Transplante capilar: como técnica evoluiu, quanto custa e quais os resultados?

Novas técnicas oferecem soluções mais naturais e sem cicatriz aparente, mas procedimentos não são eficazes para todos e é preciso alinhar as expectativas

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Por Danilo Casaletti
Atualização:

Em relação à calvície, talvez uma frase tão consoladora quanto à trazida pela antiga marchinha de carnaval que dizia “é dos carecas que elas gostam mais” seja a de que, atualmente, “só fica careca quem quer”. Isso, no entanto, é relativo. É verdade que as cirurgias de transplante capilar – método que existe desde a década de 1950 – avançaram bastante a partir do início dos anos 2000. A grande revolução foi a técnica FUE (Follicular Unit Extraction), que ao retirar e transplantar fio por fio (ou unidade folicular que pode ter de um a quatro fios), oferece resultados mais favoráveis e naturais. O chamado “cabelo de boneca” ficou no passado.

A técnica FUE também não deixa cicatriz ostensiva – elas são puntiformes – diferentemente da técnica FUT, popularizada nos anos 1990, na qual um pedaço do couro cabeludo é retirado para ser transplantado para a área afetada pela calvície. O método, ainda utilizado, deixa uma cicatriz linear na parte posterior do couro cabeludo.

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Porém, mais do que se animar com o antes e depois de um amigo ou artista - como o cantor Lucas Lucco, que também fez um transplante capilar com a técnica FUE há alguns anos-, é preciso passar por uma rigorosa avaliação feita por um cirurgião especialista na área. Um bom profissional precisa levar em conta a região afetada e a área doadora disponível. É essa conta que precisa fechar – e ela é diferente de caso a caso. Há casos de indivíduos com 25 anos, já bastante calvos, que não têm área doadora suficiente para um resultado satisfatório.

O cirurgião Mauro Speranzini, com mais de 30 anos de experiência na área, diz que em um transplante de cabelo, obrigatoriamente, não existe uma reparação da densidade normal. Ele compara a área doadora, aquela ainda preservada, a uma floresta. Se você tirar 10 % dela, ela continua cheia. Se tirar de 20% a 40%, ela ainda continua com muitas árvores. Ao ultrapassar essa quantidade, em torno de 50% a 60%, começava haver uma rarefação.

“A área doadora vai se esgotando. Não existe cabelo à vontade. Em uma grande calvície, perde-se de 70% a 80% dos fios. O que sobra, é 20% a 30%. Se você retirar metade disso (para o transplante), terá 15% para cobrir uma área que um dia teve 70%”, explica. Ou seja: retira-se uma parte de pouco para preencher muito. De qualquer forma, diz o cirurgião, de maneira realista, isso é o suficiente para um bom resultado.

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Como é o resultado do transplante capilar?

O jornalista Maurício Gonçalves Dias, 53 anos, fez o transplante há pouco mais de um ano. Ele percebeu que o cabelo começou a rarear depois dos 40 anos de idade. Especializado em eventos, ele diz que mudou o comportamento pessoal e profissional por conta das entradas e da coroa causadas pela queda de cabelo. Passou a fugir de fotos e vídeos.

Mauricio Gonçalves fez o transplante capilar e celebra os resultados: 'O que eu queria era ter uma melhora significativa. E tive" Foto: Tiago Queiroz/Estadão

Paciente de Speranzini, ele disse que o médico fez um alinhamento de sua expectativa. “Ele me avisou que minha área doadora não era mais do que ‘boa’. O que eu queria era ter uma melhora significativa. E isso eu tive”, diz Maurício. Ele afirma que passou por outras clínicas e ouviu grandes promessas. “Há um encantamento perigoso”, alerta.

Outro fator importante que precisa ser observado: a alopecia androgenética, a principal causa que leva os pacientes a procurarem o transplante capilar, é progressiva. Ou seja, um paciente que faz um transplante aos 30, 35 anos poderá, depois de 10 ou 15 anos, sofrer novamente com a queda de cabelo, sobretudo se ela não continuar a ser tratada clinicamente após a cirurgia.

Os fios transplantados tendem a não cair, mas os que estão na região atingida pela calvície podem, sim, cair. E, nesse caso, será preciso uma nova cirurgia. Se a área doadora já estiver esgotada, não haverá o que fazer. Até pode-se retirar pelos de outras áreas do corpo, como barba, peito ou braço, mas não nascerá cabelo e sim um pelo com a característica de onde for retirado.

Reduzir a perda das unidades foliculares durante a cirurgia é igualmente fundamental. De acordo com Speranzini, em casos favoráveis e bem realizados esse desperdício é de cerca de 2% a 3%. Em uma cirurgia mal realizada, a perda gira em torno de 30% a 70%.

