O governo recuou nesta sexta-feira, 28, de um bloqueio no orçamento de órgãos ambientais após o ministro da área, Ricardo Salles, anunciar que iria paralisar todas as operações de combate ao desmatamento e contra queimadas florestais no País por falta de recursos.No momento em que os índices de desmate da Amazônia e do Pantanal voltaram a ser notícia internacional, a pasta informou que não haveria mais fiscalização a partir de segunda-feira.
A reação ao anúncio de Salles foi imediata. Parlamentares e organizações não governamentais que atuam no setor trataram a medida como absurda e, menos de três horas depois, o próprio ministro anunciava que os recursos do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e do Instituto Chico Mendes (ICMbio), que cuida de unidades de conservação, não seriam mais bloqueados este ano.
Conforme o Ministério do Meio Ambiente, haviam sido bloqueados R$ 20,972 milhões do Ibama e R$ 39,787 milhões do ICMBio. O corte total de R$ 60 milhões, disse a pasta, foi informado pelo assessor especial do Ministério da Economia Esteves Colnago, mas atribuído a uma decisão da Secretaria de Governo e da Casa Civil da Presidência da República, pastas comandadas pelos generais Luiz Eduardo Ramose Walter Braga Netto, respectivamente.
Tratava-se de decisão política, portanto, e que expõe um racha entre Salles e os militares que atuam no Palácio do Planalto. Para 2021, no entanto, está mantida a redução de outros R$ 120 milhões para a área de meio ambiente.
Indagado sobre o assunto, o vice-presidente da República, Hamilton Mourão, afirmou que Salles se precipitou ao anunciar a suspensão de operações de combate ao desmate ilegal na Amazônia e contra queimadas no Pantanal em razão de bloqueio orçamentário. Ao criticar a atitude de Salles na noite de ontem, Mourão, que também preside o Conselho da Amazônia Legal, citou que o governo tem reduzido recursos de ministérios para pagar o auxílio emergencial a trabalhadores informais durante a pandemia, mas disse que as ações ambientais não seriam afetadas.
“O ministro se precipitou, pô. O que está acontecendo? O governo está buscando recursos para poder pagar o auxílio emergencial, é isso que estou chegando à conclusão. Então está tirando recursos de todos os ministérios. Cada ministério oferece aquilo que pode oferecer, né?”, disse a jornalistas no Palácio do Planalto. “O recurso está em aberto, não está bloqueado”, disse o vice. Salles rebateu. “Claro que existiu (o bloqueio). O bloqueio foi feito. E nós não podíamos aceitar isso”, disse o ministro ao Estadão/Broadcast. Apesar de o vice citar o auxílio emergencial, o pagamento do benefício, ao custo de R$ 51,5 bilhões por mês, é feito por meio de crédito extraordinário, instrumento que abre uma nova despesa no Orçamento e não demanda nenhum tipo de remanejamento de outros gastos.
O Estadão apurou que o bloqueio de verbas destinava-se a dar mais recursos para o Plano Pró-Brasil, que tem sido tratado no governo como forma de aquecer a economia do País no período pós-pandemia com a ampliação dos gastos públicos em obras.Após a pressão de ministros e do Congresso, o governo Jair Bolsonaro deve destinar R$ 6,5 bilhões do Orçamento para obras públicas. O ministro da Economia, Paulo Guedes, queria manter o valor em R$ 4 bilhões. Dos R$ 6,5 bilhões, R$ 3,3 bilhões serão indicados diretamente pelos parlamentares e poderão ser usados para contemplar ações em seus redutos eleitorais. O dinheiro do meio ambiente, portanto, seria enxugado para alimentar essas obras.
Pedido. No início do mês, o Estadão mostrou que o Ibama havia pedido mais recursos para a Economia para as atividades de fiscalização da Amazônia não serem afetadas. Na ocasião, a pasta de Salles informou que a previsão orçamentária do Ambiente para 2021 havia sido reduzida em R$ 120 milhões. Informou ainda ter tentado reverter a redução de dinheiro, mas não teve sucesso. O governo tem até segunda-feira para enviar o projeto orçamentário de 2021 ao Congresso. Além do Meio Ambiente, a proposta do governo deve indicar cortes em áreas como Educação e Saúde e até o Censo Demográfico feito pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), previsto para 2021, corre o risco de ser adiado. / COLABOROU JULIA LINDNER
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