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Política Nacional do Câncer aprovada demanda regulamentação e diálogo

Para que ela saia do papel e aconteça na prática, é fundamental entender – e discutir – os desafios da sua implementação

Por Johnson & Johnson e Estadão Blue Studio
Atualização:
11 min de leitura

Dados da Organização das Nações Unidas (ONU) apontam que a população mundial continuará aumentando, assim como o envelhecimento. Hoje somos 8 bilhões de pessoas; em 2050, seremos 9,7 bilhões. Ainda de acordo com a ONU, em 2050, o número de idosos com mais de 65 anos será igual ao de crianças até 12. O crescimento populacional e o envelhecimento podem refletir em um aumento acelerado da incidência de câncer.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) prevê mais de 35 milhões de novos casos em 2050, 77% a mais do que os 20 milhões estimados em 2022. Os fatores de risco, como tabaco, álcool e obesidade, além da poluição do ar, seguirão influenciando os casos. De acordo com o mesmo estudo, a estimativa é de que, no Brasil, eles subam 54%, comparando 2022 e 2050.

Apesar desses números, a oncologia está em plena evolução, e novos tratamentos já dão outro rumo à jornada dos pacientes.

“Cada tipo de câncer é diferente, assim como os desafios enfrentados pelos pacientes. Nossos esforços de pesquisa, desenvolvimento e colaboração estão focados em áreas nas quais nossa profunda experiência e compreensão da doença e da ciência nos permitem criar inovações que fazem diferença e dão oportunidade de uma vida melhor, independente do estágio da doença”, explica Christel Arce, diretora de Acesso ao Mercado e Assuntos Regulatórios da Johnson & Johnson.

“Temos orgulho de realizar avanços disruptivos no tratamento de doenças como mieloma múltiplo, linfomas, leucemias, câncer de próstata, de pulmão e outras, resultado do investimento global de US$ 11,9 bilhões em pesquisa e desenvolvimento, só em 2023″, completa ela.

Diante das projeções sobre o câncer, fica claro que é preciso pensá-lo como um problema de saúde pública em agravamento, para o qual a abordagem deve ser ampla e coletiva, envolvendo governo, sociedade civil, entidades médicas e científicas e companhias que desenvolvem tecnologias para tratamento e cura.

“Como parte do setor de saúde, nosso papel é apoiar iniciativas com o potencial de fortalecer e aprimorar um sistema de saúde cada vez mais complexo. Por isso, valorizamos o diálogo com gestores e formadores de políticas públicas”, ressalta Arce.

No Brasil, um importante passo já foi dado com a Política Nacional de Prevenção e Controle do Câncer (PNPCC) e o Programa Nacional de Navegação da Pessoa com Diagnóstico de Câncer, instrumentos criados com a ajuda de vários setores e sancionados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2023.

Em 18 de junho, completaram-se os 180 dias da sanção sem que a PNPCC tenha sido regulamentada, como prevê a legislação. Há ainda muito a ser definido para que a lei entre em vigor.

O que é a Política Nacional de Prevenção e Controle do Câncer

Elaboração da legislação levou dois anos e teve contribuição de associações de pacientes, oncologistas, sociedades médicas, indústria e entidades de assistência filantrópica

A Política Nacional de Prevenção e Controle do Câncer (PNPCC) tem como objetivos garantir o acesso adequado ao cuidado integral, contribuir para a melhoria da qualidade de vida do paciente e reduzir a mortalidade e a incapacidade causadas pela doença, além de buscar a diminuição da incidência na população.

A PNPCC estabelece uma abordagem nacional para a doença, que não existe hoje e resulta em desigualdades no SUS. Entre as novas determinações há ainda prioridade na análise de tecnologia ou procedimento relacionado à assistência da pessoa com câncer pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec), que decide o que será oferecido pelo SUS, além do prazo de seis meses, depois da aprovação, para que ela esteja disponível para os pacientes.

