Os casos de dengue têm disparado no Brasil. De acordo com o Ministério da Saúde, só em 2024, foram registrados 243.721 casos prováveis da doença, quase quatro vezes o número observado no mesmo período do ano passado (65.336). Segundo a Fiocruz, os casos da doença podem chegar a 5 milhões neste ano, mais que o triplo do registrado em 2023 (1,6 milhão).
De olho nesse cenário, o Ministério da Saúde decidiu incorporar o imunizante QDenga, da farmacêutica Takeda, à rede pública, como noticiado pelo Estadão em dezembro de 2023. Mas, devido ao número limitado de doses, a vacinação pelo SUS – que deve começar agora em fevereiro – contemplará inicialmente crianças e adolescentes de 10 a 14 anos de 521 cidades.
Em estudos, a QDenga demonstrou eficácia de 80,2% na prevenção da doença e foi aprovada pela Anvisa em março de 2023. Desde julho ela está disponível em farmácias e clínicas particulares. Porém, nem todos os consumidores têm indicação para a vacinação. Ao verificar a bula do imunizante, é possível perceber que ele não é recomendado a quem tem mais de 60 anos. Se o indivíduo com essa idade quiser se vacinar, deve apresentar um pedido médico.
Cabe destacar que, devido ao aumento de casos, a busca pela vacina na rede privada disparou, apesar do preço salgado – a dose custa ao redor de R$ 400, sendo que o esquema completo de vacinação é feito com duas doses, com intervalo de três meses entre as aplicações. De acordo com a rede de farmácias Pague Menos, houve um aumento de 200% na venda do imunizante só em janeiro.
Por que não há indicação após os 60 anos?
De acordo com a infectologista Rosana Richtmann, consultora da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), trata-se de uma questão regulatória, e não de segurança. A especialista explica que a vacina da dengue não foi testada para essa faixa etária, então não existem dados que atestem a efetividade da aplicação para esse grupo.
“Não tem a ver com efeitos colaterais, e sim com a falta de testes. Mas, como a Qdenga se mostrou segura para a população até os 60 anos, acredito que ela será liberada para os idosos em breve”, diz.
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Sobre a escolha da faixa etária para as pesquisas da vacina, Rosana pontua que os fabricantes devem ter seguido um critério quantitativo, e não de gravidade. “A dengue acomete principalmente jovens, apesar da tendência de os idosos desenvolverem quadros mais graves”, raciocina.
A restrição para crianças menores de 4 anos, contudo, tem outro motivo. De acordo com Rosana, esse público até foi incluído nos estudos, mas a vacina não demonstrou eficácia de proteção significativa. Por isso, ao contrário dos idosos, a especialista não acredita que eles serão incluídos na bula.
Procurada, a Takeda explicou que a Qdenga foi desenvolvida a partir de um estudo que incluiu 28 mil participantes de 1,5 a 60 anos, de 13 países. A farmacêutica reforçou que “tem como objetivo continuar acessando os dados e evidências de QDenga após o registro por meio de dados de vida real e análises de imunogenicidade e segurança, inclusive em população acima de 60 anos. Até o momento, os dados disponíveis limitam-se à população de até 60 anos”.
E a vacina do Butantan?
A vacina contra a dengue desenvolvida pelo Instituto Butantan teve sua eficácia confirmada em artigo publicado nesta quarta-feira, 31, na revista científica New England Journal of Medicine (NEJM). O estudo demonstrou a eficácia geral de 79,6% do imunizante. A expectativa é que, ainda neste ano, o Instituto busque o pedido de registro do produto à Anvisa.
De acordo com a instituição, assim como a Qdenga, a vacina brasileira não foi testada no público acima de 60 anos e, por isso, não é recomendada para essa faixa etária. “O imunizante é feito com vírus atenuado, ou seja, enfraquecido. Historicamente, há um receio em aplicar esse tipo de vírus em pessoas com sistema imune enfraquecido e, ocasionalmente, menos eficiente. A vacina não necessariamente fará mal, mas esse cenário dificulta a análise da eficácia do produto”, explicou o Butantan, em nota.
“Neste ano, com os dados já publicados, os cientistas devem começar o recrutamento da população mais velha para os ensaios clínicos, obtendo, assim, informações que vão auxiliar na indicação da vacina para a população”, aponta o comunicado.
Como proteger os idosos da dengue?
As recomendações de prevenção para os maiores de 60 anos são as mesmas do restante da população:
- Impedir o acúmulo de água parada dentro de casa (onde, segundo o Ministério da Saúde, estão localizados 75% dos focos do mosquito Aedes aegypti, vetor da doença).
- Usar repelentes, especialmente de manhã e no final da tarde — horários de maior circulação do Aedes aegypti.
- Usar roupas de manga longa para evitar contato direto com o vetor, e em tons mais claros, que têm propriedades repelentes.
Em caso de contaminação, Rosana destaca a importância da hidratação. “Beber água é fundamental para o tratamento de todos, mas, nos idosos, é necessário um cuidado adicional nesse sentido, já que eles podem depender de auxílio para se hidratar”.
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