THE WASHINGTON POST - Nos últimos anos, cientistas assistiram, horrorizados, as temperaturas globais dispararem - com 2023 e 2024 atingindo cerca de 1,5ºC acima da média pré-industrial. De certa forma, esse recorde de calor era esperado: pesquisadores previram que o El Niño, combinado com a diminuição da poluição do ar que esfria a Terra, causaria um aumento nas temperaturas.
Mas até mesmo esses fatores, dizem os especialistas, não são suficientes para explicar o recente recorde de calor no mundo.
O desequilíbrio energético global da Terra - a quantidade de calor que o planeta está absorvendo menos a quantidade de calor que está liberando - também continua a aumentar, preocupando os cientistas. O desequilíbrio energético impulsiona o aquecimento global. Se ele aumentar, é esperado que as temperaturas globais sigam o mesmo caminho.

Dois novos estudos oferecem uma explicação potencial: menos nuvens. E o declínio na cobertura de nuvens, dizem os pesquisadores, pode sinalizar o início de um ciclo de feedback que leva a mais aquecimento.
“Adicionamos uma nova peça ao quebra-cabeça de para onde estamos indo”, afirma Helge Goessling, físico climático do Instituto Alfred Wegener na Alemanha e autor de um dos estudos.
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Por anos, cientistas lutaram para incorporar a influência das nuvens nos modelos climáticos em grande escala que os ajudam a prever o futuro do planeta. As nuvens podem afetar o sistema climático de dois modos. Primeiro, suas superfícies brancas refletem a luz do sol, resfriando o planeta.
Mas as nuvens também agem como uma espécie de manta, refletindo a radiação infravermelha de volta para a superfície do planeta, assim como os gases de efeito estufa.
Qual fator prevalece depende do tipo de nuvem e de sua altitude. Nuvens cirrus altas e finas tendem a ter mais um efeito de aquecimento no planeta. Nuvens cumulus baixas e fofas têm um efeito de resfriamento.
“As nuvens são uma enorme alavanca no sistema climático”, diz Andrew Gettelman, cientista afiliado à Universidade do Colorado em Boulder (EUA). “Uma pequena mudança nas nuvens poderia ser uma grande mudança em como aquecemos o planeta.”
Pesquisadores estão começando a identificar como as nuvens estão mudando à medida que o mundo aquece. No estudo de Goessling, publicado em dezembro na revista Science, os pesquisadores analisaram como as nuvens mudaram na última década.
Eles descobriram que a cobertura de nuvens de baixa altitude caiu drasticamente - o que também reduziu a refletividade do planeta. O ano de 2023 - que estava 1,48ºC acima da média pré-industrial - teve o menor albedo (fração de radiação solar refletida por uma superfície ou objeto) desde 1940.
Em resumo, a Terra está ficando mais escura.
Esse baixo albedo, calcularam Goessling e seus coautores, contribuiu com 0,2ºC de aquecimento para as temperaturas recordes de 2023 - quantidade aproximadamente equivalente ao aquecimento até agora não explicado. “Esse número de cerca de 0,2ºC se encaixa bastante bem nesse ‘aquecimento ausente’”, diz Goessling.
Os pesquisadores ainda não têm certeza exata sobre o que explica essa diminuição. Alguns acreditam que isso pode ser devido à menor poluição do ar. Quando há partículas no ar, pode ser mais fácil para as gotículas de água se aderirem a elas e formarem nuvens.
Outra possibilidade, segundo Goessling, é um ciclo de feedback das temperaturas que estão aquecendo. As nuvens precisam de umidade para se formar, e as nuvens estratocúmulos úmidas se situam logo abaixo de uma camada seca de ar a cerca de um quilômetro de altura.
Se as temperaturas aquecerem, o ar quente de baixo pode perturbar essa camada seca, misturando-se a ela e tornando mais difícil a formação de nuvens úmidas.
Mas essas mudanças são difíceis de prever - e nem todos os modelos climáticos mostram as mesmas alterações. “É realmente complicado”, afirma Goessling.
Outros cientistas também encontraram uma diminuição na cobertura de nuvens. Em um estudo pré-publicado apresentado em uma conferência científica em dezembro, um grupo de pesquisadores da Nasa, a agência espacial americana, descobriu que algumas das zonas mais nubladas da Terra têm diminuído nas últimas duas décadas.
Três áreas de nuvens - uma que se estende ao redor do equador da Terra e duas nas zonas de tempestades de média latitude no Hemisfério Norte e Sul - diminuíram desde 2000, reduzindo a refletividade da Terra e aquecendo o planeta.
George Tselioudis, cientista climático no Instituto Goddard de Estudos Espaciais da Nasa e autor principal do pré-estudo, diz que essa diminuição na cobertura de nuvens pode ajudar a explicar por que o desequilíbrio energético da Terra vem crescendo nas últimas duas décadas. No geral, a cobertura de nuvens nessas regiões está encolhendo cerca de 1,5% por década, disse ele, aquecendo a Terra.
Tselioudis diz que esse aquecimento poderia estar restringindo essas regiões ricas em nuvens - assim, aquecendo o planeta. “Sempre entendemos que o feedback das nuvens é positivo - e poderia ser bem forte”, disse ele. “Isso parece explicar grande parte do motivo pelo qual as nuvens estão mudando da maneira que estão.”
Se as mudanças nas nuvens fazem parte de um ciclo de feedback, os cientistas alertam, isso poderia indicar mais aquecimento a caminho, com calor extremo para bilhões de pessoas ao redor do globo. Cada ano de calor reforça a ideia que alguns pesquisadores agora abraçaram, de que o aumento da temperatura global alcançará a extremidade superior do que os modelos haviam previsto. Se for o caso, o planeta poderia ultrapassar os 1,5ºC ainda nesta década.
Os pesquisadores agora dizem que estão correndo para entender esses efeitos à medida em que o planeta continua a aquecer. “Estamos em um momento crítico”, diz Goessling. “Temos um sinal climático muito forte - e de ano para ano está ficando mais forte.”
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