Por que é importante propor brincadeiras variadas para o desenvolvimento das crianças?

Ao brincar, crianças criam habilidades sociais, emocionais e de autoconhecimento; veja como estimulá-las

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Por Guilherme Santiago
Atualização:

Pular amarelinha, brincar de pique-esconde ou se divertir com jogos de tabuleiro. Existe uma infinidade de brincadeiras que costumam distrair e entreter a criançada, especialmente no período de férias escolares. No entanto, ainda que possam ser vistas como uma mera distração, essas atividades permitem que habilidades sociais, emocionais e de autoconhecimento sejam desenvolvidas pelos pequenos. Para eles, brincar é uma necessidade.

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Dentre aquilo que pode ser aprendido durante uma simples brincadeira, a psicopedagoga Neide de Aquino ressalta as habilidades sociais. De acordo com ela, que é docente da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), é durante as brincadeiras que a criança aprende a interagir com outros indivíduos. Como resultado dessa interação, a criança ganha mais autonomia e independência.

Habilidades de comunicação também são desenvolvidas. “Na interação com outras crianças, é necessário olhar no olho, esperar o outro falar, escutar o que ele tem a dizer e pensar juntos em uma mesma brincadeira”, explica Aline De Rosa, especialista e pesquisadora em desenvolvimento infantil integrativo. “É a mesma dinâmica nos ciclos sociais dos adultos”, diz ela, que garante ser fundamental desenvolver essas habilidades de fala e escuta desde a infância.

Foi sabendo da importância dessa interação que Renata Maranhão decidiu que era hora de criar momentos para que sua filha, Giovanna, de 3 anos, pudesse brincar com outras crianças da mesma idade. “Ela é um bebê que cresceu durante a pandemia. Por isso, acho que o contato com outras crianças e adultos ficou um pouco comprometido”, diz. A saída encontrada foi reunir as mães do condomínio e contratar uma especialista em brincadeiras, que durante uma semana realizou atividades lúdicas com as crianças. “Tinha brincadeira com fantoches, materiais recicláveis e pintura”, afirma ela, que diz ter sido um sucesso de iniciativa.

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“Não apenas pela interação social, mas percebi que minha filha estava interagindo melhor com as crianças e que estava dividindo mais com a gente como havia sido o dia dela”, diz. “Só não vamos fazer mais porque é um pouco caro, mas tenho a intenção de continuar me reunindo com as mães para que as crianças possam brincar juntas.”

Renata Maranhã (à esq.) com a filha Giovanna, de 3 anos: união com outras mães para aumentar as possibilidades de brincadeiras. Foto: Felipe Rau/Estadão

Por que brincar faz bem?

Os benefícios das brincadeiras vão além das questões sociais. Segundo a psicopedagoga Neide, a criança também ganha autoconhecimento. Ao brincar, os pequenos aprendem sobre eles mesmos, descobrem em quais atividades têm maior aptidão e em quais sentem mais dificuldade. Além disso, também entram em contato com seus gostos e preferências ao descobrir do que gostam ou não de brincar.

Esse autoconhecimento pode envolver as emoções. É comum que, durante uma brincadeira, a criança precise lidar com o sentimento de frustração. Seja porque perdeu em algum jogo ou porque não conseguiu executar determinada brincadeira, a frustração pode ser positiva, desde que os pequenos aprendam a superá-la. E os adultos devem ajudar as crianças nessa tarefa.

Para Diego Mendonça, pedagogo da Camino School, escola da zona oeste de São Paulo, os benefícios se estendem para os conhecimentos teóricos. “Em uma brincadeira de culinária, por exemplo, é possível trabalhar com a matemática ao medir as quantidades e no entendimento de proporções”, explica. É como se fosse mais fácil absorver o conhecimento quando eles são transmitidos de forma lúdica e com cara de brincadeira. “Por meio desse tipo de atividade, o engajamento e o aprendizado costumam ser maiores”, diz.

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Papel dos adultos na brincadeira

Não são apenas as crianças que participam das brincadeiras. Pais, responsáveis e cuidadores também devem fazer parte dessas atividades, mas com prudência. Isso porque, conforme indica a psicopedagoga, a função dos adultos é ser um facilitador das brincadeiras, mas sem estimular uma competição, punir ou fazer comparações. O mais indicado é dar autonomia à criança para que ela decida a forma como vai brincar, quais serão os brinquedos e por quanto tempo ela vai se dedicar a cada brincadeira. “A criança precisa brincar no tempo dela e não no tempo do adulto.”

Para a especialista Aline, os responsáveis pela criança também devem estipular regras para o uso de telas, que são cada vez mais recorrentes entre os mais novos. “Não podemos dizer, de forma nenhuma, que ficar em frente às telas é um tipo de brincadeira”, afirma. Mesmo sendo um conceito abstrato, ela explica que as brincadeiras são atividades que partem de dentro para fora.

“Brincar é aquilo que acontece de forma livre, que a criança determina o que será feito e como será feito”, explica. “Esportes, por exemplo, não são brincadeiras, porque, em geral, a criança não precisa criar nada, porque tem regras dizendo o que deve ser feito.”

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É isso o que também acontece com as telas. “As imagens chegam prontas para a criança. Ela não precisa criar, se movimentar, nem se relacionar com nada ou ninguém. Sem nenhum esforço, ela recebe uma enorme carga de prazer”, diz. Esse comportamento pode ter vários efeitos, como diminuir a criatividade, prejudicar o sono e até mesmo trazer uma dificuldade em brincar. “São crianças que podem ver muitos brinquedos na sua frente e não vão saber o que fazer, porque nada é tão fácil quanto olhar para uma tela.”

Foi na tentativa de reduzir as telas e fugir desses efeitos que Stella Cardoso adotou o hábito de realizar passeios com o filho. Eles costumam ir a praças, parques, teatros, bibliotecas e exposições. E, mesmo com apenas 3 anos, Rafael aproveita tudo ao máximo. “Sempre que eu posso passeio com ele. Ele gosta muito de ir ao Sesc, porque tem muitas brincadeiras. Ele faz amizade com outras crianças e se diverte bastante”, conta ela, que enxerga esse tipo de passeio como fundamental para o desenvolvimento do filho.

Stella com o filho Rafael, de 3 anos: muitas idas ao Sesc para brincar e pouco contato com telas.  Foto: Alex Silva/Estadão

De acordo com ela, essas atividades permitem ao pequeno entrar em contato com outras crianças, assistir a espetáculos de teatro e passear ao ar livre. O resultado, conforme Stella conta, é que o filho mal sente falta de aparelhos como televisão, celular e tablets. O que importa para o menino são as brincadeiras longe das telas.

Fazer passeios com as crianças é uma das recomendações da especialista. Mas existem outras formas para entreter as crianças longe das telas. Ela indica delimitar horários para uso, por exemplo, que pode ser aos sábados e domingos ou em pequenos momentos durante a semana. Ensinar as crianças a lidar com o tédio também pode ajudar. “É importante mostrar que o tédio faz parte da vida e que não é um problema não ter algo para fazer”, diz a especialista.

Brincar de caça as cores é outra recomendação da brinquedista. O adulto pode definir uma cor, como azul, vermelho ou amarelo, e a criança vai ter que procurar objetos dessas cores pela casa. “A brincadeira pode ser contra o tempo para ver quem encontra os objetos mais rápido ou usar o tempo a seu favor para ver quem encontra mais objetos de determinada cor.”

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