SÃO PAULO - O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) abriu um posto de conciliação para lidar com ações contra planos de saúde em parceria com uma associação que representa as operadoras. A iniciativa vêm recebendo críticas de especialistas em direito do consumidor, que alegam haver "conflito de interesse" na participação das empresas no serviço.
O posto foi inaugurado no dia 25 de novembro em parceria com a Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge). O posto foi batizado de Posto de Saúde Suplementar - Abramge. Ele funcionará no Fórum João Mendes Júnior, no centro da capital paulista.
O objetivo do projeto, segundo o TJ-SP, é "incentivar a solução amigável entre beneficiários e operadores de planos de saúde nos casos em que já existe processo em andamento". Ações judiciais que tramitam nas varas cíveis centrais e na Vara do Juizado Especial poderão ser encaminhadas ao posto para a tentativa de conciliação, segundo o tribunal.
Para o Grupo de Estudos sobre Planos de Saúde, formado por pesquisadores da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) que estudam a judicialização na saúde, o posto "será um ambiente privilegiado das operadoras dentro do tribunal, podendo servir para influenciar decisões, retardar o trâmite de ações judiciais e tornar-se uma instância de defesa prévia dos planos de saúde, comprometendo a esperada imparcialidade do Poder Judiciário".
O grupo pediu ao TJ-SP que reveja o acordo ou "garanta, em iguais condições, a participação de órgãos que representem os cidadãos e consumidores, levando equilíbrio de forças às negociações e intermediações pretendidas".
A advogada Ana Carolina Navarrete, coordenadora do programa de saúde do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), também defende que haja maior equilíbrio na representação do serviço. "A gente fica um pouco apreensivo porque parece muito dificil não haver conflito de interesse em um espaço como esse. A recomendação é que haja paridade e que o posto tenha um representante de entidades de defesa do consumidor", destaca.
Para a advogada especialista em direito à saúde Renata Vilhena, do escritório Vilhena Silva Advogados, a iniciativa pode prejudicar o consumidor. “Vai acabar retardando o andamento dos processos, porque o consumidor vai ser direcionado para este centro, que fará uma defesa da operadora, e o usuário vai ter o problema dele cada vez mais atrasado", diz ela.
Questionado sobre um possível conflito de interesse, o TJ-SP afirmou que qualquer conciliação será acompanhada por núcleo especializado em mediação do tribunal, com a coordenação de um mediador independente, “exigindo-se qualidade na atividade: presença de prepostos aptos a transigir, com autonomia e poderes amplos de representação”.
A Abramge diz apoiar qualquer iniciativa que viabilize conciliações, “contribuindo para rápida solução de demandas processuais”. A entidade ressaltou ainda que os processos serão aferidos por mediador do TJ-SP.
Iniciativa similar criada em 2015 acabou extinta
Em 2015, o TJ-SP também havia sido alvo de polêmica ao criar um núcleo com estrutura similar à do posto recém-inaugurado. Na ocasião, o tribunal fez uma parceria com representantes das operadoras de saúde e com a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) para implantar o núcleo de apoio técnico e de mediação (NAT).
A crítica da época era similar: entidades de defesa do consumidor reclamavam da ausência de representantes dos beneficiários de planos no núcleo. Com a polêmica, a iniciativa não deslanchou e acabou extinta. De acordo com o TJ-SP, a extinção se deu porque o NAT "teve pouca funcionalidade nos moldes em que foi estruturado".
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