A PNPCC foi resultado de vários debates e da movimentação da sociedade para o aperfeiçoamento do modelo de cuidado oncológico. Construída ao longo de dois anos, ela contou com a participação de todas as partes implicadas. O primeiro passo foi a criação de uma comissão na Câmara dos Deputados, presidida pelo deputado Weliton Prado (Solidariedade-MG).

“O câncer tem aumentado de forma significativa, sendo a segunda doença que mais mata no nosso país – e em muitos municípios já é a primeira. Essa legislação vem ao encontro da necessidade de dar uma resposta rápida para essas pessoas”, afirma Weliton Prado, que destaca as estimativas de 704 mil novos casos de câncer até 2025, feitas pelo Instituto Nacional do Câncer (Inca).

Os parlamentares puderam conhecer um amplo panorama sobre a doença no País, número de novos casos, dificuldade de acesso a tratamentos, financiamento, etc., a partir de conversas com associação de pacientes, Inca, oncologistas, sociedades médicas, entidades de assistência filantrópica, representantes da indústria farmacêutica e diagnóstica. Todos puderam apresentar seus pontos sobre a abordagem à doença no SUS e como melhorá-la.

A partir desse aprendizado coletivo, foram desenhadas as propostas para o texto final.

Agora, o Ministério da Saúde trabalha para regulamentar a Lei e, para isso, os principais eixos dela são debatidos dentro do Consinca, o Conselho Consultivo do Instituto Nacional do Câncer, que conta com a participação da sociedade civil.

“Nossa luta agora é a implementação. Essa política tem que sair do papel e fazer diferença, de fato, na vida das pessoas. Lutamos para que ela seja realidade”, afirma o deputado Weliton Prado.

Navegação do paciente

A reboque da PNPCC, foi instituído também o Programa Nacional de Navegação da Pessoa com Diagnóstico de Câncer, estratégia que combina a busca ativa (ir ao encontro do paciente) e o acompanhamento individualizado. Na prática, o paciente atravessa a sua jornada com ajuda de profissionais para agendar consultas, explicar procedimentos e até dar apoio emocional.

“A navegação é o fio condutor que mantém a integridade e a continuidade do tratamento, proporcionando um suporte que vai além da medicina convencional”, diz Karla Mesquita, farmacêutica que atua na Secretaria de Saúde do Estado de SP.

Oncologista e diretor-geral do Inca, Roberto de Almeida Gil considera que a melhor estratégia é integrar a navegação à atenção básica, onde acontecem as consultas de rotina. “Temos que aumentar essa correspondência; se o médico da atenção básica não tem conhecimento da doença, ele não sabe o que fazer nem como orientar o paciente”, explica.

País destina só 1,08% de recursos da saúde para combate ao câncer

Financiamento e estruturação de rede de dados são fundamentais para enfrentar segunda doença que mais mata no Brasil

Embora o câncer seja a segunda causa de morte no País já há duas décadas e 704 mil casos novos sejam esperados, por ano, no triênio 2023-2025, segundo o Inca, só 1,08% dos gastos públicos em saúde foram destinados à oncologia. Ou seja, em 2023, o combate ao câncer recebeu R$ 4,3 bilhões em verbas, de um total de R$ 403,8 bilhões. É o que mostra um estudo do Instituto Lado a Lado pela Vida, apresentado no seminário Global Forum 2024.

Oncologista, gestor hospitalar e ex-coordenador da Secretaria de Atenção Especializada à Saúde (Saes) do Ministério da Saúde, Sandro Martins lembra que o déficit entre casos e a oferta de tratamento se amplia. “Tratar o câncer engloba muitas etapas, os pacientes precisam de cirurgias, radioterapia, quimioterapia, novos medicamentos e tecnologias. Os casos aumentam, e nosso sistema de saúde não acompanha esse crescimento”, destaca.

