Você devia dar mais valor aos probióticos. Saiba o porquê

Eles nada mais são do que bactérias boas, e ajudam a manter a microbiota intestinal em equilíbrio, o que pode repercutir no corpo inteiro

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Foto do author Ana Lourenço
Atualização:

Na área do intestino existe um universo inteiro que faz com que a sua saúde continue em dia. Não à toa, a região vem sendo alvo de estudos sob diversos aspectos, desde o tratamento de alergias e ansiedade até a manutenção do sistema imunológico.

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“O intestino funciona independentemente dos comandos do cérebro. Você não deve pensar para, por exemplo, mover a comida do estômago para o intestino delgado. Portanto, há muitos complexos neurológicos que regulam o funcionamento diário do órgão”, comenta Arthur Ouwehand, cientista PhD em Microbiologia pela Universidade de Gotemburgo, na Suécia, e parceiro técnico da IFF (previamente Danisco/DuPont), na Finlândia.

Já reparou também nas “borboletas na barriga” que aparecem antes de fazermos algo empolgante? Ou na vontade quase incontrolável de ir ao banheiro diante de um momento desafiador? Todos esses acontecimentos ajudam a explicar por que o intestino é considerado o nosso segundo cérebro. Faz sentido: ele abriga um monte de neurônios.

Embora o intestino tenha autonomia, a relação com a massa cinzenta é íntima. Tanto que, na ciência, fala-se até em eixo intestino-cérebro. Para ter ideia, cerca de 90% da nossa serotonina, o hormônio do bem-estar, é produzida na região intestinal. E ela vai interferir lá no sistema nervoso, regulando o humor.

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Mas não para por aí. “Temos que pensar em um triângulo: o cérebro, o intestino, e também os micro-organismos, que interferem em ambos os órgãos”, conta Ouwehand. Pois é: ainda há uma população de bactérias na área. O número chega perto dos 100 trilhões. Todas fazem parte do que se define como microbiota intestinal (antes conhecida como flora).

Apesar de não parecer, esse verdadeiro universo paralelo fica acomodado em um amplo espaço. Se pudéssemos esticar os dois trechos do intestino, tanto o delgado quanto o grosso, teríamos uma área de 250 m², o equivalente a uma quadra de tênis.

Voltando às bactérias: de imediato, imaginar essa quantidade imensa de micro-organismos vivendo dentro da gente pode soar estranho, e até ruim. Mas a verdade é que, dependendo do tipo de bactéria vivendo ali, a saúde como um todo sai ganhando. Nesse sentido, para garantir uma população de micróbios do bem, é importante conhecer o conceito de probióticos.

O que são os probióticos e para que servem?

A definição exata é a de micro-organismos vivos que, quando administrados em quantidades adequadas, trazem benefícios à saúde dos hospedeiros. Quando há uma diversidade de bactérias boas povoando a microbiota, os reflexos positivos podem aparecer em vários cantos do corpo, da pele ao sistema cardiovascular.

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“Para entender isso, podemos pensar em florestas. Se elas foram constituídas por apenas um tipo de árvore, não é bom, porque não há resiliência. O mesmo acontece em seu intestino. Portanto, se você tiver micro-organismos variados, eles podem fazer muitas funções diferentes, e isso é benéfico”, afirma Ouwehand.

Mas há o risco de encararmos uma disbiose, isto é, um desequilíbrio entre as bactérias boas e as ruins – com essas últimas predominando. Aí, os resultados podem ser constipação, diarreia, imunidade baixa e até reações na pele. Uma microbiota desajustada também é associada a problemas como diabetes, obesidade e úlceras gástricas. Algumas situações podem favorecer a disbiose, como o estresse ou uma alimentação pouco saudável. Para povoar essa microbiota com exemplares do bem, entram em cena, portanto, os probióticos.

Probióticos são micróbios vivos que, quando administrados e em quantidades adequadas, trazem benefícios à saúde dos hospedeiros. Foto: Pch.Vector

“Incorporar preferencialmente alimentos contendo probióticos na dieta pode ser uma estratégia eficaz para a manutenção da saúde. Entre outras coisas, eles podem ajudar a restaurar a microbiota intestinal”, resume Dan L. Waitzberg, médico nutrólogo, professor associado do Departamento de Gastroenterologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) e diretor do Ganep Nutrição Humana. Ainda há a possibilidade de contar com suplementos de probióticos.

