BRASÍLIA - O Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS) pediu a exclusão de todas as reservas extrativistas (Resex) do País do programa “Adote um Parque”, criado pelo ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, para atrair patrocínio privado a unidades de conservação florestal.
As reservas extrativistas são um tipo de unidade de conservação florestal que permite a exploração da natureza por comunidades locais, de forma controlada e sustentável, para permitir a proteção e regeneração natural da floresta. O Conselho afirma que o programa de Salles “desrespeita a legislação e descaracteriza os objetivos para os quais foram criadas”.
O CNS sustenta que os Contratos de Concessão de Direito Real de Uso (CCDRUs), ou seja, as concessões das reservas já firmadas com as comunidades locais, não incluem ”nenhuma previsão que autorize o MMA a dispor da área sem autorização da concessionária e do Conselho Deliberativo da unidade, para finalidades não previstas no respectivo Plano de Manejo”.
Questionado pela reportagem sobre o assunto, Salles criticou o Conselho. “A posição externada pelo tal CNS é militância política pura”, declarou.
O Conselho argumenta ainda que não houve consulta prévia às populações residentes a respeito da inclusão das Resex no programa, conforme prevê a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) de 1989, reconhecida e em vigor no Brasil.
“Nossa preocupação se deve a violações dos direitos que já garantimos. A gestão desse território deve ser feita por meio de um conselho consultivo. Não houve nenhuma oitiva com essas populações. Estamos percebendo que esse programa afetará, inclusive, outras populações que fazem usos de outros tipos de unidades de conservações”, disse Dione Torquato, secretário-geral do CNS.
As Reservas Extrativistas (Resex) foram formuladas em 1985 pelos seringueiros da Amazônia, sob a liderança de Chico Mendes. O objetivo era conciliar direitos fundiários sobre os territórios onde vivem por gerações e os recursos naturais dos quais sempre dependeram para a própria subsistência. Desde 1990 as Reservas Extrativistas vêm sendo criadas e administradas de forma conjunta entre os órgãos ambientais e associações comunitárias, mediante contrato de concessão de direito de uso celebrado com a administração pública.
Com base no requerimento do CNS, o Ministério Público Federal no Amazonas instaurou um processo para “apurar possíveis violações a direitos comunidades tradicionais de Reservas Extrativistas do Estado do Amazonas pelo Programa Adote um Parque”. Foi dado prazo de 15 dias para que o Instituto Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBio) e o MMA manifestem-se sobre as alegações do Conselho.
Das 132 unidades de conservação incluídas no programa “Adote um parque” anunciado por Salles, 50 são classificadas como Resex. Desde o lançamento do programa pelo governo, algumas Resex já receberam propostas de “adoção”.
A rede Carrefour declarou que vai investir na Reserva Extrativista Lago do Cuniã, em Rondônia. A Heineken adotou a Resex Quilombo do Frechal, no Maranhão. A empresa Geoflorestas adotou a Reserva Extrativista Chocoaré-Mato Grosso, localizada no estado do Pará.
Pelas regras do programa, as Resex vão receber R$ 50 por hectare ao ano. No caso da reserva do Maranhão, o valor de investimento da Heineken será de R$ 467 mil. A unidade está localizada a 390 km da capital do estado, em São Luís, em uma área de mais de 9,3 mil hectares. Já a Resex Lago do Cuniã deve receber em torno de R$ 3,7 milhões para mais de 75 mil hectares. Já a reserva Chocoaré-Mato Grosso tem previsão de R$ 140 mil.
O MMA afirma que os investimentos do Adote um Parque podem chegar à casa dos R$ 3,2 bilhões anuais. Não se trata de repassar dinheiro em espécie. Pelas regras, as empresas “adotantes” vão poder aplicar em ações de monitoramento, proteção, prevenção e combate aos incêndios florestais, preservação e combate ao desmatamento ilegal e recuperação de áreas degradadas.
Suspensão. Dione Torquato, secretário-geral do CNS, afirma que, além de as comunidades não terem recebido qualquer tipo de consulta prévia, o governo paralisou outras ações que já funcionavam no apoio às comunidades.
Ele menciona o Programa de Áreas Protegidas da Amazônia (Arpa), que já existe para apoiar financeiramente 117 unidades de conservação amazônicas, mas foi suspenso. “Suspenderam o programa Arpa, que faz a gestão e fiscalização dessas áreas. O problema, portanto, não é recurso, mas a vontade de fazer apenas uma ação de marketing na região”, comentou Torquato.
Em seu documento, o CNS afirma que a inclusão das Resex no programa Adote um parque, de Salles, “é mais uma jogada para ‘deixar passar a boiada’ e continuar com o acelerado processo de destruição da Floresta Amazônica”.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.