Vai viajar pela América do Sul? Veja como o El Niño ‘secou’ um dos maiores lagos do continente

Titicaca, no alto dos Andes, entre a Bolívia e o Peru, tem sofrido com as mudanças climáticas

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Por Redação

Pedro de la Cruz, de pé em seu barco cercado de lama, levanta as mãos para o céu e implora angustiado por chuva para o Lago Titicaca, no alto dos Andes, entre a Bolívia e o Peru. “Meu Deus, que venha a chuva. ‘Pachamama’ (divindade indígena), meu Deus, ajude-nos, por favor, estamos secando neste lugar, por favor.”

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O ex-funcionário público da Bolívia, nascido em Huarina, sobre o Lago Titicaca e a cerca de 77 quilômetros a oeste da capital La Paz, também exclama pedidos em aimará. “Chuva, Deus Pai, Pai do céu, tende piedade Deus Pai”, diz o homem, de 74 anos.

O nível das águas do Lago Titicaca, a mais de 3.807 metros acima do nível do mar, está hoje a 25 centímetros do mínimo histórico registrado em 1996, disse à agência AFP a chefe da Unidade de Previsão do Serviço Nacional de Hidrologia e Meteorologia do Peru (Senamhi), Lucia Walper.

Pedro de la Cruz levanta as mãos para o céu e implora angustiado por chuva para o lago Foto: Aizar Raldes/AFP - 10/08/23

Em Huarina e nas margens do lago, pode-se ver que onde antes havia água, agora há terra seca, pedras, lama e até mesmo o ocasional cais de madeira que se destaca. Agora, mesmo pequenos barcos encalham por lá.

O pescador Edwin Katari, 43 anos, conta com tristeza que a queda do nível da água faz com que os peixes não possam desovar nas margens, que agora estão “secas”. “Então, onde os peixes vão desovar?”, ele se pergunta.

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Previsão sombria

O Senamhi faz desde 1974 medições do nível em que se encontram as águas do Titicaca. O ponto mais alto foi registrado em 1986, quando elas atingiram 3.811,28 metros acima do nível do mar. Mas em 1996 desceram ao seu piso histórico, de 3.807,39 metros.

A hidróloga Lucia explica que esta diminuição “é resultado das alterações climáticas”, e que este comportamento negativo se mantém até os dias de hoje. As previsões são sombrias. “É muito provável que continue diminuindo até atingir níveis mais baixos”, diz ela.

Lago Titicaca está hoje a 25 centímetros do mínimo histórico registrado em 1996 Foto: Juan Karita/AP - 27/07/23

O Lago Titicaca, compartilhado pela Bolívia e pelo Peru, tem uma área de 8,3 mil quilômetros quadrados e é o terceiro maior da América do Sul, depois do Maracaibo, da Venezuela, e da Lagoa dos Patos (RS), no Brasil. Ainda não foi feita uma medição por satélite para saber o quanto foi reduzido.

La Niña e El Niño

O nível do Lago Titicaca “tem diminuído progressivamente devido a muitos fatores meteorológicos, hidrológicos e climáticos”, explica Lucia, que enfatiza que tem havido “menos chuva”.

“Ao longo dos anos, cada fenômeno, seja El Niño ou La Niña, vem apresentando uma distorção em seus parâmetros e fatores”, aponta. Ela aponta mudanças nas características desses eventos – associados a períodos chuvas ou secas – o longo do tempo.

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Ao mesmo tempo, as “contribuições” das chuvas e dos rios peruanos que deságuam no lago “não foram suficientes para gerar subidas normais em épocas de chuva”, resumiu o especialista.

Vista parcial do Lago Titicaca, no alto dos Andes, entre a Bolívia e o Peru Foto: Aizar Raldes/AFP - 10/08/23

O El Niño é um evento climático natural, geralmente associado ao aumento das temperaturas, seca em certas partes do mundo e chuvas intensas em outras. A La Niña, por sua vez, causa efeitos contrários e, em particular, uma queda nas temperaturas.

O Lago Titicaca também sofre forte poluição devido a todos os resíduos gerados pela cidade de El Alto, uma das mais populosas da Bolívia. Soma-se a isso o fato de que há a a pesca indiscriminada que está dizimando as espécies restantes.

Sem chuva você não vai conseguir viver

Como o recuo das águas está ligado à mudança climática, a solução “é uma questão global”, acrescenta Lucia.

Pedro de la Cruz alimenta vacas em área agora seca às margens do Lago Titicaca Foto: Aizar Raldes/AFP - 10/08/23

A recente cúpula da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA), no Brasil, reafirmou o pedido para que os países industrializados cumpram suas promessas de recursos econômicos para financiar ações contra as mudanças climáticas.

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Nas cidades do Titicaca, há desespero e preocupação de que a água não volte ao normal no lago navegável mais alto do mundo. “Se não houver água, se não houver chuva, não poderemos viver”, lamenta Pedro de la Cruz. /AFP

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