De acordo com ele, alguns benefícios dos probióticos já estão bem estabelecidos:

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  • Na saúde digestiva, especialmente quando se fala em síndrome do intestino irritável, doença inflamatória, intestinal e diarreia associada ao uso de antibióticos
  • No sistema imunológico, com o aumento da resistência frente a infecções e outros problemas
  • Na saúde mental, com redução de sintomas de ansiedade e depressão, além de melhora da função cognitiva
  • Na saúde do coração, com a diminuição do colesterol LDL (ruim) e da pressão arterial
  • No controle de alergias

Mas, quando citamos os probióticos, é importante destacar que cada bactéria tem determinadas funções no corpo. Na prática, significa que, enquanto algumas cepas têm impacto mais direto na saúde digestiva, ajudando contra a constipação, por exemplo, outras podem ter mais afinidade com o sistema imunológico. Além disso, é preciso contar com uma quantidade mínima para notar um efeito no corpo. Por fim, a ingestão precisa ser frequente e é necessário construir condições adequadas para que esses micro-organismos sobrevivam e se proliferem.

“A quantidade de probióticos necessária para um efeito benéfico pode variar de acordo com o tipo de cepa e a condição de saúde apresentada. Em geral, a maioria dos estudos clínicos usa doses na faixa de 1 bilhão a 10 bilhões de unidades formadoras de colônias (UFC) por dia. No entanto, algumas condições podem exigir doses mais elevadas, na faixa de 50 bilhões a 1 trilhão de UFC/dia”, ensina o médico.

Embora o iogurte seja fermentado por bactérias, nem todo produto desse tipo é considerado probiótico. Tem que olhar o rótulo. Foto: Micheile Henderson/Unsplash

Quais alimentos são ricos em probióticos?

Probióticos podem ser encontrados em alguns alimentos, especialmente os fermentados. Os exemplos incluem iogurtes, leite fermentado, kefir, chucrute, tempeh, kombucha, missô, kimchi e alguns queijos. Mas vale ressaltar que, no caso dos iogurtes, nem todo produto é considerado probiótico – isso porque, para ganhar essa classificação, as bactérias precisam sobreviver à acidez do estômago e chegar inteiras no intestino. Por isso, tem que ficar atento ao rótulo.

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Como mencionamos, ainda há a opção de contar com suplementos, vendidos em forma de cápsulas e sachês, por exemplo. “Os suplementos probióticos podem ser úteis para indivíduos com necessidades específicas. Mas, antes de iniciar qualquer suplementação, é aconselhável consultar um profissional de saúde, que poderá fornecer orientação de maneira individualizada”, indica Waitzberg.

Ele também alerta para os perigos ligados ao excesso de probióticos. “Uma maior quantidade não é necessariamente melhor. Uma superdosagem pode causar efeitos adversos, como distensão abdominal, cólicas, gases e desconforto digestivo”, relata.

Quem precisa tomar probiótico?

Qualquer pessoa pode ingerir probióticos: desde adultos saudáveis até aqueles com algum tipo de doença. Mas o ideal é investir no consumo dos alimentos que concentrem as bactérias benéficas, e não no uso de suplementos (em cápsulas ou sachês). Embora qualquer um possa comprar esses produtos em farmácias, o correto, para quem preferir essa opção, é ter uma indicação médica.

É fundamental consultar profissional de saúde para ter orientações personalizadas antes de consumir suplementos probióticos Foto: Nastya Dulhiier/Unsplash

Afinal, cada pessoa apresenta uma microbiota intestinal única. Assim, a automedicação pode agravar eventuais problemas caso o indivíduo não receba o probiótico certo, em uma dose específica e por um tempo determinado. A regulamentação desses produtos é feita pela Anvisa, que até criou um guia para ajudar na compreensão dos efeitos práticos de cada bactéria, focando na eficácia e segurança.

