Um universo de quase 13 milhões de pessoas vive no Brasil com uma doença considerada rara, ou seja, com uma das cerca de 8 mil enfermidades assim denominadas por serem diagnosticadas em apenas 65 pessoas em um grupo de 100 mil habitantes. A maioria das doenças raras são crônicas, progressivas e muitas vezes degenerativas; grande parte delas não tem cura, mas existem tratamentos que podem melhorar e muito a vida dessas pessoas.
As pesquisas clínicas sobre doenças raras têm se mostrado cada vez mais essenciais para mudar a jornada dos pacientes com essas enfermidades. As crianças diagnosticadas com a atrofia muscular espinhal tipo 1 (AME), por exemplo — uma enfermidade neurodegenerativa que até pouco tempo atrás levava esses pequenos pacientes à morte ou à dependência de um respirador artificial antes dos 2 anos de idade —, já contam com tratamento efetivo e cientificamente comprovado que tem feito a diferença na vida dos pacientes: a terapia gênica.
A geneticista Ida Schwartz, chefe do Serviço de Genética Médica, referência em Doenças Raras do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA) e pesquisadora do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ), lembra que antigamente muitos desses pacientes tinham apenas tratamentos paliativos disponíveis, mas agora podem levar uma vida praticamente normal. “As terapias gênicas estão no topo da pirâmide em termos de tecnologia e conhecimento. A gente consegue ir na origem da doença genética, que é causada por um problema em um dos 23 mil genes. E é importante ressaltar que essas terapias são seguras e agem especificamente naquele gene que está afetado na doença”, explica.
A médica foi uma das participantes da quarta e última live da série sobre doenças raras promovida pelo Estadão Blue Studio com o patrocínio da Interfarma e que discutiu "Os avanços para os pacientes com doenças raras, como incentivar as pesquisas e melhorar os tratamentos". Também participaram da conversa o deputado federal pelo Rio Grande do Sul e membro da Frente Parlamentar Mista em Atenção Integral às Pessoas com Doenças Raras, Lucas Redecker; a presidente da Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa (Interfarma), Elizabeth de Carvalhaes; e o presidente do, Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos (Sindusfarma), Nelson Mussolini.
Assista à íntegra da discussão:
O deputado federal Lucas Redecker destacou a importância do parlamento não só no debate e na aprovação de projetos relacionados com as doenças raras, mas também no compromisso com a incorporação mais rápida dos novos tratamentos disponíveis.
"Nós tivemos agora recentemente a aprovação da ampliação do teste do pezinho, que vai nos dar o diagnóstico (precoce) de doenças raras que até então não tínhamos. E, à medida que nós ampliamos o diagnóstico, nós também ampliamos a necessidade de ser mais urgentes na busca de tratamento”, explica.
Projeto de lei pronto para ser votado
A importância da atração de investimentos em pesquisas clínicas no Brasil para doenças raras foi destacada pela presidente da Interfarma, Elizabeth de Carvalhaes. Ela lembrou que o projeto de lei 7.082/2017, de autoria da ex-senadora Ana Amélia Lemos, e que dispõe sobre a pesquisa clínica com seres humanos e institui o Sistema Nacional de Ética em Pesquisa Clínica, está pronto para ser votado. “Esse projeto de lei foi negociado entre todas as partes interessadas, e nós temos batalhado pela aprovação do texto, que é fundamental para colaborar justamente na atração de investimentos em pesquisa clínica no Brasil para doenças raras. Se você não tem um marco regulatório, muito dificilmente vai atrair investimento internacional, no caso, para pesquisa clínica dessa matéria no Brasil”, afirma. O presidente do Sindusfarma, Nelson Mussolini, concorda. "Isso (a aprovação) é extremamente importante. Nós temos dificuldades monstruosas para trazer pesquisa para o nosso país e o nosso país está preparado para isso, nós temos vários centros para fazer pesquisa clínica. Pesquisa clínica traz ciência, conhecimento e traz o que é mais importante, que é a inovação”, explica.
Outro ponto levantado pela presidente da Interfarma foi a incorporação dos medicamentos para doenças raras nos sistemas de saúde brasileiros. “Uma dificuldade imensa que temos no caso das doenças raras é a incorporação. Ela se utiliza de custo-efetividade e da busca de um comparador com algum medicamento já utilizado no Sistema Único de Saúde. Mas tudo o que está em torno de um paciente de doença rara deve ser entendido como marco regulatório em um universo especial, porque os comparadores usados em relação as outras terapias são inadequados para as doenças raras", conclui.
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