozinhas como uma “experiencia social transformadora” mundial, que “muda o jeito que entendemos a nós mesmos e nossas mais íntimas relações”, assim como a construção das cidades e os hábitos de consumo. Para Klinenberg, embora seja preciso estarmos atentos aos efeitos da solidão na saúde mental, morar sozinho não é sinônimo de vida solitária.
Embora o enriquecimento das pessoas conforme avança o desenvolvimento econômico seja uma condição para o crescimento do fenômeno e seu espalhamento mundial – daí porque economias desenvolvidas estariam à frente no processo -, o livro de Klinenberg vai além no rol de explicações. O sociólogo ressalta a histórica mudança cultural que o pensador francês Émile Durkheim, fundador da Sociologia, chamou de “culto do indivíduo”. Conforme Durkheim, diz o americano, essa mudança cultural se dá a partir da transição das comunidades rurais tradicionais para as cidades industriais da modernidade.
Klinenberg cita quatro mudanças sociais da 2ª metade do século XX que permitiram o aprofundamento do "culto do indivíduo": o aumento do status das mulheres, a revolução tecnológica das comunicações, a urbanização em massa e o crescimento da longevidade. Todos esses fatores seguiram avançando neste início de século XXI.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.