FRANKFURT e BRASÍLIA - A nova meta climática do Brasil é pouco ambiciosa, não atende à “Missão 1,5º Celsius” e foi apresentada de forma tímida, apontam especialistas. A chamada Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC, na sigla em inglês) foi divulgada com uma publicação no site do governo federal, sem grandes alardes, no fim da noite da sexta-feira, 8.
A meta de redução de emissões de gases de efeito estufa (GEEs) representa uma redução de 39% a 50% em relação às emissões líquidas de 2019 (1.712 MtCO2e). Segundo o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) e o primeiro Balanço Global do Acordo de Paris, a recomendação é de um corte que alcance 60% até 2035 em relação a 2019.
Ao Estadão, o secretário executivo do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, João Paulo Capobianco, afirmou que, ainda que a NDC do Brasil esteja à altura do desafio, é preciso um esforço conjunto. “Nossa nova meta para 2035 é bem mais ambiciosa do que a meta de 2030 e nos coloca no rumo da neutralidade em 2050″, disse. De acordo com Capobianco, o governo prepara planos setoriais de mitigação para todas as áreas da economia.
Se por um lado o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva cumpre a promessa de anunciar muito antes do prazo - fevereiro de 2025 - a sua nova meta, por outro, apresenta uma indicação de redução de gases de efeito estufa incapaz de cumprir o objetivo de limitar em 1,5º Celsius a elevação da temperatura global, segundo o Instituto Talanoa.
O Brasil foi o segundo país a divulgar sua nova ambição. Nesta semana, os Emirados Árabes Unidos fizeram o mesmo. Os dois países compõem com o Azerbaijão a Troika, grupo formado pelas presidências das COPs 28, em Dubai e 29, que começa segunda-feira, em Baku, e a 30, que será realizada em Belém no ano que vem.
“O Brasil assume a dianteira ao anunciar metas de mitigação para 2035, reafirmando seu compromisso e apresentando resultados concretos rumo ao fim do desmatamento nesta década. No entanto, a meta em faixa e o silêncio do governo brasileiro sobre a transição para longe dos combustíveis fósseis sugerem fragilidades, disse em nota, Natalie Unterstell, presidente do Instituto Talanoa. Ela pontua que “metas de redução de emissões em formato de banda são raras em NDCs” e contraditórias, visto que estabelece um teto máximo.
“Além do conteúdo da NDC anunciada, chama a atenção a forma como o anúncio foi feito: com um comunicado postado no site do governo brasileiro numa sexta-feira à noite. Esse formato passa um preocupante sinal político no atual contexto”, afirmou Alexandre Prado, líder em mudanças climáticas do WWFBrasil.
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Unterstell, do Talanoa, e Prado, do WWFBrasil, afirmam ter como expectativa de que o governo brasileiro apresente durante a 29.ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP29), entre 11 de novembro e 22 de novembro, mais detalhes da NDC, como o “caminho de como o País chegará lá”. “Esperamos uma surpresa positiva no documento que será submetido à UNFCCC pela futura Presidência da COP 30″, afirmou Unterstell.
“Espero que semana que vem, durante a COP29, o governo brasileiro retome a postura de liderança climática que caracteriza sua trajetória nas negociações da UNFCCC, que são atualmente o maior processo multilateral do mundo e que lidam com o maior desafio existencial da humanidade neste século”, disse Prado.
Ao Estadão, a secretária Nacional de Mudança do Clima, Ana Toni, rebateu as críticas. Segundo ela, a NDC brasileira será detalhada em Baku, quando o texto será apresentado pelo vice-presidente, Geraldo Alckmin. No texto, ela afirma que o país vai informar como viabilizará as novas metas climáticas.
“A meta é muito ambiciosa. Que outro país tem uma meta de 67%? Está é nossa ambição. Mas para chegarmos lá temos que assegurar condições propícias nacionais e internacionais, e não temos controle de tudo”, disse.
A secretária afirmou que o modelo usado pelo Brasil, desenvolvido pela COPPE-UFRJ, “deixa super claro que sim, estamos alinhados” à meta 1.5º.
“Tem diversos modelos no mundo e infelizmente não tem um ‘modelo’ único de alinhamento a 1.5 recomendado pelo IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da ONU), então usamos o melhor da ciência climática brasileira para assegurar este alinhamento”, argumentou.
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