Pelo menos 476 espécies invasoras já foram registradas no Brasil – sendo 268 animais e 208 plantas e algas; a maioria nativa da África, da Europa e do Sudeste Asiático. As espécies trazem muito mais impactos negativos (1004 evidências científicas) do que positivos (apenas 33) e geram um prejuízo anual que pode ultrapassar os US$ 3 bilhões (algo em torno de R$ 15 bilhões). Algumas são bem conhecidas da população, como os cães e gatos domésticos, a tilápia de consumo regular e os mosquitos Aedes.
Os dados fazem parte do Relatório Temático Sobre Espécies Exóticas Invasoras, Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos, divulgado na manhã desta sexta-feira, 1º. O documento é assinado por 73 autores líderes, 12 colaboradores e 15 revisores de instituições de pesquisa, de órgãos públicos, representantes do terceiro setor e profissionais autônomos de todas as regiões do País.
A introdução e disseminação de espécies exóticas coincide com o início das grandes navegações, no século XVI. Entretanto, nos últimos 50 anos a situação se agravou consideravelmente. A intensificação do tráfego aéreo, dizem os pesquisadores, está entre os fatores que tornam a introdução de espécies invasoras mais comuns. O comércio ilegal de animais de estimação é uma das principais vias de introdução, tanto intencional como não intencional, de mamíferos e répteis no País.
No ambiente marinho, navios de carga e plataformas de petróleo são responsáveis por deslocar espécies. Outra origem significativa é o comércio, sobretudo eletrônico, de plantas para aquarismo e fins ornamentais.
- O trabalho lista as espécies, revela as principais formas de introdução, os ambientes que ocupam e os impactos provocados.
- A principal via de introdução das espécies invasoras é o comércio de animais de estimação e de plantas ornamentais e hortícolas.
Essas espécies exóticas estão presentes em todos os ecossistemas, com maior concentração em ambientes degradados ou de alta circulação humana.
Áreas urbanas são vulneráveis a espécies exóticas invasoras devido ao grande tráfego de pessoas, commodities e mercadorias via portos e aeroportos, segundo o texto, que revela a extensão territorial do problema e seus efeitos ambientais, sociais e econômicos.
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Perdas com espécies invasoras superam os R$ 500 bilhões
Ao longo de 35 anos (1984 a 2019) o prejuízo mínimo estimado em razão dos impactos ocasionados por apenas 16 espécies exóticas invasoras variou de US$ 77 a US$ 105 bilhões – média anual de US$ 2 a US$ 3 bilhões. Dentre elas estão principalmente pragas agrícolas e silvícolas (US$ 28 bilhões) e vetores de doenças (US$ 11 bilhões).
Os custos são atrelados a perdas de produção e horas de trabalho, internações hospitalares e interferência na indústria de turismo. Introduzidos no Brasil a partir da década de 1960, os javalis e os javaporcos (espécie selvagem a partir do cruzamento com o porco doméstico) são apreciados pela carne, mas se tornaram uma praga no interior de SP e outras áreas do Sudeste, onde comem plantações de milho e cana.
É a única espécie no Brasil para qual há autorização legal para abate com fins de controle. Isso fez, no entanto, que alguns grupos levassem o animal para territórios brasileiros onde ele ainda não existia para fomentar a caça esportiva.
O biólogo Mário Luis Orsi, professor da Universidade Estadual de Londrina e também coordenador do estudo, lembra que em alguns casos há ações de governança sendo aplicadas de forma equivocada.
“Existem incentivos ao uso de espécies notoriamente invasoras e de alto impacto, como por exemplo a tilápia e o pínus, que exercem uma dominância nos ambientes e ameaçam a permanência das espécies nativas”.
Já o mexilhão-dourado acarreta sérios danos econômicos porque afeta empreendimentos hidrelétricos, estações de tratamento de água e tanques-rede de fazendas aquícolas.
“Estima-se que a limpeza das incrustações pode chegar a R$ 40 mil/dia para uma usina de pequeno porte e, para grandes usinas, como a de Itaipu (na fronteira do Brasil com o Paraguai), esses valores atingem R$ 5 milhões/dia, pela paralisação das turbinas”, segundo o relatório.
O coral-sol, originário dos oceanos Pacífico e Índico, é outro problema. Ele se espalha rapidamente dominando recifes e costões rochosos e expulsando as demais espécies nativas.
