Todo verão (e o final dele) é a mesma história. A falta de planejamento, cuidado e de um plano de prevenção contra enchentes provocam em poucos minutos de chuva forte inúmeros alagamentos, quedas de árvores e mortes na cidade de São Paulo. Nesta quarta-feira, 12, um homem que estava dentro de um carro na Avenida Senador Queiroz, no centro, e foi atingido pela queda de uma árvore e morreu no local.
Além da necessidade óbvia de manutenção, especialistas apontam outros motivos para a queda de tantas árvores na capital paulista.
Em nota, a Prefeitura de SP afirmou que coordena ações de manejo de árvores na cidade ao longo de todo o ano. “São 129 equipes para serviços de prevenção e poda, com cerca de 10 colaboradores cada uma, que foram responsáveis em 2024 por 163.808 árvores podadas, um aumento de 39% em comparação a 2019.”
Ainda de acordo com o texto, “com esse esforço, a atual gestão conseguiu reduzir em cerca de 30% o estoque para poda e remoção de árvores, que, em 2017, era de 81 mil ordens de serviço. Somente em janeiro e fevereiro de 2025, a Prefeitura podou 23.590 árvores e removeu 2.835.”
A prefeitura também afirma que a Subprefeitura Sé tem um mapeamento de todas as 52 mil árvores existentes nos 25 bairros e oito distritos que administra. Todas elas são vistoriadas a cada dois anos e possuem laudo técnico. “A Subprefeitura Sé reforça que não constam pedidos para poda ou remoção de árvore na Avenida Senador Queiroz, altura do número 474. Uma equipe está no local para a retirada dos restos da árvore.”

1. A culpa não é da árvore, mas do que é feito com ela
“A culpa sempre cai nelas. E não é a verdade: a culpa é da manutenção que não está sendo feita e do planejamento (do plantio) que não foi realizado”, explica a bióloga e professora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) Aline Cavalari, que estuda os fatores de risco de queda das árvores.
O plantio de árvores de porte inadequado para o local, que entram em conflito com a fiação e sofrem constrição na base do tronco e das raízes por canteiros muito pequenos, além de podas erradas, que causam desequilíbrio, estão entre os problemas típicos das árvores da cidade encontrados pela especialista em Moema, na zona sul paulistana.
Segundo Aline, a manutenção feita corretamente evita a maioria das quedas de árvores de grande porte. São elas que causam os maiores estragos na fiação e podem até provocar mortes. Por outro lado, árvores grandes são importantes porque carregam mais serviços ecossistêmicos e ajudam a atenuar o efeito das ilhas de calor.
2. Impacto das rajadas de vento
Especialistas apontam que ventos acima de 80 km/h podem arrancar até mesmo árvores sadias. O impacto das rajadas, porém, poderia ser reduzido com massa arbórea mais densa, já que o vento entra pela rua e, às vezes, até aumenta de velocidade.
Zerar esse número de quedas em contextos climáticos adversos é difícil, mas ele pode ser reduzido. A bióloga e professora da Unifesp ressalta que a manutenção feita corretamente evita a maioria das quedas de árvores de grande porte.
São elas que causam os maiores estragos na fiação. O temporal desta quarta, 12, derrubou a terceira mais antiga da capital, que ficava no Largo do Arouche, na República, região central. O Chichá de aproximadamente 200 anos quebrou e despencou.
3. Emaranhado de cabos entrelaçados a galhos de árvores
Poucas vias da cidade têm fios enterrados, a exemplo do que ocorre na Avenida Paulista. O mais comum é um emaranhado de cabos, alguns deles entrelaçados a galhos de árvores.
Temporais como o desta quarta estão associados às mudanças climáticas e demandam adaptação de instalações urbanas, alerta o professor do programa de pós-graduação em Ciência Ambiental da USP Pedro Luis Côrtes.

“Para se adaptar a essas novas condições impostas, uma das questões básicas é cuidar intensamente da manutenção das áreas verdes, verificando se as árvores estão saudáveis, a necessidade de podas corretivas para que elas possam resistir a eventos climáticos mais extremos”, diz.
Côrtes sugere ainda priorizar plantas nativas da Mata Atlântica em canteiros de calçadas. Essas espécies são mais resistentes ao clima tropical e menos suscetíveis a quedas em chuvas. Em diversos pontos da cidade há árvores exóticas. “Embora possam ter um belo efeito paisagístico, promover uma boa cobertura, com sombra e preservação da umidade, espécies exóticas nem sempre estão adaptadas a climas mais extremos.”
4. Falta de mapeamento de áreas vulneráveis às chuvas
Cortês também recomenda que seja feito um mapeamento de áreas mais vulneráveis às chuvas. Nesses locais, diz, seria necessário transferir a fiação aérea para debaixo do solo. Assim, eventuais quedas de árvores e postes não causariam a falta de luz.
“Não é um empreendimento fácil nem barato. Há inclusive uma discussão de quem arcaria com esses custos. Mas isso precisa ser feito, porque o que temos visto é uma repercussão muito ruim, com regiões há mais de 24 horas sem energia.”
5. Ausência de política de arborização
Uma cidade do tamanho de São Paulo é muito complexa e precisa de uma melhor articulação e uma política de manutenção do espaço urbano.
“Não só zeladoria, mas renovação e inovação. Ainda usamos as mesmas técnicas do começo do século 20″, disse o arquiteto e urbanista Kazuo Nakano, professor do Instituto da Cidade da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). “Falta, por exemplo, uma política de arborização, tanto de plantio como de manutenção.”
