Com surtos confirmados do vírus de Marburg, da mesma família do Ebola e um dos mais letais do mundo, é normal que haja quem se pergunte e se preocupe com a disseminação dele e se pode haver reflexos no Brasil. Com as atuais informações sobre o vírus, especialistas não esperam que ele se torne uma pandemia, mas casos fora da Guiné Equatorial e da Tanzânia podem ser registrados.
Veja o que já se sabe sobre o vírus e o surto atual:
Onde o surto foi confirmado?
Um surto foi confirmado na Guiné Equatorial e na Tanzânia, ambos na África.
O surto na região é uma surpresa?
Os dois países ficam numa região onde há reservatórios animais do vírus. Por isso, especialistas não ficaram surpresos com a confirmação do surto.
Por que o vírus é considerado tão grave?
A doença de Marburg causa febre hemorrágica, com taxa de letalidade de até 88%, de acordo com a OMS, o que faz dele um dos vírus mais mortais do mundo. O quadro começa abruptamente, com febre alta, dor de cabeça e mal-estar intensos. Muitos pacientes desenvolvem sintomas hemorrágicos graves dentro de sete dias.
Alexandre Naime Barbosa, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), explica que a gravidade do quadro é explicada pelo “órgão-alvo” do vírus. “Ele afeta principalmente as células do sistema circulatório endotelial. Ele acaba prejudicando a permeabilidade dos vasos das células que revestem o sistema circulatório. Isso faz com que haja hemorragia.”
Quais são os sintomas da doença?
Segundo Barbosa, o quadro de febre hemorrágica causado pelo vírus é bastante semelhante ao que ocorre no Ebola. “A pessoa começa com febre repentina e muito alta. Manchas pelo corpo. Pode ter sangramento em mucosas e também sangramentos ou hemorragias internas. É uma doença que geralmente leva ao que a gente chama de choque séptico e a óbito.”
Quando e onde a doença foi detectada pela primeira vez?
O vírus raro foi identificado pela primeira vez em 1967, quando causou surtos simultâneos da doença em laboratórios em Marburg (Alemanha) e Belgrado (Sérvia). Sete pessoas morreram expostas ao vírus enquanto realizavam pesquisas com macacos.
Em 2004, um surto na Angola matou 90% das 252 pessoas infectadas. No ano passado, foram registradas duas mortes em Gana.
Há tratamento ou vacina contra o vírus?
Não. Segundo a OMS, porém, cuidados de suporte – reidratação com fluidos orais ou intravenosos – e tratamento de sintomas específicos melhoram a sobrevida do paciente.
A agência internacional também destaca que “uma variedade de tratamentos potenciais, incluindo produtos sanguíneos, terapias imunológicas e terapias medicamentosas, bem como vacinas candidatas com dados da fase 1, estão sendo avaliadas”.
Frente aos nove óbitos confirmados, a OMS anunciou na terça, 14, uma reunião de emergência do consórcio denominado Marvac, que promove a colaboração internacional para o desenvolvimento de vacinas contra o vírus de Marburg.
Qual a chance de o vírus chegar ao Brasil?
Em nota, Matshidiso Moeti, diretor regional da OMS na África, destacou que o vírus é “altamente infeccioso”. “Graças à ação rápida e decisiva das autoridades da Guiné Equatorial na confirmação da doença, a resposta de emergência pode atingir todo o vapor rapidamente para salvarmos vidas e determos o vírus o mais rápido possível.”
Especialistas ouvidos pelo Estadão destacam que, com o conhecimento que se tem até hoje sobre o Marburg, a “exportação” de casos para outros países até pode ocorrer, mas uma disseminação tamanha, que resulte na configuração de uma outra pandemia, por exemplo, é pouco provável.
A letalidade elevada ajuda a explicar isso. “Se a gente pegar um indivíduo, por exemplo, infectado na África e que rompesse essa barreira epidemiológica que já foi instalada, e viesse ao Brasil ou para outro país, a manifestação do sintoma é tão rápida que provavelmente esse indivíduo evoluiria pra um quadro grave e de óbito antes de chegar no território. Então a gente trabalha aí com uma característica viral muito diferente do SARS-CoV (vírus causador da covid)”, diz Joziana Barçante, coordenadora do Núcleo de Pesquisa Biomédica e professora do Departamento de Medicina da Universidade Federal de Lavras (UFLA).
“Quando a gente pensa nesse vírus de elevada infecciosidade, uma transmissão muito alta e uma letalidade muito alta, quando você consegue implementar medidas de vigilância epidemiológica e controle ali naquele surto identificado, consegue conter isso, evitando a dispersão viral como aconteceu com o Sars-CoV. E (desta vez) a OMS entrou muito rapidamente no auxílio com relação a esse enfrentamento a esse surto que aconteceu, então isso faz com que você consiga controlar mais facilmente as fronteiras, evitando essa disseminação”, afirma.
O controle também é mais fácil, de acordo com Barbosa, porque casos assintomáticos são raros.
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