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Gastos com ações de gestão ambiental do País despencam neste ano

Ações de planejamento de políticas do Ministério do Meio Ambiente receberam somente R$ 1 milhão neste ano; estratégias de controle de desmatamento tiveram menos de R$ 20 mil e o fundo sobre mudança do clima não teve nenhum empenho

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Atualização:

Nos primeiros oito meses de governo Bolsonaro, as ações de gestão da política ambiental do País praticamente pararam. Análise orçamentária do Ministério do Meio Ambiente (MMA) mostra que a administração direta reservou (empenhou), até o dia 6, R$ 1,17 milhão para as chamadas ações finalísticas - ou seja, os objetivos principais da pasta: planejamento de políticas e gerenciamento. Para comparação, no ano passado foram empenhados R$ 35,6 milhões para o mesmo fim.

Os dados obtidos pelo Estado são do Sistema Integrado de Planejamento e Orçamento (Siop), da Secretaria de Orçamento Federal. No início do ano, a pasta tinha um gasto autorizado para essas ações de R$ 25,2 milhões e sofreu um contingenciamento de R$ 15,5 milhões, mas ainda havia quase R$ 10 milhões disponíveis. Nesse ritmo, o ministério caminha para ter o menor valor empenhado para essas ações dos últimos quatro anos.

O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles. Crédito: Gilberto Soares/MMA 

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Procurado pela reportagem, o Ministério do Meio Ambiente informou que houve uma redução do orçamento de 25 milhões para 8 milhões. A" diferença de 17 milhões se refere a emendas coletivas que não se confirmaram", afirmou a pasta. Disse também que o "valor a ser empenhado até o final do ano está previsto nos editais que estarão concluídos e disponíveis em setembro e outubro" e que a "a execução neste exercício ficará próxima de 96%, como nos anos anteriores".

Também afirmou que "parte das despesas previstas foi convertida em recursos para a estrutura do Núcleo de Conciliação Ambiental e despesas de atividades de fiscalização e controle do Ibama". A pasta declarou ainda que em relação às despesas administrativas, "vem renegociando todos os valores dos contratos, desde o início do exercício."

Dentro do valor autorizado para as ações da pasta, estavam previstas 16 linhas de atuação, como políticas e estratégias de prevenção e controle do desmatamento; ações contra mudanças climáticas; e agenda ambiental urbana, entre outras.

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Apesar de a maior parte do orçamento do MMA ser alocada para suas autarquias - Ibama e ICMBio, que, juntos, têm quase R$ 400 milhões de verba autorizada neste ano para suas ações finalísticas -, é a administração direta que faz a formulação de políticas que esses órgãos vão depois executar.

Para especialistas que analisaram a execução do orçamento deste ano, isso indica uma paralisia de planejamento da pasta.

"O MMA é o órgão central do sistema ambiental, a quem cabe planejar, coordenar, supervisionar e controlar, por determinação legal, a política nacional do meio ambiente. Problemas no início da gestão são esperados, mas não a baixíssima execução nas ações finalísticas. Os recursos do MMA para suas próprias atividades não pesam tanto no orçamento federal, deveriam estar liberados e com a execução em dia", comenta Suely Araújo, que presidiu o Ibama durante o governo Temer.

Uma das ações previstas, as políticas e estratégias de prevenção e controle do desmatamento receberam até o momento R$ 19,1 mil - estavam autorizados para esse fim R$ 253 mil neste ano. Em 2018, essas ações tiveram um empenho de quase R$ 176 mil.

No início do ano, a secretaria do MMA que lidava com prevenção e controle do desmatamento praticamente deixou de existir. O setor que em tese passou a tratar desse tema - a Secretaria de Florestas e Desenvolvimento Sustentável - atualmente é comandado por um secretário substituto que acumula também o cargo de secretário de Qualidade Ambiental e tem seis cargos de chefia vagos.

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O controle do desmatamento na Amazônia não depende apenas dessa verba do ministério. A fiscalização é feita pelo Ibama. Mas era do Departamento de Florestas e Combate ao Desmatamento, que não existe mais, que vinham as diretrizes para lidar com o problema no País. "O Ibama cumpre as ordens que vêm das políticas feitas pelo ministério e isso praticamente não existiu nesse ano", comenta um técnico do Ibama em condição de anonimato.

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Também cabia ao setor apontar estratégias para desenvolver a chamada economia florestal - uma das bandeiras do ministro Ricardo Salles. Em entrevista ao Estado no final de agosto, ele defendeu, por exemplo, que é preciso "encontrar uma maneira inteligente de tratar a questão, que reconheça a importância da sustentabilidade, da conservação, do cuidado ambiental, mas dê dinamismo econômico em escala e em impacto suficiente para toda aquela população".