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“A cirurgia é um planejamento a longo prazo. Não se gasta toda a munição de uma guerra em uma primeira batalha. E é o que está acontecendo. Os profissionais despreparados, para ter um grande resultado de imediato desperdiçam os fios. O paciente precisa de uma cirurgia de alta taxa de sucesso para não ter apenas um bom resultado hoje, mas daqui a 10 ou 15 anos”, diz Speranzini.

O médico dá um exemplo do que seria um transplante mal-sucedido. “A área doadora tem, em média, 12 mil fios de cabelo. Se o cirurgião tira 10 mil fios de uma pessoa jovem, e apenas 7 mil nascerem, ele perdeu 30% da retirada que fez. Ou seja, essa cirurgia foi um desastre. O aparente ótimo resultado só serve para aquele momento.”

Para quem começar a perceber os primeiros sinais de calvície – o início se revela com o afinamento dos fios, antes da queda – a recomendação é procurar um tratamento clínico, que deve ser permanente, com loções de uso tópico, comprimidos, vitaminas e métodos utilizados em consultórios, como o laser, o led e o microagulhamento com medicação no couro cabeludo. Sempre associados. Isoladamente, nenhum método produz resultados eficazes.

Mulheres podem fazer transplante capilar?

Entre as mulheres, a queda de cabelo também está, na maioria dos casos, associada à alopecia androgenética. A calvície pode acometer até 80% dos homens, e, nas mulheres essa porcentagem é de 50%.

Dados da divulgados em abril pela International Society of Hair Restoration Surgery (ISHRS) mostram que, em 2021, 87,3% dos procedimentos cirúrgicos foram realizados em homens e 12,7% foram realizados em mulheres. Em tratamentos não cirúrgicos os homens também são maioria, sendo 62,5% contra 37,5%.

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Segundo o cirurgião Diorivano Custódio Júnior, a calvície feminina geralmente começa com o alargamento da risca central do cabelo, diferente dos homens, que apresentam as entradas e a coroa. Para elas, o transplante capilar também é uma das soluções.

Soraia Gallo, de 32 anos, fez o transplante capilar e dividiu sua experiência nas redes sociais Foto: Daniel Teixeira/Estadão

“A maioria das mulheres não deseja raspar o cabelo para o procedimento. Ou não raspamos nada do couro cabelo e fazemos com o fio comprido ou raspamos uma pequena área central da parte de trás. Desse modo, ela consegue soltar o cabelo e disfarçar a área raspada. Na parte de cima, pode-se colocar entre os fios, igualmente sem raspar”, explica Custódio Júnior.

A relações públicas Soraia Gallo, 32 anos, começou a ter queda de cabelo há pouco mais de dois anos, após passar por um trauma emocional. A primeira providência foi procurar um dermatologista para iniciar o tratamento com medicamentos tópicos e oral. Ela também tentou aplicações de PRP (plasma rico em plaquetas), uma superdose de plaquetas, feita a partir do sangue colhido do paciente. Após dois anos, ela conta, o resultado desses tratamentos era insatisfatório. O cabelo ainda apresentava falhas, sobretudo na região frontal. Foi então que ela decidiu se informar sobre o transplante capilar.

“Foi uma busca muito delicada. É muito difícil você ver mulheres falando sobre transplante. Parece haver uma vergonha admitir que elas têm problemas capilares. O que é muito estranho, porque todo mundo fala de botox, preenchimento e lipoaspiração de maneira natural. O transplante é mais um procedimento estético disponível”, diz.

Soraia também teve dificuldade em encontrar um médico que tivesse feito o transplante em mulheres. Ela se consultou com seis cirurgiões antes de escolher quem faria o procedimento, já que sentia insegurança por parte dos profissionais.

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Soraia realizou o procedimento com o médico Custódio Jr, que transplantou sete mil fios em sua cabeça. Depois de três meses, ela já nota os cabelos definitivos nascerem, sobretudo na imagem da câmera do notebook, ao participar de reuniões de trabalho.

A expectativa, agora, é sobre como o cabelo vai ficar. Para ajudar outras mulheres, mesmo antes do transplante, quando decidiu raspar os cabelos, ela passou a contar sua experiência em um perfil no Instagram (@meulookcareca) justamente para quebrar o tabu em torno da calvície feminina.

Custódio Júnior diz que o resultado final da cirurgia, em homens e mulheres, ocorre de 10 a 12 meses após o procedimento. “Para as mulheres, que usam cabelo mais longo, o resultado pode demorar mais de um ano. O cabelo cresce 1 cm por mês. Para ele chegar a ficar mais longo, leva por volta de dois anos”, diz.

O cirurgião Mauro Speranzini é mais cético em relação aos resultados nas mulheres. “A mulher quer ficar cabeluda novamente. E ela não vai ficar. Mulheres só serão boas candidatas se tiverem uma calvície pequena e uma boa preservação de área doadora. Caso contrário, melhor não fazer a cirurgia.”

