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Varíola dos macacos não é mais uma emergência internacional de saúde, diz OMS

Surto completou um ano em maio; foram registrados 87 mil casos e 140 mortes; organização mudou status da pandemia de covid há uma semana

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Foto do author Leon Ferrari
Atualização:

A Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou nesta quarta-feira, 11, que o surto da varíola dos macacos também não é mais uma emergência de saúde pública (PHEIC), uma semana após mudar o status para a pandemia da covid-19. O alerta havia sido feito em julho do ano passado diante do registro das primeiras infecções fora da África.

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“Quase 90% menos casos foram relatados nos últimos três meses em comparação com os três meses anteriores”, falou Tedros Adhanom, diretor da OMS. “No entanto, como na covid, não significa que o trabalho acabou. Mpox continua a representar desafios significativos à saúde pública que precisam de resposta robusta, proativa e sustentável, enquanto celebramos a tendência de queda globalmente.”

A emergência foi declarada por ser a primeira vez em que muitos casos foram relatados simultaneamente fora da África Ocidental ou Central, de onde a doença é endêmica. Do fim de abril do ano passado até esta terça, 9, foram registradas 87.337 infecções e 140 mortes em 111 países, conforme o painel de dados da OMS.

Segundo a organização, o Brasil foi um dos países mais afetados, com10.920 casos, atrás somente dos Estados Unidos, com 30.154. De todas as infecções, 16 evoluíram resultaram em morte. O Brasil teve 12,5% de todas as notificações da infecção

No último relatório sobre a doença, publicado neste quinta, 11, a OMS destacou que as curvas epidêmicas sugerem que o surto continua com baixos níveis de transmissão nas regiões da Europa e das Américas (da qual Brasil faz parte), e aumenta na região do Pacífico Ocidental, com relatos de casos do Japão, China e Coreia do Sul.

Desde o último boletim, em 27 de abril, houve 264 novos casos (alta de 0,3%) e 10 novas mortes relatadas - o total de casos pode ter sido influenciado por atraso na notificação, de acordo com a OMS.

Profissional de saúde faz teste para a varíola dos macacos. Foto: Lukas Barth/Reuters

Preocupações

Embora haja declínio de casos, ainda há transmissão e surtos menores em alguns países, destacou Nicola Low, epidemiologista integrante do comitê de emergência da OMS para a monkeypox. “Há incerteza sobre a probabilidade de um ressurgimento grande da infecções.”

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A OMS mostrou particular preocupação com pessoas que vivem com HIV, o vírus da Aids, não tratado. “É extremamente importante protegermos os vulneráveis, imunocomprometidos, particularmente, neste caso, quem vive com HIV não tratado ou não controlado. Eles correm maior risco de doença grave e, quando não são capazes de eliminar o vírus, é possível que a mpox continue evoluindo”, alertou Rosamund Lewis, líder técnica de combate à varíola dos macacos da OMS.

Como a doença é transmitida?

A varíola dos macacos é causada pelo vírus monkeypox, do gênero Orthopoxvirus, da família Poxviridae, da qual faz parte o causador da varíola humana. Apesar do nome, os macacos não são reservatórios do vírus da varíola e responsáveis pela transmissão aos humanos. Eles foram só os primeiros animais nos quais, em 1958, o vírus foi encontrado. O reservatório é, em certa medida, desconhecido, com os principais “candidatos” sendo roedores, antílopes, gazelas ou esquilos.

Sob o argumento de combater a “linguagem racista e estigmatizante” e ser mais cientificamente adequado, a OMS passou a chamar a doença de mpox no surto atual.

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O sinal mais comum e visível da mpox durante este surto foram erupções cutâneas (pústulas), que podiam aparecer na face, palmas das mãos, planta dos pés, virilha, região genital, região anal, boca, garganta, ânus, vagina e olhos. Elas podiam ser precedidas por febre, dor de cabeça, dores musculares, dores nas costas, baixa energia e gânglios linfáticos inchados.

A doença apresentou quadro clínico diferente, mais brando do que ocorria na África, segundo a virologista brasileira Clarissa Damaso, do Laboratório de Biologia Molecular de Vírus da Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), que integra o Comitê de Emergência que orientou Tedros Adhanom, diretor da OMS, a declarar a emergência e, agora, decretar o fim dela.

“Na África, a maioria dos casos a doença causava pústulas pelo corpo todo, muito similar à varíola humana. Tirando os casos em que tinha lesão genital e perianal, muitos casos eram poucas lesões no corpo, muito espaçadas tem, paciente que só teve uma lesão”, afirmou ela ao Estadão.

“Esse foi um dos motivos que levou até a aumentar a transmissão, porque a pessoa não se sentia mal e ela não estava com um corpo com muitas pústulas”, continua. Isso também contribuiu para a subnotificação de casos.

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Homens que fazem sexo com homens

O surto afetou, principalmente, um grupo bastante específico, homens que fazem sexo com homens (HSH) e que relatavam ter múltiplos parceiros. Eles representaram oito de cada dez casos (84.1%) conhecidos no mundo. Embora o “perfil” das infecções tenha sido majoritariamente de homens, foram registrados casos em mulheres e crianças.

O medo de não cometer os mesmos erros do combate da Aids - doença causada pelo HIV a partir dos anos 1980, que acabou por estigmatizar a comunidade LGBT - marcou o surto de varíola dos macacos, principalmente no início. Isso, para Clarissa, atrapalhou o enfrentamento do problema.

“No começo, o receio de não comentar e não alertar foi pior. Foi o que aconteceu, por exemplo, quando tivemos a Parada LGBT em São Paulo. Conseguiu-se fazer muito pouco alerta e houve explosão do número de casos depois”, avalia. “Não fazer o alerta não deixa também de ser uma forma de discriminar.”

Vacinas e remédios

O surto também foi marcado pela baixa disponibilidade e má distribuição de remédios antivirais e vacinas. Só havia um fabricante para o imunizante, uma “empresa muito pequena”, pois o objetivo dele, antes do surto, era de biodefesa. Ou seja, não era pensado para aplicação na população em geral. “A vacina era feita mediante compra de países que investem em programas de biodefesa. Não dá para escalar uma produção de vacina de uma hora para outra.”

Na visão da especialista, a má distribuição - países como Estados Unidos ficaram com o maior número das doses - mostra o que não aprendemos na pandemia da covid O Brasil recebeu a primeira remessa da vacina Jynneos/Imvanex em outubro. Mas, foi só em março deste ano, que o Ministério da Saúde deu início à campanha de vacinação contra a doença para grupos específicos, frente á quantidade limitada de doses.

O antiviral tecovirimat chegou um pouco antes ao País, em agosto. Também diante da limitação de lotes, foi destinado aos casos mais graves da doença.

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