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É extremamente importante ficar atento em relação à conservação (indicada no produto alimentício ou no próprio suplemento). Como falamos de micro-organismos vivos, é essencial garantir sua sobrevivência até à chegada no intestino. Uma simples falha na refrigeração de um iogurte pode colocar tudo a perder. Fique de olho também na procedência: esses itens devem ser adquiridos de fontes confiáveis para garantir a qualidade e a segurança.

“Probióticos não são como drogas. Então, não é como tomar uma aspirina que, depois de alguns minutos, faz a dor passar. Com os probióticos, os efeitos levam algum tempo. Então, você tem que ter um pouco de paciência. Mas, normalmente, em uma ou duas semanas você deve se sentir diferente”, garante Ouwehand.

Em quais situações os probióticos podem ajudar?

Os estudos têm mostrado possibilidades diversas. Mas um dos efeitos mais consolidados têm a ver com a manutenção do sistema imunológico. “Se você der probióticos a pessoas saudáveis durante um período de inverno, elas tendem a apresentar muito menos infecções respiratórias. Percebe-se uma queda de 25 a 50%”, relata Ouwehand. O cientista costuma pensar no probiótico como um seguro. Apesar de não usarmos enquanto pagamos (ou, nesse caso, ingerimos), quando ele se fizer necessário, você ficará feliz por ter feito o investimento.

Já em casos mais complexos, como de doenças que exigem um tratamento mais agressivo, os probióticos são vistos como minimizadores de eventuais efeitos colaterais dos remédios. “Isso é muito importante, porque pode ser decisivo para a pessoa continuar realizando o tratamento”, informa.

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Consumo de probióticos é associado a uma melhora na imunidade. Foto: Divulgação

Há pesquisas indicando ainda uma melhora da saúde mental quando pacientes recebem certas cepas probióticas. Os benefícios incluem redução do estresse, da ansiedade e dos sintomas de depressão. “Esses probióticos são, muitas vezes, chamados de psicobióticos. Alguns alimentos fermentados e ricos em probióticos, como certos tipos de iogurte e kefir, podem conter essas bactérias benéficas” conta Waitzberg. Ele acrescenta que alguns suplementos também apresentam esses micro-organismos ligados à saúde mental.

Confira, abaixo, alguns exemplos de probióticos e suas funções:

  • Bifidobacterium longum e Lactobacillus helveticus: encontrados em suplementos, eles estão associados ao combate do estresse e da ansiedade
  • Lactobacillus casei e Lactobacillus rhamnosus: ajudam na imunidade e estão presentes em vários alimentos fermentados
  • Bifidobacterium longum e Lactobacillus acidophilus: são ligados à melhora da prisão de ventre e estão disponíveis em iogurtes e outros alimentos fermentados, além de suplementos
  • Lactobacillus paracasei e Lactobacillus fermentum: utilizados para tratamentos de pele, especialmente para quadros de dermatite atópica (eczema) e alergias. Podem ser usados via suplementos
  • Lactobacillus rhamnosus e Lactobacillus reuteri: auxiliam na prevenção de infecções por fungos e bactérias. São encontrados em suplementos

Cuidados devem ir além dos probióticos

Essas bactérias dão uma força para a saúde, mas, sozinhas, não fazem milagres. É essencial manter um olhar cuidadoso para a dieta como um todo (que deve ser rica em fibras provenientes de frutas, vegetais, grãos integrais e leguminosas) e para outros aspectos do estilo de vida, como sono e prática de exercícios. “Se você tem uma alimentação ruim, vive de refrigerantes e hambúrgueres, não comece a consumir probióticos. Não tente consertar algo que está tão quebrado com alguns probióticos. Isso não vai funcionar”, alerta Ouwehand.

Por falar em alimentação, é fundamental lembrar que os probióticos precisam de nutrientes para sobreviver – são os prebióticos. Eles são representados sobretudo pelas chamadas fibras dietéticas não digeríveis. Segundo Waitzberg, entre os alimentos prebióticos temos alho, cebola, aspargos, bananas, cevada, aveia, maçãs e as leguminosas, que incluem feijões, lentilha e grão-de-bico.

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“Também devemos evitar o uso desnecessário de antibióticos e controlar o estresse, já que esses dois fatores podem perturbar o equilíbrio da microbiota intestinal”, conclui Ouwehand.

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