Campinas já está mais quente por causa da mudança climática, diz estudo; quanto a temperatura subiu?

Entre 1989 e o ano passado, a média das temperaturas máximas da cidade no interior de SP aumentou 1,2ºC; aquecimento global também aumenta nº de dias seguidos de calor

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Atualização:

Para quem ainda duvida das mudanças climáticas, evidências científicas não faltam - e estão cada vez mais próxima de nós. O relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), dos cientistas das Nações Unidas, mostra que desde 1850 o aquecimento no planeta foi de aproximadamente 1,1ºC. Mas quanto isso afeta a cidade onde moro? Um novo estudo da Unicamp detalha esses efeitos em Campinas, de 1,1 milhão de habitantes. Entre 1989 e o ano passado, a média das temperaturas máximas locais subiu 1,2ºC. E se não frearmos as emissões de gases de efeito estuda, a alta não deve parar por aí.

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A pesquisa revela que a média das temperaturas máximas registradas em Campinas nesse período foi de 28,4 º C, com tendência de aumento crescente do aquecimento nesses 34 anos. Essa média cresceu 1,3 ºC nos meses de verão e 1,8 ºC nos meses de inverno.

Os pesquisadores usaram como referência a média de temperatura registrada entre os anos de1989 e 2003 para avaliar as mudanças. Naqueles 14 anos, a média da máxima foi de 28,05 ºC. No período seguinte, de 2004 até o ano passado , subiu para 28,65 ºC.

Também foram avaliadas as alterações por décadas, o que deixa a comparação mais clara. Nos anos 1990, a média de temperaturas máximas foi de 27,9 ºC. Na de 2000, subiu para 28,3 ºC. E na década de 2010, foi para 29,1ºC.

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“É um sistema global com impacto local”, afirma Guilherme Almussa Leite Torres, doutorando em Geografia e um dos autores da pesquisa. As pessoas, muitas vezes, não entendem que a emissão lá na China ou nos Estados Unidos vai repercutir aqui”, exemplifica.

Os dados foram coletados na estação do Centro de Pesquisas Meteorológicas e Climáticas Aplicadas à Agricultura (Cepagri), na Unicamp, em Barão Geraldo, Campinas. A pesquisa aponta também a redução na média da temperatura mínima. Entre 2020 e 2022, isso se deu de forma mais acentuada, devido à influência do La Niña, fenômeno climático em que há o resfriamento das águas superficiais do Oceano Pacífico equatorial, deixando as temperaturas mais amenas no Sudeste do Brasil.

Esse fenômeno também contribui para maior amplitude térmica, a variação entre as temperaturas máxima e mínima em um dia. “As consequências são sentidas na saúde dos mais vulneráveis, como idosos ou portadores de doenças como asma e bronquite. E isso pode causar queda na produção agrícola e na cadeia de determinados produtos”, diz Torres. “O Cepagri está na borda da mancha urbana de Campinas. Se a medição for feita no centro da cidade, as variações serão ainda maiores.”

A pesquisa revela que a média das temperaturas máximas registradas em Campinas nesse período foi de 28,4 º C, com tendência de aumento crescente do aquecimento nesses 34 anos Foto: Felipe Rau/Estadão

Dias seguidos de calor ficam mais frequentes

Os dias consecutivos de calor também se repetem mais, conforme o estudo. Essas ondas se caracterizam por períodos de seis ou mais dias seguidos de altas temperaturas. Até 2001, pelos registros, não houve nenhum evento do tipo. A partir de 2002, porém, isso começou a mudar.

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A primeira onda surgiu ainda em 2002, com 16 registros de eventos. Ao todo, foram 96 dias do ano com temperaturas máximas acima da média esperada. O fenômeno refluiu nos anos seguintes, mas voltou a aumentar a partir de 2010, com 13 episódios.

O recorde foi registrado em 2014, quando foram registrados 30 fenômenos na cidade. “O que o meio local pode fazer é contribuir para a mitigação e a adaptação a esses efeitos, como o plantio de mais árvores”, afirma o pesquisador.

A Unicamp, localizada no distrito de Barão Geraldo, em Campinas Foto: Unicamp/Divulgação

Eventos extremos aumentaram no País

Aliada às outras alterações, forma-se uma situação propícia para o aumento de eventos climáticos extremos como temporais e longos períodos de seca. Esse cenário é medido pelo Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), órgão federal responsável por elaborar as Normais Climatológicas do Brasil.

Na Grande São Paulo, por exemplo, a frequência de chuvas extremas triplicou, conforme dados do instituto. Entre a primeira e a segunda décadas deste século (2001/2010 e 2011/2020), os temporais acima de 100 milímetros passaram de dois para sete dias a cada dez anos. Já a chuvas fortes, acima de 80 mm, foram de 9 para 16 dias. Um milímetro de chuva equivale a um litro de água por metro quadrado.

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A alteração no padrão de chuvas na região metropolitana fica ainda mais evidente quando se compara a última década com o período inicial da análise do Inmet (1961-1970). O número de dias com chuva acima de 50 mm passou de 37 para 47, enquanto as precipitações acima de 80 mm foram de 3 para 16 dias (13 dias a mais).

Belém, a capital do Pará, Estado com o maior desmatamento da Amazônia no ano passado, é outro exemplo disso. Quando se compara as décadas de 1991-2000 e a de 2011-2020, segundo o Inmet, observa-se que o número de dias com chuva acima de 50 mm passou de 75 para 110. As chuvas acima de 80 mm também se tornaram mais frequentes, passando de 15 para 26 dias.

Ponto de alagamento na rua Aspicuelta, na Vila Madalena, após forte chuva em tarde de muito calor em São Paulo, em 2020 Foto: ALEX SILVA/ESTADÃO

O IPCC traçou como limite, até o fim do século, a alta de 1,5ºC na temperatura ante o nível pré-Revolução Industrial (meados do século 19). O aquecimento global já é de 1,1ºC e, dizem os especialistas, 2025 é o limite para conter as emissões de gases estufa e evitar uma catástrofe climática.

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O Brasil, em 2022, registrou a maior alta nas emissões de gases estufa em 19 anos, resultado do desmatamento, segundo levantamento do Observatório do Clima. Os resultados do Inmet que balizam as Normais Climatológicas do Brasil são parecidos com os encontrados por outros estudos que mostram, por exemplo, o aumento de dias secos na Amazônia e em Pernambuco e a concentração de até 30% do volume pluviométrico anual no Rio de Janeiro em apenas 6 dias do ano.

Para além das alterações nos padrões de chuva, as populações pobres são as mais prejudicadas. Quase 4 mil pessoas já morreram por causa de deslizamentos de terra no Brasil desde 1988, segundo levantamento do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT).

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