Quais os riscos de fazer transplante capilar?

Nos últimos dez anos, o transplante capilar se popularizou no Brasil. No entanto, a Associação Brasileira de Cirurgia da Restauração Capilar (ABCRC), criada em 2003, não tem dados consolidados sobre os números de cirurgias no Brasil. Baseado em números da International Society of Hair Restoration Surgery, o dermatologista e cirurugião Francisco Le Voci, presidente da ABCRC, estima que foram realizados no Brasil, em 2021, cerca de 25 mil transplantes, frente a 630 mil no mundo.

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Embora haja relatos de que profissionais não autorizados, como esteticistas, enfermeiros e tatuadores, estejam realizando o procedimento, apenas dermatologistas e cirurgiões plásticos podem realizar transplantes com segurança. “É uma cirurgia e deve ser realizada por médicos com instrumentadores preparados para auxiliá-los. É obrigatório ter um médico responsável que deve realizar o procedimento”, diz Le Voci.

O cirurgião Mauro Speranzini realiza o transplante capilar: 'A cirurgia é um procedimento a longo prazo' Foto: Tiago Queiroz/Estadão

A recuperação, sobretudo na técnica FUE, é mais rápida. O cirurgião Mauro Speranzini diz que libera seus pacientes para praticarem esportes dois dias após a cirurgia. É preciso evitar piscina por duas semanas e não tomar sol por um mês. A dor, que pode permanecer na área doadora por até um mês, pode ser tratada com analgésicos.

A anestesia costuma ser local, no local de retirada e de implante dos fios, acompanhada de uma leve sedação oral. O dermatologista Diorivano Custódio Júnior prefere fazer o transplante em um ambiente hospitalar. Ele trabalha com uma equipe de anestesistas que ministram uma sedação semelhante à usada para o exame de endoscopia.

O pré-operatório deve ser acompanhado por um cardiologista. Não há limite de idade. O fator limitante seria a saúde do paciente. “Pacientes com problemas de coagulação, cicatrização e cardíacos sérios precisam de uma avaliação mais aprofundada”, explica Le Voci.

Pessoas que sofreram queimaduras e escalpelamentos ou lesões causadas por tumores também podem se favorecer de um transplante. Para alopecia areata, doença inflamatória que provoca a queda de cabelo, a cirurgia não é indicada.

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Novas pesquisas

A medicina segue em busca de soluções para a calvície. As mais recentes pesquisas, de acordo com Francisco Le Voci, se concentram em dois principais eixos. Um deles é a cultura de células do folículo piloso, responsável pela produção e crescimento do cabelo. Com isso, seria possível clonar essas células, favorecendo assim indivíduos com limitações da área doadora.

Outra perspectiva é o uso de células-tronco para regenerar as células do folículo piloso que já não produzem mais cabelo. “Isso ainda está em estudo. Quem atualmente fala que usa células-tronco no tratamento da calvície não está dizendo a verdade”, alerta Le Voci.

O cirurgião Mauro Speranzini acredita na evolução de robôs, usados desde 2010 para retirada dos pelos, mas ainda com atuação limitada, sobretudo para cabelos mais crespos e fios de barba. A tecnologia também permite menos desgaste dos profissionais, devido ao longo tempo da cirurgia.

O médico também cita os avanços na melhora da medicação para diminuir a queda e engrossar o cabelo, ou seja, o tratamento clínico, o que tornaria o transplante um procedimento de menor volume. É preciso esclarecer que atualmente não há nenhum medicamento que faça nascer cabelo.

O transplante intervivos, ou seja, a doação de cabelo de uma pessoa para a outra não é um caminho, segundo Speranzini. “Esse tipo de doação implicaria no uso de drogas imunossupressoras. Elas têm efeitos colaterais e seu uso só se justifica se a pessoa corre risco de vida.”

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Antes de fazer o transplante capilar, fique atento

A hora certa

Converse com seu dermatologista sobre o tratamento clínico antes de optar pelo transplante. Pode não ser o momento ideal para a cirurgia.

Segurança

Só um médico cirurgião está habilitado a fazer o transplante. Se o procedimento for realizado fora de um hospital, verifique se a clínica oferece profissionais e equipamentos para lidar com uma possível intercorrência.

Expectativas

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Não acredite em milagres, mas sim no que é possível fazer no seu caso. O transplante nem sempre é o ponto final da calvície. Pode ser preciso continuar a tratá-la.

Área doadora

Converse com o médico sobre a disponibilidade de sua área doadora. Ela é variável de pessoa para pessoa

Quanto custa a cirurgia de transplante capilar?

O transplante pode custar de R$ 20 mil a R$ 60 mil. A cirurgia dura de 6 a 10 horas.

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