O ex-ministro da Saúde e oncologista Nelson Teich concorda que o Brasil enfrenta desafios. “O País é muito heterogêneo, temos problemas diferentes em vários lugares, mas na oncologia hoje há dificuldade em diagnóstico, tratamento, cuidado paliativo e navegação do paciente. É uma doença muito complexa, e não temos uma estrutura de saúde, trabalhada nacionalmente, na qual se consiga atender como é necessário.”

O financiamento do SUS é feito principalmente pelas esferas federal, estadual e municipal. “Cada uma contribui de maneira significativa, e esse financiamento é crucial para garantir que os recursos cheguem ao ponto final e beneficiem quem precisa”, diz Igor Morbeck, líder médico regional do Grupo Oncoclínicas e membro do conselho científico do Instituto Lado a Lado pela Vida.

Para ampliar os recursos, um projeto de lei de autoria do deputado federal Weliton Prado (Solidariedade-MG) estabelece um mínimo para cada ente investir em oncologia. A União teria que destinar ao menos 4% do orçamento da saúde para o câncer; estados, 3%; e capitais e municípios com mais de 200 mil habitantes, 2%. Isso elevaria os recursos para R$ 13 bilhões.

No Reino Unido, onde existe um modelo de saúde pública universal como no Brasil, foram investidos, só em diagnóstico e tratamento, o equivalente a R$ 27,28 bilhões em 2022. Lá são 66,9 milhões de pessoas, enquanto aqui somos 215,3 milhões.

Há ainda a proposta da criação do Fundo Nacional de Enfrentamento do Câncer, o Funcancer, para financiar prevenção, diagnóstico e tratamento da doença. Em tramitação na Câmara dos Deputados, o projeto também é de autoria de Weliton Prado. Os recursos viriam de dotações orçamentárias da União, doações e percentuais da receita bruta proveniente da arrecadação de impostos sobre cigarros e bebidas alcoólicas. Em agosto, outro projeto foi aprovado na Comissão de Saúde da Câmara para destinar ao Funcancer 30% do total de recursos de multas por infrações sanitárias.

“O Brasil carece de uma rede de assistência oncológica organizada e financiada. Os centros de orientação primária, que hoje atendem cerca de 75% dos pacientes, são cruciais e precisam de mais recursos para encaminhar adequadamente os casos”, afirma Carmino Antonio de Souza, professor titular de Hematologia, Transfusão de Sangue e Terapia Celular na Unicamp.

Além da necessidade de redimensionar o financiamento, com a nova Política Nacional do Câncer o papel do Departamento de Assistência Farmacêutica, do Ministério da Saúde, deve ser fortalecido, já que, de acordo com a PNPCC, ele passa a ser central no processo de disponibilização dos tratamentos e terá que suprir todas as demandas vindas da oncologia.

Sistema de dados

Outro entrave a ser superado são os sistemas de informação. Faltam bancos de dados sobre os pacientes, que registrem todas as etapas, como diagnóstico, tratamento, etc., algo fundamental não só para o indivíduo, mas também para o acompanhamento dos números da doença e a elaboração de políticas públicas.

A boa notícia é que já existe uma base de dados do Sistema Único de Saúde, o DataSUS, que pode ser aperfeiçoada e servir como ponto de partida. “O DataSUS é uma ferramenta poderosa que, se bem utilizada, pode fornecer informações valiosas para o mapeamento do câncer no Brasil”, afirma Igor Morbeck.

Sociedade civil tem papel importante também na implementação de lei

Entidades que lutam pelos direitos de pacientes oncológicos fazem parte de conselho que trabalha na regulamentação da PNPCC

Desde 2019, o Instituto Lado a Lado Pela Vida organiza o Global Forum Fronteiras da Saúde, evento anual que reúne especialistas, representantes do governo e do sistema de saúde privado, pesquisadores e médicos, entre outros segmentos da sociedade, para refletir sobre a sustentabilidade econômica da saúde e pensar soluções.

