ENVIADA ESPECIAL A CHICAGO, ESTADOS UNIDOS* - Duas terapias de uso independente -o bloqueio ovariano e um medicamento oral- foram capazes de reduzir em até 25% o risco de recidiva do tipo mais comum de câncer de mama, mostraram dois estudos apresentados na sexta-feira, 2, em Chicago, durante o encontro anual da Sociedade Americana de Oncologia Clínica (ASCO, na sigla em inglês), principal congresso sobre câncer do mundo.
O primeiro estudo, realizado por pesquisadores da Universidade da Califórnia e patrocinado pela farmacêutica Novartis, fabricante da droga, mostrou os resultados iniciais do uso do medicamento ribociclibe combinado à hormonioterapia nos casos de pacientes com câncer de mama em fase inicial classificado como sensível a receptores hormonais e HER2 negativo. Esse tipo de tumor representa 70% de todos os casos de câncer de mama.
Para esses pacientes, o uso do medicamento levou a uma redução média de 25% no risco de recorrência do tumor, uma redução importante dado que um terço dos pacientes com o estágio 2 desse câncer passará pelo reaparecimento da doença, mesmo anos após o primeiro tratamento. No caso dos diagnosticados no estágio 3, metade terá a recidiva.
O estudo de fase 3 teve a participação de 5,1 mil pacientes em 20 países. Cerca de metade deles recebeu o ribociclibe combinado com a terapia hormonal padrão. A outra metade recebeu só a hormonioterapia. Após um acompanhamento médio de dois anos e três meses, 7,4% dos pacientes do grupo que usou o medicamento teve recidiva do câncer contra 9,3% no grupo que usou só a terapia endócrina.
De acordo com especialistas brasileiros que participam do encontro da ASCO em Chicago, os resultados são animadores, mas ainda precisam ser melhor analisados, após tempo maior de acompanhamento das pacientes.
“Os dados iniciais foram, sim, positivos, mas nós precisamos esperar uma atualização de seguimento para definir se realmente o ribociclibe veio pra ficar nesse cenário adjuvante ou se precisamos aguardar ainda mais dados pra ver como isso vai ficar”, disse Daniel Gimenes, oncologista do Grupo Oncoclínicas.
O ribociclibe pertence a uma classe de medicamentos que bloqueia a CDK4/6, proteína que promove o crescimento das células tumorais. Ele já é aprovado no Brasil para o tratamento de pacientes com câncer metastático, mas, com os novos dados, é possível que o fabricante peça o registro para que ele possa ser usado também em casos iniciais da doença.
Há outro medicamento disponível no Brasil, o abemaciclibe, da farmacêutica Eli Lilly, que tem o mesmo mecanismo de ação e já está aprovado para tratamento em estágios iniciais da doença, mas com diferentes efeitos colaterais. Segundo os médicos, a eficácia de ambos é similar, mas as diferenças nos eventos adversos poderá permitir que o especialista escolha a melhor opção de acordo com o quadro clínico do paciente.
“Embora já tenhamos uma molécula similar, o estudo é importante porque confirma a ação dessa classe de medicamentos na redução de recidivas e porque os dois medicamentos têm um perfil de toxicidade diferente. O abemaciclibe provoca mais efeitos gastrointestinais enquanto o ribociclibe causa mais neutropenia (queda de glóbulos brancos) e aumento de enzimas hepáticas. Dependendo do perfil do paciente, é uma opção a mais no arsenal terapêutico”, diz Romualdo Barroso, líder nacional de câncer de mama e head de pesquisa em Oncologia da Dasa Oncologia.
Bloqueio ovariano também reduz risco de recidiva
Outro estudo apresentado durante o encontro da ASCO mostrou que a supressão da função ovariana (e a consequente indução da menopausa para pacientes com menos de 55 anos) também é capaz de reduzir o risco de recidiva em pacientes com tumores de mama sensíveis a receptores hormonais.
O estudo de meta-análise, conduzido pela Universidade de Oxford, fez uma revisão de mais de 20 pesquisas que avaliaram o bloqueio da função dos ovários no tratamento com câncer de mama. Isso porque, na maioria desses tipos de tumor, a doença é “dependente” do estrogênio, hormônio produzido pelos ovários. Para reduzir o risco de reaparecimento de tumores, portanto, os médicos bloqueiam a ação ovariana para que o hormônio não seja mais produzido.
Na meta-análise feita pelos pesquisadores britânicos, que estudou dados de mais de 15 mil pacientes, o grupo de mulheres que passou pela supressão da função ovariana teve índice de 29,5% de recidiva do tumor no período de acompanhamento de 15 anos. Entre o grupo que não passou pelo bloqueio dos ovários, esse índice foi de 39,3%.
“Já sabíamos que a supressão da função ovariana tinha um benefício, mas agora, com esse novo estudo, temos uma evidência muito mais robusta da importância dessa intervenção”, diz Barroso, da Dasa Oncologia.
*A repórter viajou a convite da Bayer
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