A análise do orçamento indica que o planejamento de estratégias de fomento para atividades produtivas na floresta foi paralisado. Além dos valores, relatos de servidores que trabalham no ministério também apontam para isso. O novo departamento, que agora é só de florestas (não tem mais o combate ao desmatamento no nome), ficou até julho sem um diretor. "O departamento acabou, o novo ficou meses sem secretário, e os recursos para ele não foram usados", resume um servidor ouvido em condição de anonimato.

Em relação aos valores do Ibama para o controle do desmatamento do Ibama, com o contingenciamento, ficaram disponíveis pouco mais de R$ 87 milhões para a fiscalização ambiental de todo o País, dos quais R$ 67 milhões já foram empenhados pela autarquia. No ano passado foram empregados nesta ação orçamentária do Ibama R$ 89 milhões.

Oficialmente, o desmatamento é considerado um problema mais amplo dentro do governo, sendo alvo de ações de 12 ministérios dentro do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm), mas esse plano também está parado. O único eixo ativo, de monitoramento e controle ambiental, com a atuação do Inpe e do Ibama, vem sofrendo duros ataques no atual governo.

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"O governo tem até o final do ano para fazer o empenho, mas essa baixa execução foi precedida da extinção do departamento que comandava o controle do desmatamento. Parece que a pasta perdeu a capacidade gerencial do problema", afirma João Paulo Capobianco, vice-presidente do Instituto Democracia e Sustentabilidade. Ele foi secretário de Biodiversidade e Florestas e secretário-executivo do ministério, durante a gestão de Marina Silva à frente da pasta (2003 a 2008).

"O governo ignorou alertas do Deter (do Inpe) e só aplicou 7,5% do pouco recurso que tinha até agora para políticas de desmatamento. Então a alta que estamos vendo no campo não pode ser considerada como um incidente. Só poderia dar nisso", complementa.

Sem ação contra mudanças climáticas

O empenho do Ministério do Meio Ambiente até agora foi zero em sete ações finais, como a de redução da vulnerabilidade aos efeitos da desertificação, da seca e das mudanças climáticas. A ação tinha um gasto autorizado de R$ 1 milhão.

Ainda nesta área, as iniciativas para a implementação da política nacional sobre mudança climática, que tinham recebido uma autorização de gasto de R$ 10,4 milhões - e sofreram um contingenciamento de R$ 9,9 milhões -, tiveram um empenho de R$ 122 mil.

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Logo no início do ano, o presidente Jair Bolsonaro, ao modificar o organograma de vários ministérios, extinguiu a área que cuidava no tema no ministério pelo decreto 9.672, de 2 de janeiro de 2019 - é a mesma secretaria que cuidava do controle do desmatamento. Salles prometeu criar uma assessoria especial para o tema no gabinete, o que ainda não ocorreu.

O MMA também deveria entregar neste ano um plano para implementar as metas brasileiras de redução de emissões de gases de efeito estufa estabelecidas no âmbito do Acordo de Paris, o que também não ocorreu ainda.

A questão climática foi afetada também no que se refere ao Fundo Nacional sobre Mudança Climática, uma unidade orçamentária própria dentro do ministério (ou seja, aparece à parte das ações finais). O fundo teve um aporte autorizado de R$ 8 milhões, mas nenhuma quantia foi empenhada neste ano.

Agenda urbana

Também considerada prioritária por Salles, a agenda ambiental urbana foi paralisada. Dos R$ 665 mil autorizados, foram empenhados, até dia 6, R$ 307,66. Dentro da agenda urbana há também baixo empenho no fomento à melhoria da qualidade ambiental - R$ 87 mil diante de uma verba autorizada de pouco mais de R$ 1 milhão.

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A Política Nacional de Resíduos Sólidos também teve pouco recurso. Haviam sido autorizados R$ 7,4 milhões. A ação sofreu um grande contingenciamento - de R$ 5,6 milhões - e, do R$ 1,7 milhão que restou, foi empenhados até o momento pouco mais de R$ 463 mil. Este foi o mais alto empenho das ações finais neste ano.

Por outro lado, foram empenhados R$ 46,4 milhões na administração da unidade, ou seja, basicamente os gastos administrativos, que não são nem as ações finais nem os salários dos servidores. É valor usado, por exemplo, para aluguel do prédio, segurança, terceirizados (como copeiros, faxineiros), reformas, conta de luz, material de escritório.

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