Na edição especial deste ano do fórum, o instituto apresentou um levantamento que apontou que apenas 1,08% da verba da saúde pública é usada em oncologia. O estudo fez uma análise inédita do Sistema de Informações sobre Orçamentos Públicos em Saúde (Siops) sobre o orçamento público aplicado no Sistema Único de Saúde (SUS) pelas secretarias estaduais e municipais de saúde.

Divulgação/Johnson & Johnson Foto: Getty Images

O levantamento também jogou luz nas diferenças de financiamento regionais e como a atenção ao câncer – que é a segunda doença que mais mata no Brasil – está pulverizada. As disparidades na atenção básica, a porta de entrada no sistema público de saúde e na qual podem ser feitos diagnóstico, tratamento e reabilitação, entre outros cuidados, evidenciam profundas desigualdades de gestão entre as capitais brasileiras.

Em 2023, Rio Branco (AC) destinou 85,89% de seu recurso em saúde à atenção básica, enquanto Belém (PA) aplicou apenas 5,02%, representando os extremos dessa distribuição. Além de Rio Branco, apenas Florianópolis, São Paulo, Macapá, Manaus e Recife investiram mais de 40% de seus recursos em atenção primária, com São Paulo aplicando 44,60% como parâmetro referencial. Em contraste, capitais como São Luís, Teresina, Goiânia, Natal, Brasília, Cuiabá, Salvador e Belém investiram menos de 10% de seus recursos em atenção primária.

Em suas visitas a centros de tratamento em todo o País, a fundadora e presidente do Instituto Lado a Lado pela Vida, Marlene Oliveira, observou que, além das disparidades de recursos, cada um deles apresenta especificidades. “É preciso ter um olhar diferenciado, que entenda as necessidades de cada região e se adapte a elas”, afirma.

E isso tem a ver com os números da doença. Marlene ressalta que é preciso começar a analisá-los de forma diferente. “Ao olhar para o registro de dados, precisamos lembrar que são números subnotificados. Precisamos melhorar os números, discutir isso no Consinca e levar esse tema ao Inca. É importante também empoderá-lo, afinal ele é o Instituto Nacional do Câncer. O Inca tem que ser nacional, tem que retomar esse papel. Não dá para ter diferentes Incas pelo País. Ele tem que representar o País inteiro”, afirma a presidente do Lado a Lado pela Vida.

O Consinca é o Conselho Consultivo do Instituto Nacional do Câncer (Inca), no qual grupos de trabalho buscam regulamentar a Política Nacional de Prevenção e Combate ao Câncer e torná-la realidade.

“O Consinca agora abriu espaço para a contribuição da organização civil. Até então era mais fechado, e essa gestão foi quem abriu esse espaço. O trabalho está sendo bem interessante; como em qualquer conselho, temos que ouvir a contribuição de todos os setores. É um espaço de interlocução, no qual a gente consegue se comunicar. Acredito muito nele e na sua importância, e acho que ele vai contribuir para que essa lei seja implementada”, conta Marlene.

Entre as entidades que participaram das atividades que deram origem à PNPCC está o Instituto Lado a Lado pela Vida, que passou também a integrar o Consinca.

Esse, aliás, é um dos pontos mais celebrados por especialistas na elaboração da PNPCC: a participação ativa de vários setores, como sociedades médicas, instituições de referência no tratamento e sociedade civil organizada, representada por diversas associações que colocam os interesses dos pacientes oncológicos em primeiro lugar. Em comum, essas organizações buscam levar informação e dar apoio à população, além de também atuar junto aos governos para melhorar as políticas públicas.

A presidente da entidade pontua, no entanto, que o andamento da regulamentação não é o mais desejado. “Não sei se o ritmo da implementação é aquele que o Instituto Lado a Lado pela Vida gostaria, mas vamos trabalhar sem medir esforços para que essa lei seja implementada. A PNPCC foi feita por todos nós e precisa sair do papel, por isso que todos nós nos reunimos e estamos trabalhando sem descanso. Isso não é de um dia para o outro, principalmente porque ela é muito desafiadora”, finaliza Marlene.

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