A data de validade de um produto médico, como vacinas, reflete o período durante o qual se espera que ele permaneça estável e mantenha identidade, força, qualidade e pureza, quando armazenado adequadamente. Normalmente, o tempo em prateleira é indicado pelo fabricante e pode ser alterado quando testes comprovem a estabilidade após a expiração.
A ampliação de validade, quando validado por órgão regulatório – no Brasil, trata-se da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) –, é algo seguro e também comum. Especialistas explicam que avaliações rotineiras sobre tempo de prateleira são uma prática desejável, para evitar desperdício e também gastos, mas é preciso boa comunicação com a população sobre a medida, a fim de que não haja ruídos.
O sanitarista Gonzalo Vecina, que já presidiu a Anvisa, comenta que o prazo de validade inicial indicado pelos fabricantes é sempre “mínimo” e, com o tempo e novos testes, há oportunidade de expandi-lo. “Os testes de estabilidade são feitos mesmo com um rigor muito maior do que o necessário.”
“O produto não estraga no dia seguinte ao vencimento dele, se ele foi mantido em boas condições de armazenamento, dentro daquilo que é especificado de temperatura e exposição a luz. Muito provavelmente você pode estender o prazo de validade do produto tranquilamente”, completa. No entanto, a extensão só pode ser validada por órgão regulatório e não deve ser feita de modo indiscriminado.
Essa dinâmica, com a pandemia da covid-19, parece ter ficado mais evidente. Nesta terça-feira, 11, a Anvisa ampliou a validade de lotes da vacina da Pfizer aplicadas no País, poucos meses após, em outubro, já ter expandido o prazo.
Em 2021, o imunizante Janssen teve duas expansões. A injeção AstraZeneca também teve duas alterações de validade, um no ano passado e outra neste (confira lista de validade das vacinas aplicadas no Brasil abaixo).
Essas frequentes atualizações, explica Isabella Ballalai, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), tem a ver com a emergência da pandemia da covid. “A gente tinha muito pouco tempo de observação de validade quando começamos a usar”, afirma.
“O fabricante só pode dizer que tem validade por um ano depois de deixar essa vacina parada um ano e avaliar se não mudaram suas características. Com a vacina da covid, a gente vai atingindo esses tempos a medida que avançamos no tempo.”
Embora tenha sido mais comum na pandemia, a médica lembra que, em um passado recente, em 2009, com a pandemia do influenza A (H1N1), a validade do antiviral Tamiflu foi ampliada.
Ballalai frisa que a decisão de ampliação só pode ser atestada pela Anvisa. Assim, caso o paciente, seja na rede pública ou privada, se depare com vacina ou medicamento vencido, pode pedir que o profissional da saúde mostre documento da agência que autorize a expansão. Para ela, deixar isso claro ao paciente deveria acontecer mesmo sem pedido, para evitar qualquer ruído.
Isso também significa que, quando você encontrar um produto médico vencido em sua casa, não deve utilizá-lo. “A validade é a segurança que a gente tem de que essa medicação está adequada pra ser tomada.”
Ao Estadão, a Anvisa explicou que toda alteração de prazo é solicitada pelo laboratório e deve ser baseada em estudos de estabilidade.
“Trata-se de uma decisão técnica que avalia se o produto se mantém estável por um tempo maior que o inicialmente definido.” O novo limite se aplicada a todos os lotes de uma vacina fabricados a partir da aprovação e, em alguns casos – também mediante solicitação –, a agência pode incluir a extensão a produtos que já se encontram no mercado. “De forma a evitar desperdícios ou atrasos na vacinação.”
Esse cenário, claro, não é uma exclusividade brasileira. Inclusive, nos Estados Unidos, em seu site, o Food and Drug Administration (FDA) – órgão semelhante à Anvisa – destaca que, por se tratarem de vacinas autorizadas para uso emergencial, não têm datas de validade fixas.
“Para as doses que estão próximas do vencimento, se estiverem sendo mantidas em condições apropriadas para garantir sua integridade para uso, elas podem ser colocadas em quarentena para verificar se os dados de novos estudos de estabilidade justificam a extensão da data de vencimento inicial de acordo com políticas e procedimentos apropriados”, informa.
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Saúde pública
Levando em consideração que colocar no lixo produto médico que pode estar estável mesmo fora da validade pode ser algo muito custoso, a discussão ganha uma outra dimensão de saúde, que tem muito a ver com gestão. Ballalai comenta que, sempre que houver dados que embasam, as expansões de prazo deveriam ser “rotina”. “Jogar fora nunca é bom, nem para o meio ambiente nem para a economia.”
Vecina acrescenta que, nesses casos, também é comum que, se não for possível estender validade, os gestores públicos têm o dever de negociar com os fabricantes a troca por produto novo, caso haja estoque abundante ou facilidade em produzir. “Você compra medicamento e não deve deixar vencer na prateleira”, destaca.
Validade das vacinas contra covid aplicadas no Brasil
No momento, imunizantes de quatro laboratórios têm autorização de uso e são aplicados no País. É possível acompanhar o processo de aprovação e atualizações da autorização no site da Anvisa pelo link.
Veja a lista dos imunizantes aplicadas e respectivas validades:
Vacina da Pfizer (Comirnaty) monovalente para crianças a partir de 6 meses, adolescentes e adultos: Validade de 18 meses a temperatura entre -90 °C e -60 °C.
Vacina da Pfizer (Cominarty) bivalente: Validade de 12 meses, quando estocadas de -80°C a -60°C ou de -90°C a -60°C.
Coronavac: Validade de 12 meses sob refrigeração entre 2 °C e 8 °C.
Janssen: Validade de 24 meses quando armazenado em temperaturas de -25°C a -15°C.
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