Outro aspecto citado são as invasões biológicas por mosquitos como os do gênero Aedes, associados aos chamados arbovírus, que têm gerado graves consequências à saúde pública, em virtude de doenças como dengue, zika, chikungunya e febre amarela urbana. Nas últimas semanas, o Brasil tem visto a escalada da epidemia da dengue, com cerca de um milhão de infectados.
Dentre as espécies invasoras, há animais e plantas considerados carismáticos, como cães e gatos domésticos, algumas espécies de tartaruga e de primatas e plantas ornamentais. “Nesses casos, é mais difícil aos leigos entenderem sobre o impacto que causam”, conta Orsi.
Cães e gatos só se tornam uma ameaça quando soltos ou abandonados. “Sobretudo se adentram áreas protegidas, onde podem transmitir doenças e caçar a fauna silvestre nativa, interferindo no equilíbrio ecológico local”. A disseminação de conhecimento sobre a origem de espécies exóticas invasoras e suas implicações negativas para a sociedade pode ajudar a reduzir a oposição popular frente ao manejo dessas espécies.
Segundo o relatório, das cinco maiores causas de perdas de biodiversidade – destruição de habitat, mudanças climáticas, poluição, superexploração de recursos naturais e espécies exóticas –, a mais negligenciada na gestão pública brasileira são as invasões biológicas.
Ainda conforme o documento, as mudanças climáticas devem agravar os problemas causados pelas espécies exóticas invasoras.
Principais espécies invasoras
Dez espécies exóticas invasoras, com maior número de registros em grandes grupos taxonômicos, abrangência geográfica e ecológica e mecanismos de impactos ambientais. As espécies foram listadas em ordem alfabética.
Artrópodes
- Apis mellifera (abelha-de-mel)
- Bemisia tabaci (mosca-branca)
- Ceratitis capitata (mosca-do-Mediterrâneo)
- Dendrocephalus brasiliensis (artêmia-de-água-doce)
- Harmonia axyridis (joaninha-asiática)
- Hyblaea puera (lagarta-desfolhadora)Hypothenemus hampei (broca-do-café)
- Macrobrachium rosenbergii (camarão-da-Malásia)
- Penaeus vannamei (camarão-branco-do-Pacífico)
- Tapinoma melanocephalum (formiga-fantasma)
Invertebrados
- Achatina fulica (caramujo-gigante-africano)
- Amynthas corticis (minhoca-louca/minhoca-bailarina)
- Amynthas gracilis (minhoca-louca/minhoca-bailarina)
- Corbicula fluminea (amêijoa-asiática)
- Corbicula largillierti (berbigão-asiático-roxo)
- Eisenia fetida (minhoca-vermelha-da-California)
- Limnoperna fortunei (mexilhão-dourado)
- Melanoides tuberculata (caramujo-trombeta)
- Pontoscolex corethrurus (minhoca-mansa)
- Tubastraea spp (coral-sol)
Peixes
- Cichla kelberi (tucunaré-amarelo)
- Cichla piquiti (tucunaré-azul)
- Clarias gariepinus (bagre-africano)
- Coptodon rendalli (tilápia-do-Congo)
- Oreochromis niloticus (tilápia-do-Nilo)
- Poecilia reticulata (barrigudinho-lebiste)
- Potamotrygon amandae (arraia)
- Potamotrygon falkneri (raia-pintada)
- Steindachnerina brevipinna (biru)
- Trachelyopterus galeatus (cumbaca)
Plantas
- Acacia auriculiformis (acácia)
- Acacia mangium (acácia-australiana)
- Artocarpus heterophyllus (jaqueira)
- Hedychium coronarium (lírio-do-brejo)
- Hydrilla verticillata (hidrila)
- Melinis minutiflora (capim-gordura)
- Pinus elliottii (pinheiro-americano)
- Urochloa arrecta (braquiária-do-brejo)
- Urochloa eminii (braquiária-comum)
- Urochloa brizantha (braquiarão)
Vertebrados
- Bubalus bubalis (búfalo-asiático)
- Bubulcus ibis (garça-vaqueira)
- Callithrix penicillata (sagui-de-tufos-pretos)
- Canis lupus familiaris (cão-doméstico)
- Eleutherodactylus johnstonei (perereca-assobiadora)
- Hemidactylus mabouia (lagartixa-de-parede)
- Lithobates catesbeanus (rã-touro)
- Rattus rattus (ratazanas)
- Rhinella diptycha (sapo-cururu)
- Sus scrofa (javali)
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