A onda de calor que atinge o País esta semana, e que fez o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) emitir alerta vermelho de grande perigo com risco à saúde a moradores de nove Estados, tende a se repetir cada vez mais vezes. Estudos mostram que o aquecimento global está fazendo com que eventos extremos, como aumento das chuvas, das secas e das ondas de calor se tornem cada vez mais frequentes. Há um aumento também do chamado estresse térmico.
“Quando falamos de estresse térmico, não estamos falando apenas de temperatura. A gente utiliza um índice bioclimático que descreve o conforto fisiológico do corpo humano diante de algumas condições específicas”, explica Renata Libonati, professora do Departamento de Meteorologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Essas condições incluem ainda umidade do ar, vento e índice de radiação.
Segundo Renata, esse crescimento já era esperado no contexto de mudanças climáticas associadas ao aquecimento global e também à urbanização, que aumenta as chamadas ilhas de calor. “Muitas vezes nós pensamos que 1ºC, 1,5ºC de aumento da temperatura média do planeta é pouca coisa, mas ele vai acarretar uma maior ocorrência de eventos extremos. E são eles que têm maiores impactos na nossa vida cotidiana”, diz a pesquisadora.
Sobre as ondas de calor, Renata Libonati classifica como um “desastre negligenciado”. “Cada vez mais a gente vê um impacto nas populações mais vulneráveis, especialmente nas regiões tropicais. A gente acha que está acostumado com o calor, mas não estamos. O calor persistente mata. Onda de calor é um desastre negligenciado, e a gente precisa aprender a tratar isso como um desastre”, sustenta ela.
As temperaturas elevadas atingem com maior gravidade os grupos de riscos, como idosos, pessoas com comorbidades e sedentários. Há reflexo também no aumento de partos prematuros durante as ondas de calor.
“A evolução, as adaptações (do corpo humano) que nós conhecemos pela biologia, levaram milhares de anos. E as mudanças climáticas estão acontecendo de forma tão acelerada, que os organismos vivos não são capazes de acompanhar em termos de adaptação. Por isso que o calor tem sido tão perigoso”, alerta a pesquisadora da UFRJ.
Esta semana, um estudo divulgado pelo jornal americano The Washington Post citou a cidade de Belém, no Pará, com potencial para estar entre as mais quentes do mundo em 2050. Ainda que não seja possível estabelecer um “ranking” - o levantamento do Post considerou apenas algumas das grandes cidades globais -, o estudo também serve para mostrar tendências e fazer alertas.
“Quando a gente faz projeções pro futuro, utilizamos modelos climáticos, que são baseados em condições físicas e matemáticas. São levados em consideração alguns cenários de emissões - alguns mais otimistas, em que a humanidade iria parar de poluir em certa taxa, e cenários mais pessimistas, em que a humanidade iria continuar poluindo, com emissão de gases na atmosfera, aquecendo mais o planeta”, pondera Renata.
Ela lembra que os cientistas climáticos alertam para o aquecimento global há pelo menos 30 anos, e pouco se fez desde então. “Irreversível não é, mas estamos muito atrasados para tomar medidas para diminuir o aquecimento global.”
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