Como escolher terreno para construir sem ter riscos ambientais; veja dicas

Na hora de construir uma casa, o projeto precisa considerar características como o aclive e o declive do local escolhido

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Por Eduardo Geraque
Atualização:

Uma vista panorâmica com montanhas ao fundo. Um chalé moderno ao lado de um riacho bucólico. Aquela sonhada casa a poucos metros do mar. Para se chegar à concretização de sonhos como esses, há um passo fundamental: dosar o terreno que cabe no bolso com eventuais riscos ambientais que ele oferece, principalmente num momento em que eventos climáticos extremos são cada vez mais frequentes.

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“Existem formas seguras de construir em áreas com aclives, declives ou com algum outro tipo de risco, desde que uma série de fatores seja considerada”, afirma a arquiteta Ketlin Montanari, mestre em Arquitetura, Tecnologia e Cidade pela Unicamp. Com escritório sediado na cidade de Blumenau, interior de Santa Catarina, a profissional conhece de perto os caminhos para edificar em áreas suscetíveis a inundações ou desmoronamentos – o vale do rio Itajaí tem um histórico grande de tragédias.

Antes de mais nada, afirmam especialistas do setor de construção, é a legislação que vai definir de forma categórica o que pode e o que não pode ser feito. Isso porque as leis de zoneamento de uma cidade balizam uma série de características sobre como o meio urbano deve se organizar.

Assim, terrenos de um mesmo tamanho, a depender da localização deles num determinado município, poderão ter regras de ocupação diferentes. Os limites de altura para as construções e o coeficiente de ocupação do solo, por exemplo, tendem a mudar de bairro para bairro.

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Lotes planos são os mais tranquilos para se construir Foto: Leo Drumond / NITRO

Em áreas mais montanhosas, as restrições de tamanho e altura – ou até a proibição total – começam quando a inclinação passa dos 30%. “Em áreas íngremes, a saída pode ser deixar a edificação suspensa em relação ao terreno”, diz Ketlin. Para isso, a engenharia dispõe de várias ferramentas, como a construção de pilotis, que elevam toda a casa e fazem com que a água que desce morro abaixo passe livremente por ela.

O acúmulo excessivo das chuvas no mesmo terreno encharca o solo e acelera os processos de deslizamento. Por isso, muitas áreas mapeadas como de alto risco não podem nem ser habitadas. Onde a lei permite, além do descolamento da casa em relação ao solo, obras de contenção também podem ser importantes para a segurança de todos.

“O tipo de solo também é importante para se ter certeza de como a construção terá de ser feita”, afirma o geólogo Fernando Alves, diretor da Regea Geologia, Engenharia e Estudos Ambientais. Por isso, segundo o especialista, tanto o construtor de uma única casa quanto o de um empreendimento de maior porte devem se preocupar em fazer um estudo geológico e hidrológico de todo o terreno.

No caso do Estado de São Paulo, loteamentos e condomínios com mais de 50 hectares, por questões legais, precisam, inclusive, de um estudo de impacto ambiental, bem mais complexo do que a simples obtenção de um alvará na Prefeitura.

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Se é relevante ter mais detalhes sobre o solo em que se está pisando, conhecer os percursos de rios e riachos também. Ainda mais porque o risco de inundação em áreas que passaram por um boom de ocupação nas últimas décadas mudou, e muito, ao longo do tempo. “Áreas que antes não inundavam, agora, inundam. O que significa que essas avaliações precisam ser feitas, inclusive, por condomínios já construídos há um bom tempo”, explica Alves. No seu dia a dia, o geólogo paulista já trabalhou em projetos que tinham como objetivo evitar inundações em locais construídos há anos.

Pelas leis mais atuais, como o Código Florestal, a área de ocupação em margens de rios varia de acordo com a largura deles. Quando o rio tem até 10 metros de largura, por exemplo, 30 metros precisam ser preservados. Mas, em áreas urbanas, por conta da Lei 14.285, de 2021, a distância-limite para edificações, em determinadas circunstâncias, pode cair para 15 metros.

Até por causa da peculiaridade de cada lugar (e das próprias construções), não existe uma regra exata para se saber quando uma casa ou um condomínio inteiro precisa passar por uma revisão de risco – seja ele geológico, hidrológico ou geotécnico – que mede a instabilidade do terreno para escorregamentos.

Visitar com frequência as áreas mais suscetíveis, até para orientar os moradores, faz parte do trabalho da Defesa Civil. Técnicos com olhares treinados têm mais chances de antever o problema e, inclusive, determinar a remoção de moradias que estejam desrespeitando as leis.

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Entretanto, existem condomínios totalmente legais, nos quais os responsáveis pela administração – síndicos ou empresas – estão cada vez mais atentos às boas práticas ambientais. “Temos feito um trabalho de monitoramento e de entrega de soluções inclusive no litoral norte de São Paulo. Após o que ocorreu no carnaval, há muita gente querendo evitar futuros problemas”, explica o geólogo. O trabalho envolve, principalmente, avaliar possíveis deslizamentos de terra, o que pode incluir a construção de estruturas de contenção nas encostas.

“O mais importante, em todos esses casos, é a contratação de um responsável técnico; esse profissional é quem pode dar toda a consultoria e também se responsabilizar pela obra”, afirma Ketlin Montanari. Segundo ela, olhar para todas as etapas de um projeto – e até para outras, como a insolação que um terreno vai receber – evita dores de cabeça no longo prazo.

Mesmo porque conseguir fazer um bom seguro residencial contra inundações ou escorregamentos ainda é complicado no Brasil. Os poucos que existem pagam um prêmio baixo pelo eventual sinistro ou, então, vão custar mais se a residência já estiver em uma área de risco, por exemplo.

Inimigos ocultos

O geólogo Fernando Alves ressalta um outro risco importante, e muitas vezes negligenciado, quando se trata da compra de um terreno ou imóvel já pronto – um problema que ocorre, principalmente, em grandes centros urbanos, como na região metropolitana de São Paulo.

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“Existem áreas que podem estar com o subsolo contaminado por substâncias químicas. Nesse caso, em São Paulo, por exemplo, uma consulta ao banco de dados da Cetesb, onde existe a lista de todas essas áreas, é um passo inicial importante”, explica Alves.

Por conta da legislação em vigor, a escritura de um imóvel erguido sobre um solo já listado como contaminado precisa incorporar essa informação. Se tudo estiver regular, não existe risco para a ocupação da área, que já deve ter passado por um processo de descontaminação.

Em casos mais graves, pode haver restrição de uso. Se o problema for no lençol freático, o empreendimento não poderá usar água de poços artesianos. Quando a contaminação – muitas vezes causada por antigas fábricas que funcionavam no local em décadas passadas – é no solo, às vezes, o empreendedor fica proibido de escavar o local para construção de garagens subterrâneas.

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